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desmatamento da amazônia inpe
2008-04-11
Inpe explica monitoramento da região com três satélites. MT, PA e RO são os campeões do fogo e derrubadas.

Com paciência e muita didática, o diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), Gilberto Câmara Neto, explicou finalmente hoje na Câmara dos Deputados o Projeto de Estimativa de Desflorestamento da Amazônia (Prodes), que monitora a Amazônia por satélite. Durante audiência pública sobre o desmatamento na Amazônia, ele dividiu o desmatamento na região em duas grandes modalidades: corte raso, ou corte e queima - método largamente usado nas décadas de 1970 e 1980, por ser rápido - e degradação progressiva, que vem ocorrendo desde o fim da década de 1990. Segundo o Inpe revelou em janeiro deste ano, o desmatamento na região amazônica entre agosto e dezembro de 2007 foi de 3.235 km², o equivalente a cerca de 320 mil campos de futebol. A maior parte dos desmatamentos detectados no período se concentrou em Mato Grosso (53,7%), Pará (17,8%) e Rondônia (16%). Entre as causas apontadas pelo instituto para o aumento das áreas desmatadas, estão a seca prolongada e uma possível influência do avanço da produção de soja e da pecuária nas regiões.

Nesse aspecto, o desmatamento começa com a extração seletiva de madeira, depois se sucedem as queimadas, em seguida a semeadura do pasto, até o corte total da vegetação. "O processo se tornou conhecido por engana satélite, já que os produtores da área acreditavam ser possível fugir da fiscalização", comentou.

O plenário 2 lotou e não houve lugares para acomodar tantos assessores e ambientalistas. A audiência foi promovida pelas comissões de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural; de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável; e da Amazônia, Integração Nacional e de Desenvolvimento Regional.

O Inpe monitora o desmatamento desde 1988, época em que seus técnicos interpretavam visualmente as imagens. O Prodes representa o maior avanço até hoje conquistado e vem sendo consultado diariamente por europeus e asiáticos. Ele revela as taxas anuais de desmatamento por corte raso.

Em março de 2004, o governo lançou o Plano de Prevenção e Combate ao Desmatamento Ilegal na Amazônia e solicitou ao Inpe a criação de um sistema que monitorasse com mais eficácia que o corte raso da floresta. Veio então o Sistema de Detecção em Tempo Real (Deter), que emite sistema de alerta sobre focos de desmatamento. "Tentamos ver o desmatamento desde o seu início. Quanto mais cedo formos informados, mais fácil deter o processo", disse.

Restrição a créditos e "indústria de recursos"

Mesmo com os dados do Inpe, o secretário-executivo do Ministério do Meio Ambiente, João Paulo Capobianco, não quis prever se haverá aumento no desmatamento na Amazônia em 2008. Preferiu afirmar que "nenhum frigorífico, nenhuma serraria, nenhum produtor de ferro-gusa poderá dizer que não sabe que está comprando matéria-prima de área irregular". E advertiu: "Se ele for identificado, poderá ser co-responsablizado pelo desmatamento". Capobianco disse também que o governo determinou a co-responsabilização da cadeia produtiva com a criação, no site do Ibama, da lista das propriedades embargadas. Mencionou decretos editados em dezembro pelo governo federal para conter o desmatamento na Amazônia. Um desses decretos vincula a concessão do crédito rural à comprovação de adimplência ambiental a partir de julho deste ano. Outro prevê o embargo obrigatório das áreas onde for constatado desmatamento ilegal. "Queremos com isso garantir a punição efetiva dos infratores", disse.

O secretário lembrou que, dos R$ 3 bilhões de multas aplicadas, apenas um valor irrisório foi recolhido. Queixou-se da "indústria montada para recorrer contra as notificações".

Depois do anúncio dos dados, o governo anunciou medidas para conter o desmatamento, no entanto, em fevereiro o Sistema de Detecção em Tempo Real (Deter) voltou a detectar aumento das áreas desmatadas. Em apenas um mês (fevereiro), a área desmatada foi de 725 km². O número representa um crescimento de 13% em relação ao mês de janeiro. O Deter é um sistema de monitoramento da Amazônia por satélites que fornece dados sobre a cobertura vegetal da região. A consolidação dos dados é feita por outra metodologia, o Projeto de Estimativa de Desflorestamento da Amazônia (Prodes), que define as taxas de desmatamento.

Bioma amazônico e incentivos fiscais

O ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, afirmou na audiência que há uma distorção na definição do que é bioma amazônico e Amazônia Legal, que ocupa 61% do território nacional e abriga 15 milhões de km² de área de Cerrado. ¦Segundo ele, em termos ambientais, "não existe Amazônia Legal, porque a região abrange vários biomas". Lembrou que a Sudam criou esse conceito para efeito de planejamento econômico, mas ele passou a ser usado de forma indiscriminada.

¦Para o ministro, é necessário distinguir os dois conceitos para que o entendimento de diferentes setores do governo seja o mesmo em relação a estatísticas, por exemplo. A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, discordou. Ela disse que, se o conceito foi usado para levar incentivos para a região amazônica, também deve ser usado para corrigir os problemas provocados naquela região. ¦ A deputada Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), uma das autoras do requerimento, elogiou o fato de os ministros da Agricultura e do Meio Ambiente mostrarem unidade em relação à preservação da Amazônia. Contudo, defendeu que o combate à devastação não seja feito apenas por ações emergenciais, mas sim alinhado a políticas de desenvolvimento sustentável.

O deputado Moreira Mendes (PPS-RO) criticou a forma como vem ocorrendo o combate ao desmatamento. Não poupou a Operação Arco de Fogo. Sugeriu que o governo pague para que os produtores preservem a floresta. "A operação é uma vergonha", acusou.

A ministra Marina Silva lamentou que a unanimidade em torno da necessidade de preservação da floresta não resulte em ações práticas: "Todos concordam em compensar financeiramente aqueles que estão preservando, mas na discussão do Orçamento Geral da União para 2008 não foram destinados recursos para isso. Gostaríamos de conseguir traduzir na prática essa unanimidade."

A delegada da Divisão de Combate e Repressão a Crimes Ambientais da Polícia Federal, Fernanda Rocha Pacheco, que também participa da audiência, informou que, nos últimos três anos e meio, a PF promoveu mais de 20 operações na região amazônica para combater o desmatamento ilegal.

Até julho serão divulgadas as regras sobre o plantio de cana-de-açúcar na Amazônia. ¦ Segundo o ministro Reinhold Stephanes, a expansão dessa cultura deverá ocorrer principalmente (de 80% a 90%) em áreas atualmente ocupadas por pastagens. Reiterou que o desafio atual é aumentar a produtividade da pecuária, atualmente ocupando mais de 200 milhões de hectares no País, enquanto o cultivo de grãos ocupa 50 milhões de hectares; a cana-de-açúcar, 6 milhões; e o café, 2 milhões de hectares. "Quem efetivamente ocupa as terras no Brasil é a pecuária, com uma baixa densidade de ocupação." Ele disse que em São Paulo há uma experiência bem-sucedida que reduziu a área de pecuária com aumento de produção.

Três satélites monitoram o desmatamento da Amazônia

Landsat cruza a região a cada 16 dias e o Cbers, a cada 26. Rastreamento totaliza 5 milhões de quilômetros quadrados.

São Paulo - Os dados são processados por meio do software de informação georreferenciada batizado de Spring, desenvolvido pelo Inpe, pela IBM e pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), interpretados e auditados por especialistas do Inpe. "Feito isso, as informações são colocadas sobre uma máscara do passado e o desmatamento é identificado", resume Valeriano. As conclusões de cada levantamento são publicadas anualmente em dezembro.

Foi por meio do Prodes que o planeta tomou conhecimento do desmatamento recorde de 1995, quando foram abatidos 29,1 mil Km2 de floresta e constatou que a situação ainda estava fora do controle em 2004, quando a Amazônia perdeu 27,4 mil Km2 do seu bioma. O último relatório mostrou uma redução de 20% no desmatamento no período 2006-2007, comparado ao ciclo 2005-2006.

Desde 2003, "em prol da transparência", as informações do Prodes foram colocadas na rede. "A medida provocou um impacto interessante", conta Valeriano. Jogou, por exemplo, por terra algumas "teses", como a da ineficiência das áreas de conservação para conter o desmatamento ou a de que as áreas indígenas estavam degradadas, ele exemplifica. "Mostramos que isso não era verdade", afirma, mostrando o exemplo da região de Marabá, no Pará, onde o desflorestamento contorna as terras indígenas.

Em 2005 a taxa caiu 30% e em 2006 o Inpe registrou redução de 14 mil km2 de floresta. O Prodes, apesar de "invejável", tem limitações. Uma delas é a quantidade de nuvens que recobrem a região. "A janela de observação da Amazônia vai de maio a outubro. Fora desse período é difícil observar porque fica tudo nublado", explica Valeriano. Outro problema é o risco da dependência do Landsat- 5, satélite lançado em 1984 para operar durante 5 anos, mas que ainda está ativo depois quase um quarto de século. "A saída é recorrer também às imagens do Cbers", comenta Valeriano.

INPE compra dados

O Landsat cruza a Amazônia a cada 16 dias e o Cbers, a cada 26. O Inpe também compra dados do DMC - um consórcio de microssatélites liderado pela Inglaterra -, do Spot e do ResourceSat. Esses satélites funcionam como uma espécie de back-up das informações coletadas pelo Prodes e também são utilizados para " varrer nuvens", como ele diz. "Quando se calcula o desmatamento, é preciso estimar também quanto de floresta não foi possível observar por causa das nuvens e projetar a taxa de desmatamento na área", diz Valeriano. O percentual de "não-observação", como ele sublinha, varia de 10% a 15%.

O terceiro problema é que as informações do Prodes são uma "imagem póstuma" da floresta, do desmatamento consumado, e não fornecem uma base para que a ação governamental se antecipe à dinâmica do desflorestamento. Foi para suprir essa carência que o Inpe iniciou, a partir de 2004, o projeto Detecção de Desmatamento em Tempo Real (Deter), que utiliza imagens do sensor Modis do Satélite Terra, lançado em 1999 no âmbito do programa Earth Observing System (EOS), e do sensor WFI instalado a bordo do Cbers- 2, para dar informações quinzenais ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). "O Deter foi concebido para dar suporte à fiscalização", diz Valeriano.

Soluções de risco

A resolução espacial do sensor do Modis e do Cbers, de 250 metros, não é tão boa quanto a do Landsat, com 30 metros. "Com essa resolução, estamos no limite da tecnologia para esse tipo de aplicação", reconhece Valeriano. A principal função do Deter, no entanto, não é calcular o desmatamento, mas "apontar" situações de risco com o objetivo de subsidiar a decisão do que deve ser fiscalizado, observa o coordenador do programa. As informações são transmitidas quinzenalmente ao Ibama e mensalmente publicadas no site do Inpe.

Com essa missão, o Deter operou de janeiro a outubro de 2004 e de 2005, com recursos do Inpe. Em 2006 contratou a Fundação de Ciência, Aplicações e Tecnologia Espaciais para colaborar no processamento dos dados. Os resultados até agora mostraram-se compatíveis com os levantamentos do Prodes. "Em 2006/2007 o Prodes apontou uma queda no desmatamento de 27 mil para 19 mil km2. O Deter observou 12 mil desses 19 mil km2. O Deter vê entre 40% e 60% do que o Prodes enxerga", compara Valeriano.

Em 2007 o levantamento do Deter se estendeu de março a dezembro. "Pegamos várias imagens do Modis e observamos cinco por quinzena, uma a cada 3 dias, que é a freqüência de cobertura do satélite. Selecionamos e interpretamos por meio do modelo de mistura linear e divulgamos o dado em janeiro ", ele conta. As estimativas apontaram que, entre agosto e dezembro de 2007, as áreas degradadas na Amazônia somavam 3.235 km2. Como o Deter só "lê" de 40% a 60% do desmatamento registrado pelo Prodes, o desflorestamento pode ter atingido 7 mil km2. Confirmado esse número, o desmatamento estaria agregando uma média de mais de mil km2 por mês.

Risco de erro

A notícia provocou reações distintas de várias áreas do governo federal e dos estados e o levantamento do Inpe foi colocado sob suspeita. "O objetivo do Deter não é estimar a área total desmatada na Amazônia", insiste Valeriano. Por conta da resolução dos sensores Modis e WFI/Cbers, há risco de erro. "Para calcular a área desmatada, o Inpe continuará a utilizar imagens de melhor resolução dos sensores do Landsat e Cbers", afirma. O Deter, entretanto, fornece o tamanho de cada polígono desmatado, o que permite uma "hierarquização da fiscalização".

Valeriano explica que, além da resolução espacial dos satélites, os dois projetos têm "leituras" distintas do desmatamento: o Prodes identifica o corte raso - ou seja, o desmatamento rápido -, enquanto o Deter capta também as áreas desmatadas em processo de degradação continuada, por corte seletivo de madeira e queimadas recorrentes. "Estamos apontando potenciais indícios de desmatamento, que não são contabilizados como tal. No leste do Pará e no Mato Grosso há exploração seletiva da madeira e o solo fica exposto.

Para o Prodes, isso não é necessariamente desmatamento, dependendo da fração do solo exposto. Mas, para o Deter, trata-se de desmatamento. É uma forma de converter a floresta sem corte raso", sublinha. "Se o Deter se ocupasse apenas de corte raso, não acompanharia a dinâmica do desmatamento, e a contribuição do Ministério da Ciência e Tecnologia no Grupo Interministerial de Combate ao Desmatamento, coordenado pela Casa Civil, perderia sentido." O Inpe faz planos de avançar ainda mais a tecnologia de monitoramento. "Estamos negociando com a Índia para ter acesso aos dados do ResourceSat. O nosso plano é conseguir fazer um levantamento multitemporal com uso de múltiplos sensores de melhor resolução, na casa dos 50 metros."

Janela de observação vai de maio a outubro

São Paulo - O processo de desflorestamento da Amazônia se acelerou a partir da segunda metade do século XX com a expansão da fronteira agrícola, da construção de estradas e instalação de pólos de desenvolvimento regionais. No final dos anos 1970 - depois da inauguração da rodovia Transamazônica e a pedido da Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia (Sudam) -, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) fez o primeiro balanço do estrago com o auxílio das imagens enviadas pelo Landsat-1, satélite da Nasa, a agência espacial norte-americana. Constatou-se que 2,5% da região já estava degradada.

Dez anos depois, quando as queimadas na região passaram a chamar a atenção internacional - consta que a fumaça sobre a floresta pôde ser observada desde a escotilha do ônibus espacial Columbia - e a taxa de desflorestamento saltou para 10%, o país decidiu adotar uma política de controle do desflorestamento e criou, em 1988, o Programa de Monitoramento do Desmatamento da Amazônia (Prodes).

Duas décadas de estudos

Ao longo de 20 anos - e ao preço da devastação de 17% do bioma da Amazônia - o Brasil desenvolveu um sistema de rastreamento dos aproximadamente 5 milhões de quilômetros quadrados (Km2) da Amazônia Legal qualificado de "invejável" pela revista Science nº 316, de 27 de abril de 2007. Nesse período, a tecnologia de monitoramento evoluiu de um sistema analógico, com resolução de 1:500 mil com imagens em branco e preto, para um sistema digital na escala 1:250 mil. "A partir da década de 1990 passamos a desenvolver softwares e a fazer o monitoramento não mais com base na interpretação visual, mas em processamento de imagem", lembra Dalton de Morisson Valeriano, coordenador do Programa Amazônia do Inpe.

A matéria-prima dessa análise são imagens enviadas pelo Landsat-5 e pelo satélite sino-brasileiro Cbers, com resolução espacial de 30 metros. As três bandas dos dois satélites captam a quantidade de radiação refletida na superfície do solo, discriminada por faixa de espectro - visível e vermelho próximo e infravermelho médio. Essas informações - que, devidamente modeladas, permitem identificar plantas verdes, solo, sombra e água - são processadas por algoritmos que dão a proporção da presença de cada um desses componentes em cada pixel da imagem.

Classificação de imagens

O algoritmo para transformação dos dados dos satélites - desenvolvido na década de 1980 por Yosio Shimabukuro, pesquisador do Inpe - segue o modelo conhecido como mistura linear (liner mixture model). "Linear porque parte do pressuposto de que os elementos que compõem a imagem são independentes e mistura porque lá embaixo, de fato, eles estão todos misturados", explica Valeriano.

Nessa classificação de imagens, a vegetação lisa e homogênea corresponde a um tom verde-claro; a floresta aparece em verde-escuro porque tem um componente de sombra mais forte; o solo em tom róseo, já que mescla o azul e o vermelho; e água em preto. A metodologia de análise das imagens é baseada na segmentação, classificação e edição, de forma a identificar desmatamentos com área mínima de 6,25 hectares.

Esse conjunto de informações forma um mapa com 229 imagens digitais, cada uma delas correspondente a uma área de 160 x 160 km. Desse total, 213 imagens são interpretadas, já que o Prodes não avalia a situação das áreas de Cerrado. "O Cerrado pega fogo e fica preto, como as áreas de desmatamento. No ano seguinte volta a ser Cerrado e induz a taxas de erro muito grandes", explica Valeriano.

(Agência Amazônia, FGV, 11/04/2008)

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