Num desses dias, vi uma propaganda institucional da Aracruz, cujo lema seria hilária, se não fosse revoltante: "O Brasil fazendo um bonito papel no mundo inteiro". Que papel? Papel higiênico? É irritante ver os esforços de alguns segmentos do empresariado, em geral multinacional, zombando de nossa capacidade de pensar. É tripudiar sobre nossos raros e subdesenvolvidos neurônios. Do jeito que a supracitada empresa, mais a Aracel, a Stora Enzo e VCP Celulose adquiriram trânsito no Rio Grande, não é de duvidar que logo, logo estejam "dando as cartas".
Jogando ao arrepio do IBAMA e da FEPAN, surgiu o CONSEMA (Conselho Estadual do Meio-Ambiente), apoiado pelas multinacionais da celulose que obteve junto ao Tribunal de Justiça do Estado a cassação da liminar concedida à AGAPAN que visava entravar um novo zoneamento para o plantio de espécies exóticas (eucalipto, pinus e acácias). O CONSEMA, sintomaticamente defendia as intenções daquelas empresas que irão lucrar com o zoneamento ambiental. A coisa ficou "uma zona". Os ambientalistas, minoria no órgão, tiveram que amargar a derrota do bom-senso. Há um argumento sofista a respeito dos projetos, no quais a Stora Enzo vai fazer um "investimento" de US$ 400 milhões, a Aracruz de US$ 2,8 bilhões e a VCP US$ 1,3 bilhão (Zero Hora, 10/04/2008, pág. 5). Eles não são bonzinhos. É que na Europa é proibido plantar eucaliptos e instalar fábricas de celulose.
A visão sofista desse tipo de atividade revela que se trata de um investimento apenas na base florestal, é um aporte muito mais industrial do que social. Com essa decisão o governo gaúcho abre mão de sua função de preservar a vida, a biodiversidade e o patrimônio genético gaúcho. Vai nos custar caro.
Esse plantio, liberado em todo o Estado, vai expulsar a agricultura familiar, que representa 70% da produção nacional. As exóticas extraem da terra o dobro da água que as demais árvores. Os danos são irreversíveis. Por essas razões, um Juiz de São Paulo proibiu o plantio de pinus. Aqui as coisas foram facilitadas. A lixiviação do solo tira, definitivamente, todos os nutrientes naturais da terra. Tem gente que defende essa plantação predatória sem conhecer a extensão do problema, apenas seduzido pelo lucro ofertado. Para o latifundiário que não quer trabalhar, nem correr os riscos da agricultura ou da pecuária, nada mais cômodo que arrendar a terra às multinacionais.
Até a semana passada, havia uma delimitação da chamada "faixa de fronteira", por uma questão de segurança. Nessa faixa não era permitida a instalação de empresas estrangeiras. Isso já, já vai cair, e quando acordarmos estaremos cercados de nefastas fábricas de celulose.
Biocombustível
Quanto ao biocombustível, cuidado! Estamos prestes a repetir o desastre da soja. Plantávamos trigo, feijão, batata e outros produtos da subsistência básica. De repente apareceu a soja, mais rentável e trocamos a produção de alimentos pelas oleaginosas. Nosso legado será de mais lucro e mais fome.
(Por Antônio Mesquita Galvão *, Adital, 12/04/2008)
* Doutor em Teologia Moral