O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse nesta quarta-feira que descartar a produção de biocombustíveis é o "verdadeiro crime contra a humanidade". A declaração foi dada em resposta ao relator especial da ONU (Organização das Nações Unidas) para o Direito à Alimentação, Jean Ziegler, que na última segunda-feira disse que a produção em massa de biocombustíveis representa um crime contra a humanidade por seu impacto nos preços mundiais dos alimentos.
"O verdadeiro crime contra a humanidade será descartar a priori a produção de biocombustíveis e renegar os países estrangulados pela falta de alimento e energia à dependência e à insegurança alimentares", afirmou Lula durante a abertura da 30ª Conferência Regional para América Latina e Caribe da FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura).
Mais cedo, Lula chamou de "palpiteiros" os que têm relacionado a alta dos preços dos alimentos com a produção de biocombustíveis. "É muito fácil alguém ficar sentado em um banco da Suíça e ficar dando palpite no Brasil e na África. É preciso vir aqui meter o pé no barro", disse o presidente.
Lula disse que a alta recente nos preços dos alimentos não tem uma única explicação. Entre as causas, o presidente relacionou o aumento no preço do petróleo, a quebra em safras de mundo todo, o aumento no valor dos fretes, as variações cambiais, a especulação financeira e o aumento no consumo em países como China, Índia e da África e América Latina. Ele citou o caso do Haiti que, segundo o presidente, está sendo duramente afetado pela alta nos preços dos alimentos.
"É com crescente espanto que vejo a tentativa de criar uma relação de causa e efeito do aumento dos biocombustíveis e a escassez de alimentos ou o aumento de preços. Biocombustíveis não são o vilão que ameaça a segurança alimentar dos países pobres", disse.
O presidente cobrou a criação de políticas globais para a segurança alimentar e criticou o protecionismo e os subsídios agrícolas nos países ricos. Ele ressaltou que o sucesso da Rodada Doha depende da abertura do mercado agrícola europeu e da redução de subsídios na Europa.
"O Brasil não precisa ganhar, mas a Europa e os Estados Unidos precisam ceder e os países pobres ganharem", concluiu.
Lula criticou ainda o FMI (Fundo Monetário Internacional) a quem acusou de não ter dado "uma única opinião" sobre a crise americana e disse que os países desenvolvidos só reagem em situações de emergência.
"Até quando nós [países em desenvolvimento] vamos aceitar o papel de sermos coadjuvantes no cenário internacional?", questionou.
Alimentos
O diretor-geral da FAO, Jacques Diouf pediu que sejam adotadas medidas imediatas para proteger as populações vulneráveis na América Latina e Caribe. Segundo Diouf, o custo de importação de alimento em países como Equador, Haiti, Honduras e Nicarágua aumentou 35%.
"É preciso aplicar medidas imediatas com o objetivo de aumentar rapidamente a produção alimentícia local e prevenir os efeitos negativos de uma nova escalada de preços", afirmou.
De acordo com dados apresentados por Diouf, o preço dos alimentos aumentou 47% entre janeiro de 2007 e janeiro de 2008 em todo o mundo. Ele observou que o impacto positivo ou negativo dos biocombustíveis dependerá das políticas internacionais adotadas sobre a produção e distribuição dos produtos.
"Nesta fase, podemos organizar este setor a fim de que beneficie os mais pobres mediante um acesso mais fácil à energia no plano local", acrescentou.
(Lorenna Rodrigues, Folha Online, 16/04/2008)