Os protestos em Roraima contra a operação de retirada de não-índios da terra indígena Raposa/Serra do Sol anteciparam a disputa pelo governo do Estado em 2010.
À frente do movimento de resistência à retirada está o arrozeiro e presidente do DEM em Pacaraima (214 km de Boa Vista), Paulo César Quartiero, 55. O arrozeiro nega que esteja explorando os protestos politicamente, mas vê um "vácuo" de poder no Estado que pode ser preenchido por ele.
O vácuo, segundo Quartiero, é resultado da morte, em dezembro do ano passado, do governador do Estado eleito em 2006, Ottomar Pinto (PSDB). Em seu lugar assumiu o vice, o também tucano José de Anchieta Júnior.
"Roraima é um vácuo político. Morreu Ottomar e esse vácuo não foi preenchido por ninguém. Isso aqui é uma arena, até agora não apareceu o touro. Então pode ser que qualquer um se projete, até eu", afirmou ele à Folha na vila do Surumu, em Pacaraima, na última quinta-feira, um dia após o STF (Supremo Tribunal Federal) suspender a operação da Polícia Federal para a retirada dos não-índios.
Anchieta Júnior deve se candidatar à reeleição e provavelmente também vai explorar na campanha sua posição contrária à saída dos não-índios. O governo do tucano foi o autor do pedido de liminar que, acatado pelo STF, suspendeu a Operação Upatakon 3.
Romero Jucá (PMDB), outro possível nome para disputar o governo de Roraima, não pode se declarar contrário à operação por ser líder do governo Lula no Senado.
Indenização
Gaúcho de Passo Fundo, agrônomo e filho de agricultor, Quartiero chegou a Roraima na década de 70. Ele afirma que arrendou fazendas dentro da terra indígena em 1988 e 2002. Preside a associação local dos rizicultores e pede R$ 53 milhões de indenização do governo federal para desocupar as fazendas, localizadas em área que pertence à União.
Sua entrada na política se deu em 2005, quando assumiu a Prefeitura de Pacaraima, na fronteira com a Venezuela. Dois anos depois, teve o mandato cassado sob acusação de compra de votos. No mês passado, o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) determinou sua volta ao cargo, o que deve ocorrer após a publicação da decisão.
Quartiero vem se projetando desde 2004 com ações contra a homologação contínua da reserva -algumas já até lhe renderam processos judiciais. O ápice da resistência, contudo, começou no último dia 31. Ele ficou 11 dias acampado em uma ponte na vila do Surumu, dentro da área indígena, para protestar contra a operação da PF. Chegou a ser preso por desacato e foi liberado após pagar uma fiança de R$ 500.
A defesa da Amazônia é um de seus argumentos contra a saída dos não-índios da reserva. Para ele, demarcações de terras indígenas em áreas de fronteira ameaçam a soberania nacional. "É um problema emblemático de defesa do território."
Na quinta, o cenário na vila do Surumu continuava tenso. A Folha identificou quatro seguranças com rádios rondando as casas dos índios. Segundo a PF, seguranças armados, militantes políticos, não-índios e índios contrários à homologação uniram-se a Quartiero nos protestos recentes. Ele nega participar de ações violentas.
(Kátia Brasil, Folha Online, 13/03/2008)