Rio Grande - A proposta de consolidação da ampliação da Estação Ecológica do Taim (Esec) tem mobilizado órgãos ambientais, governos municipais, entidades, organizações não-governamentais (ONGs) e moradores da região para discutir o assunto. De um lado está o objetivo de garantir maior proteção e conservação da fauna e da flora nos atuais 10.764 hectares da Esec, o que instituiria legalmente a área da Unidade de Conservação. Do outro, uma nova insegurança quanto à possibilidade de reduzir o limite de propriedades ou sua total desocupação. Proprietários rurais demonstram desconforto ao tratar do assunto, que coloca em dúvida o futuro da fonte de renda de alguns deles, além de relembrar as desapropriações há mais de 30 anos, na época da criação oficial da Esec.
Atualmente com 10.764 hectares, a proposta de consolidar a ampliação da estação para 33.815 hectares tem sido articulada nos últimos meses pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), responsável pelas Unidades de Conservação de proteção integral, e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). Inicialmente, foram feitas reuniões com o conselho consultivo, formado por 25 integrantes entre as prefeituras de Rio Grande e Santa Vitória do Palmar, ONGs, sindicatos, universidades e ambientalistas. Uma nova reunião deve acontecer, na qual pode ser legitimado o termo de referência para a contratação de uma empresa para estudar o número de propriedades existentes na área da ampliação e quais delas estão sob a área de banhado na limitação pretendida.
No mesmo encontro também pretende-se obter o aval dos integrantes para agendar duas audiências públicas, uma em Santa Vitória e outra em Rio Grande. Além da ampliação, o objetivo dos órgãos responsáveis pela área é elaborar o plano de manejo, bem como regulamentar pesquisas e programas de educação ambiental.
Entenda do caso
Decretada como área de utilidade pública para fins de desapropriação em 1978, a área original do Taim abrange 33.815 hectares. Somente em 1986 foi criada a Estação Ecológica, composta por cinco glebas distintas, que somam uma área de 10.764 hectares. De acordo com o técnico especializado da Coordenação do Bioma Marinho e Costeiro da Diretoria de Unidades de Proteção Integral do IcmBio, Eduardo Godoy, os moradores cujas propriedades estão sobrepostas às áreas delimitadas deverão ser contatados pelo órgão.
A área pretendida corresponde aos banhados, onde não é permitida a criação de gado, por ser Área de Proteção Permanente (APP). “Com a regulamentação da Unidade de Conservação, a vegetação do banhado poderá se desenvolver e possibilitar outro tipo de fauna, já que a área é utilizada para pastoreio no período de seca”, afirma o técnico.
A consolidação dos 33.815 hectares não deve provocar impacto aos produtores de arroz, às serrarias da região e às florestas exóticas já implantadas. Em um dos mapas desenvolvidos em 1986 constavam 36 propriedades no entorno sobrepostas à área original. “Com a análise técnica, buscaremos as áreas mais ricas a serem conservadas”, diz o analista ambiental e chefe da estação Amauri Motta.
Raios X da Estação Ecológica do Taim
- Data de criação: 21 de julho de 1986
- Extensão: 10.764 hectares
- Espécies: há mais de 200 espécies de vegetais (aroieira-braba, capororoca, araçazeiro, corticeira, jerivá, butiá e cactos), 220 de aves (cisnes, garças, maçaricos, colhereiros e gaviões), 21 de répteis (jacaré-do-papo-amarelo), oito de anfíbios, 51 de peixes, 28 de mamíferos (capivara, ratão-do-banhado e lontra), diversos crustáceos, moluscos e anfíbios.
- Extensão pretendida: 33.815 hectares
- Área de desapropriação visada: de banhados
- Atividades comprometidas: criação de gado
Recursos e indenizações
Parte dos recursos para as indenizações viria da verba, já garantida, do processo de compensação ambiental da construção da fase C da Usina de Candiota III, corresponde a R$ 2,5 milhões. Segundo Motta, somente após o pagamento das indenizações se daria a transferência da área negociada. Ele ainda afirma que o atual processo de discussão da consolidação não tem relação com a antiga proposta de ampliação para 110 mil hectares, suspensa pelo Superior Tribunal Federal há mais de cinco anos.
O que dizem os proprietários
Preocupados com uma nova desapropriação, ruralistas já se reúnem para entender o caso e esclarecer dúvidas. Uma das propriedades de Pedro Porto Vargas servia de plantio de arroz. Procurado pelo então Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal (IBDF) - cujas atribuições foram transferidas posteriormente ao Ibama - Vargas perderia naquela época 90 hectares de um total de 150 neste terreno. Sem aceitar a proposta de indenização do órgão, ele entrou na Justiça, recebendo há apenas quatro anos, entregue a Getúlio Vargas, um dos filhos de Pedro. “E a segunda parcela foi paga no ano passado”, diz Gilberto, irmão de Getúlio. No que restou da área desapropriada não há plantio, mas há criação de gado e cavalos em outro terreno. “Manda quem pode e obedece quem precisa”, lamenta Gilberto, ao duvidar da possibilidade de negociação dos órgãos ambientais na tentativa de consolidar a ampliação. Segundo o IcmBio, os proprietários que aceitaram o valor do antigo órgão, receberam o montante no mesmo ano.
Outro proprietário da região que preferiu não se identificar questiona sua subsistência, proveniente da criação de cavalos da raça crioula e gado de corte. “Já desapropriaram essa área anteriormente. Se proibirem a criação de gado, o que será da gente?” Nascido e criado na mesma propriedade rural no Taim, Deroci Arrieche, de 76 anos, lembrou o episódio e afirma não ter sua área desapropriada por conta de uma liminar que obteve na Justiça. Com criação de gado em seu terreno, Deroci demonstra insegurança em relação à nova proposta e não está disposto a negociar a área do banhado. “Vou brigar até o último cartucho”, diz.
(Por Camila Almeida, Diário Popular, 13/04/2008)