"Dialogue sobre Silvicultura de Manejo Intensivo no Brasil". Este é o título do evento que será realizado no Espírito Santo, entre o próximo domingo (13) e a quinta-feira (17). Um dos objetivos do encontro é "construir, a partir dos diálogos sobre o mesmo tema realizados na Indonésia e na China, um aprendizado sobre a situação atual e as tendências futuras para a silvicultura no Brasil".
Financiadora do evento, a transnacional Aracruz Celulose está mobilizando, entre outros, um grupo de pessoas das comunidades quilombolas para participar de atividades, na próxima quarta-feira (16) pela manhã. Busca, ainda, pessoas que conheçam as questões quilombolas para participar dos "diálogos" neste dia. Haverá ainda visitas à comunidade indígena Tupinikim, no Espírito Santo, e Pataxó, na Bahia.
O evento será realizado pelo Instituto BioAtlântica, organização financiada pela Aracruz Celulose para atuar junto a entidades ambientais. "Dialogue sobre Silvicultura de Manejo Intensivo no Brasil" será realizado no Novotel Hotel, em Vitória.
Os organizadores informam que são também objetivos do encontro "compreender o contexto no qual a silvicultura de manejo intensivo vem sendo implantada no Brasil, assim como entender os processos relacionados à disputa pelo uso da terra com outros setores da sociedade; evidenciar e esclarecer as particularidades da silvicultura de manejo intensivo no Brasil, e revisar e inserir novas questões sobre os sistemas de melhores práticas de manjo, no contexto da sua implantação no Brasil, considerando as lições aprendidas".
E ainda, "abordar os diferentes aspectos sociais e ambientais relacionados à silvicultura no Brasil; conhecer os diferentes avanços da tecnologia para o desenvolvimento da silvicultura, e incorporar a experiência brasileira às iniciativas sobre silvicultura de manejo intensivo no âmbito do The Forests Dialogue".
Participam, segundo os organizadores, "Co-Chairs James Griffiths - WBCSD; André Guimarães, Instituto BioAtlântica; Peter Kanowski, Australian National University, e Carlos Roxo, Aracruz Celulose".
Empresa implantada a ferro e fogo no Estado
Em novembro do ano passado, a Aracruz Celulose comemorou 40 anos de implantação no Brasil. A empresa foi implantada a ferro e fogo e deixa um rastro de destruição do Estado. Afetou até quase o aniquilamento das culturas indígenas, quilombolas e camponesas.
A empresa foi implantada com favores da ditadura militar e, nestas quatro décadas, sua monocultura destruiu o solo e a água, além da biodiversidade da mata atlântica. Sobre suas atividades no Espírito Santo, a Aracruz Celulose registra em seu site: "novembro de 1967, implantação dos primeiros plantios de eucalipto".
A empresa é um projeto do empresário norueguês Erling Sven Lorentzen, casado com a princesa Ragnhild, irmã do rei Harald V. Erling foi substituído na empresa Haakon Lorentzen.
Lorentzen conseguiu seu intento no Brasil aliando-se às mais altas figuras da ditadura militar, como o general-presidente da República Ernesto Geisel. E com a ajuda dos representantes dos militares no Espírito Santo, os governadores biônicos (não eleitos pelo povo e nomeados pelo governo federal) Arthur Carlos Gerhardt Santos e Cristiano Dias Lopes. Foi Gerhardt que começou a preparar o terreno para o domínio da Aracruz Celulose, em abril de 1972.
Arthur Carlos, à frente do Banco de Desenvolvimento do Estado, atual Bandes, no governo Christiano Dias Lopes Filho (final dos anos 60), foi quem fez toda a trama para entregar grande parte do território capixaba à Aracruz Celulose. A preço praticamente simbólico, as terras públicas ou assim consideradas pelo governo arbitrário, foram vendidas a 10 décimos de centavos o metro quadrado (a moeda, da época, era ainda o cruzeiro).
Mesmo antes das negociatas com o governo federal, a Aracruz Celulose já estava em campo. Com a proteção e os poderes conferidos pela ditadura militar tanto no plano federal como no estadual, a empresa ao longo de sua história sempre empregou a violência contra os índios, quilombolas e pequenos produtores rurais.
Na fase de implantação da empresa, o processo de ocupação do território indígena foi comandando pelo major PM Orlando Cavalcante, que pertencia ao Sindicato do Crime. O major era temido por torturar, antes de matar suas vítimas, e sua atuação foi também contra posseiros que ocupavam parte das terras indígenas no município de Aracruz. Dos índios, a Aracruz Celulose tomou mais de 40 mil hectares de terras. Destes, os índios só estão conseguindo recuperar 18.027 hectares.
Contra os quilombolas no norte do Estado, a Aracruz Celulose usou os serviços do tenente Merçon, do Exército. Este tomava as terras dos descendentes dos negros escravos a força ou pagando a preços vis. A Aracruz Celulose é a maior ocupante do território negro no Espírito Santo, de cerca de 50 mil hectares, como comprovam pesquisas científicas realizadas pela Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes).
A empresa também tomou terras de agricultores que eram donos de posses. Sem contar as terras devolutas, que por lei devem ser destinadas à reforma agrária. E, até hoje, emprega policiais militares e civis ligados ao crime para manter seus plantios e instalações, como denunciou este ano o Conselho Estadual dos Direitos Humanos (CEDH).
A Aracruz Celulose destruiu no Espírito Santo pelo menos 50 mil hectares de mata atlântica e toda a sua biodiversidade. Em seu lugar, plantou eucalipto.
(Por Ubervalter Coimbra, Século Diário, 11/04/2008)