A definição sobre como produzir petróleo e por maior tempo provoca no México uma dura batalha política na qual não têm lugar considerações ambientais nem estratégicas para desenvolver energias alternativas e limpas. Ativistas de organizações ambientalistas e especialistas ouvidos pela IPS disseram estar decepcionados pelo rumo do debate. O governo propõe reformas legais para incentivar a participação privada na extração, no transporte e refino de petróleo, enquanto a oposição de esquerda rechaça esses capitais por considerá-los contrários à soberania nacional.
Mas os dois setores visam manter o petróleo, cujas exportações financiam 40% do orçamento nacional, como um dos motores centrais da economia e como eixo energético. Os legisladores da Frente Ampla Progressista, que reúne os principais partidos esquerdistas do México, mantêm desde o último dia 10 ocupadas as tribunas do Senado e da Câmara de Deputados com a intenção de impedir que prospere a iniciativa governamental.
Os opositores dizem que com sua ação evitarão que se consuma a suposta privatização da Petróleos Mexicanos (Pemex), companhia que está em situação de quebra com dívidas que superam o valor de seus ativos, o que foi enfrentado com mais endividamento externo. Esse gravíssimo estado financeiro se reflete, por exemplo, na qualificação BBB por parte da consultoria de riscos norte-americana Standar&Poor’s, quando a grande maioria das empresas de petróleo do mundo contam com o grau AAA.
Apesar dos altos preços internacionais do petróleo, que ultrapassam as previsões oficiais, a crise da Pemex não cede, já que todo recurso adicional vai parar nos cofres públicos e dali para os governos estaduais minimizarem a insuficiente arrecadação fiscal. Além disso, de forma paralela ao aumento dos preços dos hidrocarbonos também sobe o custo local da gasolina e de outros derivados, 40% dos quais o México importa para poder atender a demanda interna. O governo do conservador Felipe Calderón assegura que seu plano não é para privatizar e alerta para a necessidade de as reformas serem aprovadas, pois o atual horizonte de reservas de petróleo é de apenas nove anos e um mês.
O oficialismo aposta em logo incursionar na exploração de petróleo no leito profundo do golfo do México, e os opositores afirmam que há margens para extrair mais óleo em terra firme e no litoral. O objetivo de ambos é aumentar as reservas para manter o nível de extração atual de 2,9 milhões de barris por dia. “A soberania energética transcende ao petróleo, mas neste debate passional, onde tudo se reduzi a privatizar ou não a Pemex, não há espaço para mais argumentos”, lamentou à IPS Omar Masera, diretor da não-governamental Rede Mexicana de Bioenergia. Segundo Masera, o México deveria estar debatendo como diversificar sua matriz energética. “A soberania está em garantir ao país um futuro sustentável”, afirmou.
Dados oficiais indicam que 41,68% da energia elétrica que o país consome depende dos hidrocarbonos, 11,43% dos complexos hidrelétricos e 7,92% da queima de carvão. Os 31,07% adicionais são gerados por empresas privadas que basicamente usam gás. O restante da eletricidade provém de uma usina nuclear com participação de 4,56%, geotermia com 3,24% e eólica com 0,10%. Quanto ao parque automobilístico e grande parte do industrial, a dependência de derivados de petróleo é quase total.
“No México não existe nenhuma tentativa de despetrolizar (sic) a economia e caminhar para novos estágios energéticos”, lamentou Jorge Escandón, coordenador da campanha de Energia e Mudança Climática do capítulo mexicano da organização não-governamental Greenpeace. Os países-parte do Procolo de Kyoto, o convênio assinado em 1997 e em vigor desde fevereiro de 2005, entre os quais se conta o México, têm o compromisso de reduzir as emissões de dióxido de carbono, mas o processo local contradiz esse propósito”, disse Escadón à IPS. A oposição e o governo buscam manter alto o consumo de combustíveis fósseis e deixar de lado as energias renováveis e limpas, ressaltou.
O México é responsável por 2% das emissões de gases causadores do efeito estufa que produzem o aquecimento do planeta. Os últimos governos mexicanos traçaram planos para desenvolver energias alternativas, mas nos debates em curso ninguém fala deles. Tanto o ativista do Greenpeace como o chefe da Rede Mexicana de Bioenergia concordaram que esse fato demonstra o pouco interesse real que há por parte de todos os atores em mudar a matriz energética.
Projetos oficiais contemplam a produção de energia eólica até cobrir 6% da eletricidade até 2030 e a necessidade de construir novos reatores nucleares para somá-los aos que já funcionam na central de Laguna Verde. Quanto ao parque automobilístico, documentos oficiais indicam que o país deveria produzir etanol no médio prazo para misturar à gasolina. O diretor da Rede Mexicana de Bioenergia, que realiza estudos e apóia projetos nessa matéria, assegurou que a maioria desses planos avançam lentamente e outros estão paralisados.
As propostas do governo de Calderón, apresentada na semana passada ao parlamento, inclui normas para dar flexibilidade empresarial à Pemex, ofertar à população bônus da dívida da empresa e facilitar, através de contratos que se pagariam em dinheiro e não com renda petrolífera, a participação privada nessa indústria. A opositora Frente Ampla Progressista aceitou de forma inicial discutir tais projetos e eventualmente modificá-los, mas de forma surpreendente e sob comando de seu líder, o ex-candidato presidencial Andrés López Obrador, optaram por bloquear o trabalho legislativo com o argumento de que não há interesse real em debater. “No petróleo há uma polarização total, assim, é muito difícil que alguém aceite incluir o desenvolvimento de energia alternativas”, disse Masera.
Mas esse ponto não só está fora das discussões como também tudo o que diz respeito ao desempenho ambiental da Pemex, que, segundo a Procuradoria Federal de Proteção ao Meio Ambiente, é a empresa que causa mais acidentes ambientais no país e uma das que mais contaminam. A Pemex é a maior empresa do México e uma das 11 na área do petróleo mais importantes do mundo. Possui 154.761 funcionários, 224 equipes de perfuração em operação e 2.884 poços ativos. O orçamento da companhia para este ano é de US$ 17,16 bilhões, apenas US$ 173 milhões dos quais são destinados a melhorar suas capacidades no tocante à proteção ambiental.
Os diretores argumentam que essa quantia não descreve a real preocupação da Pemex na matéria e afirmam que em todas as áreas da companhia há componentes e princípios de trabalho vinculados ao respeito ao meio ambiente. A Pemex responde por 57% das emergências ambientais registradas a cada ano no México com materiais perigosos, segundo a Procuradoria Federal de Proteção ao Meio Ambiente. Além disso, 70% dos acidentes vinculados à empresa afetam solos, 30% a água e 10% o ar, diz a Procuradoria.
Dos 54 mil quilômetros quadrados de gasodutos, polidutos e oleodutos e dos dois mil quilômetros de tubulações submarinas da Pemex, ao menos 25 mil quilômetros estão em más condições e podem apresentar falhas e acidentes de grande porte, denuncia o Greenpeace. Segundo a imprensa, 10.405 quilômetros de tubulações têm mais de 30 anos de uso e 7.400 quilômetros já estão fora de operação. Os acidentes são recorrentes nas instalações da Pemex, apesar e sua direção garantir que faz tudo o que está ao seu alcance para ter um desempenho ambiental de excelência.
(Por Diego Cevallos, da IPS, Envolverde, 17/04/2008)