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programa nacional do biodiesel passivos dos biocombustíveis
2008-04-17
A preocupação com a possibilidade de que as grandes empresas do agronegócio se apropriem do controle da cadeia produtiva do biodiesel e do etanol foi um dos temas debatidos em Recife.

RECIFE – Realizado quarta-feira (09) em Recife, o debate “Biodiesel na Agricultura Familiar” mostrou como ainda é grande a pluralidade de opiniões sobre a aplicação do Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel (PNPB) no Brasil. Com a presença de representantes do governo de Pernambuco, da academia e dos movimentos sociais, o evento, mais um da série de Debates Carta Maior realizados em todo país, tocou em temas como a inclusão social dos agricultores familiares, a relação da produção de biocombustíveis com a soberania alimentar do povo brasileiro e os impactos que a expansão dessa produção pode causar ao meio ambiente.

Realizado com o patrocínio da Petrobras, o debate em Recife contou com as participações de Gutemberg Granjeiro (gerente da Secretaria de Agricultura e Reforma Agrária de Pernambuco), Jorge Tavares (professor da Universidade Federal Rural de Pernambuco especializado em extensão rural e educação agrícola), Ana Navaes (também professora da UFRP e uma das principais articuladoras do PNPB no estado), José Cláudio da Silva (coordenador da área de Meio Ambiente e Infra-Estrutura do MST), Adelson Freitas (diretor de Políticas Agrícolas da Federação dos Trabalhadores de Pernambuco) e Reginaldo Alves (coordenador da rede de ONGs Articulação do Semi-Árido). O debate teve a mediação do diretor-geral da Carta Maior, Joaquim Ernesto Palhares.

As opiniões divergentes entre os debatedores começaram já na escolha das denominações e conceitos utilizados na análise do tema. Na opinião de Jorge Tavares, existe preconceito com o trabalhador rural: “Venho estudando a agricultura familiar há alguns anos e me assusto com algumas denominações como pequeno produtor, caboclo, caipira, etc. Tudo isso tem o objetivo de desqualificar o trabalhador. Os técnicos gostam de oferecer respostas e soluções para esse campesinato, mas muitas vezes não dão importância à diversidade de opiniões. O respeito a essa diversidade tem que ser incluído no marco de discussão sobre energia”, disse.

José Cláudio da Silva questionou a utilização do próprio conceito de biodiesel: “O MST não concorda com o termo biodiesel, e avalia que os agrocombustíveis aumentam a insegurança alimentar da humanidade. Eles podem ser uma alternativa à escassez do petróleo fóssil, mas é preciso que haja também uma mudança no comportamento e nos padrões de produção e consumo. O modelo atual é insustentável, e a produção dos agrocombustíveis em Pernambuco, toda pensada para a expansão do cultivo de cana-de-açúcar, agrava as conseqüências sociais da nossa região”.

A preocupação com a possibilidade de que as grandes empresas do agronegócio se apropriem do controle da cadeia produtiva do biodiesel e do etanol também foi manifestada pelos debatedores: “Na lógica do agronegócio, o camponês talvez entre no PNPB apenas como parte integradora. Não há nenhuma proteção para a agricultura camponesa, muito pelo contrário. A produção do biodiesel pela mamona é uma forma de compensação social. É errado apostar na inclusão social em Pernambuco, onde sabemos que o principal objetivo é o etanol e a cana. Vivemos agora a tomada dos assentamentos da reforma agrária para a produção de biodiesel e da Zona da Mata para a produção de cana”, disse o dirigente do MST.

Jorge Tavares também citou o poderio histórico do agronegócio no Brasil: “Nunca os usineiros gostaram tanto do governo. O biodiesel é para alimentar os carros da cidade, uma das armas que mais mata no mundo. Devemos pensar em como conseguir energia para a vida, e vida é feijão, é comida. A região é historicamente concentradora sobre a questão da terra e a exploração da mão-de-obra. É preciso buscar alternativas, promover a mudança do padrão de consumo e harmonizar o homem com a natureza”.

Nova Relação
Ana Navaes tem uma opinião mais otimista sobre o PNPB. Uma das responsáveis pela construção de uma tentativa de estabelecer uma nova forma de relação com os produtores de matéria-prima - a usina pública para processamento de biodiesel que está sendo montada no município pernambucano de Pesqueira - ela aposta no sucesso do programa: “Quando lançou o PNPB e o Selo Combustível Social, o governo criou condições para proteger a agricultura familiar e incentivar o plantio do dendê, da mamona e de outras oleaginosas. Se o produtor de biodiesel adquirir 30% de sua matéria prima junto à agricultura familiar, terá 30% de dedução de impostos. Isso garante que as empresas irão comprar dos agricultores familiares”, avaliou.

A professora afirmou que “o principal gargalo para os agricultores familiares sempre foi a comercialização” de seu cultivo: “O ponto crucial é o mercado, a relação com o mercado. No Brasil, existe a figura do atravessador. Ele faz como quer, compra pelo preço que quer e quando quer. Muitas vezes, é o único detentor da tecnologia também”, disse Ana, afirmando acreditar que o PNPB pode mudar essa realidade: “Na Usina Miguel Arraes, em Pesqueira, o poder de negociação do agricultor familiar está garantido. A produção da mamona é uma das mais confiáveis. A Embrapa tem as variedades que garantem a produtividade”.

“A gente sabe que o agricultor vai plantar com baixa tecnologia, e isso tem um impacto na produtividade, mas agora ele está plantando em área zoneada, onde o solo tem a aptidão para a mamona. Além disso, o PNPB está garantindo um preço mínimo de mercado, que é de 75 centavos em Pesqueira. Isso sem falar na possibilidade de o agricultor familiar produzir ele mesmo o óleo bruto ou beneficiar a chamada torta de mamona, que é o resíduo resultante da produção do óleo”, acrescentou a professora.

Assistência técnica
Uma opinião intermediária foi manifestada por Adelson Freitas: “O PNPB é uma demanda da sociedade e, quando se trata de agricultura familiar, é uma grande oportunidade. Mas, há uma ausência de políticas de apoio ao agricultor. O preço da matéria-prima hoje não é satisfatório para a agricultura familiar, e a ausência de políticas de assistência técnica e extensão rural dificulta a participação dos trabalhadores”, disse o dirigente da Fetap.

Freitas denuncia também que “as empresas que conseguiram o Selo Combustível Social não têm cumprido, em sua maioria, as condições de aprimoramento técnico” do pequeno produtor: “O BNDES oferece ajuda para empresas produtoras de biodiesel, mas esqueceu do básico, que é investir no agricultor. Outro problema é a ausência de crédito, que ainda não chegou para apoiar a produção de oleaginosas. O Pronaf não está ajustado para as necessidades do agricultor familiar. Hoje, existe nos movimentos sociais diálogo com governos e empresas para avançar nessas medidas, mas o governo precisa criar um fundo de apoio a agricultura familiar como estratégia do PNPB. Um centavo por litro, por exemplo, pode apoiar modelos sustentáveis de produção”.

Reginaldo Alves defendeu um novo modelo de relação entre os agricultores familiares e os produtores de biocombustíveis: “Acredito na perspectiva de um programa com base agroecológica, com produtividade, que seja introduzido na agricultura familiar, mas sem esse elemento do monocultivo. Sem o viés da alta produtividade e outros vieses que existem estabelecidos pela visão de mercado”, disse.

O dirigente da Articulação do Semi-Árido também teceu suas críticas ao PNPB: “Acreditamos que algo precisa ser melhorado no programa, porque ele não tem sido assimilado pelos agricultores como perspectiva de aumento de renda. O cultivo da mamona, associado a outras formas de produção da agricultura familiar, talvez possa se constituir em um elemento de perspectiva de aumento de renda”.

Em nome do governo de Pernambuco, Gutemberg Granjeiro afirmou a aposta no sucesso do programa de produção de biodiesel no estado: “Temos muitas empresas aliadas e o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) para promover a assistência técnica aos agricultores familiares. Pretendemos atender em Pernambuco mais de 300 mil famílias. O governo espera que daqui a cinco meses tudo esteja pronto para atender ao agricultor familiar”.

(Por Maurício Thuswohl, Agencia Carta Maior, 14/04/2008)

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