Nas duas reuniões extraordinárias do Conselho Estadual do Meio Ambiente (Consema), dias 04 e 09/04, que resultaram na aprovação da proposta do governo para o Zoneamento Ambiental da Silvicultura (ZAS), quarta-feira, chamou a atençaõ a ausência do conselheiro representante da Fundação Zoobotânica do Rio Grande do Sul (FZB), biólogo Marcelo Duarte. Ele confirmou, por telefone, os comentários de que foi impedido de comparecer às reuniões.
Primeiro, procuramos o presidente da FZB, Luiz Gheller, mas este respondeu por uma assessora que deveria ser entrevistado o próprio Marcelo Duarte. “Tive problemas para sair, me arrumaram outra agenda para cumprir no mesmo horário”, disse ele, no final da tarde de quarta-feira. Essa outra agenda, acrescentou, foi uma reunião do grupo de trabalho que prepara o Diagnóstico Ambiental do Estado, a ser encaminhado ao Consema apenas no meio do ano.
Nada importante para justificar a ausência dele nas duas reuniões mais decisivas dos últimos anos no órgão máximo da área ambiental no Rio Grande do Sul. “A decisão não foi minha, cumpri a decisão que me mandaram, de comparecer à reunião do diagnóstico”, acrescentou. A ordem, segundo ele, partiu “da direção da casa (FZB), a direção pediu, e eu fui”.
Na reunião extraodinária anterior, sexta-feira, não arranjaram outro compromisso no mesmo horário, mas também não compareceu por ordem superior: “Na anterior também não fui porque me disseram para não ir”, afirmou Marcelo Duarte. Ele contou, no entanto, que como alternativa foi encaminhado, segunda-feira, ao Conselho um documento dos técnicos da FZB envolvidos com o zoneamento, contendo sugestões para o debate dos demais conselheiros.
A Fundação Zoobotânica, até agora, foi o único órgão da área ambiental do Estado onde ainda não foram registradas trocas e transferências de diretores e servidores, mas é muito grande o temor de que comece uma retaliação de parte da Secretaria do Meio Ambiente (Sema) e Fundação Estadual de Proteção Ambierntal (Fepam). A diretora-presidente da Fepam é a mais acusada de pressionar e intimidar servidores que não concordam com a proposta aprovada.
Pedido de Providências ao MP
Outra questão importante é que o documento não foi distribuído e nem lido para os demais conselheiros, como deveria acontecer, já que foi entregue no Consema dois dias antes. Quem o recebeu para encaminhá-lo à direção do órgão, consta na via devolvida, foi o secretário-executivo Tiago Castagnetti. O parecer também foi enviado por e-mail, com confirmação de recebimento.
"Vamos solicitar ao Ministério Público para que tome providências para termos acesso a ele. Era um direito nosso termos tido conhecimento deste parecer dos técnicos antes da reunião extraordinária. Se (os conselheiros) ficaram reunidos até as nove horas da noite para aprovação, porque isso não foi lido e discutido?", questionou o biólogo Paulo Brack, professor da Ufrgs e conselheiro do Consema.
Temeroso, Marcelo Duarte alegou que não tinha cópia com ele, mas conseguimos com outro servidor da Sema ver o seu conteúdo, que a essa altura já está circulando em mensagens. Tem 16 páginas, com propostas objetivas do corpo técnico da FZB que, segundo um dos autores, não contemplam totalmente as ONGs ambientalistas e nem papeleiras, mas oferecem algum regramento ao plantio de exóticas e permitem o amplo desenvolvimento da silvicultura.
Oito Milhões de Hectares
Conforme a divisão do Estado em 45 Unidades de Paisagem Natural (UPNs), eles fizeram uma proposta de percentuais de ocupação pela silvicultura em cada uma, com tamanhos máximos de plantio e distanciamento mínimo entre cada UPN.
Para as áreas de alta restrição (v. mapa), 2%, 5%, até 10% de ocupação com pinus e eucalipto, e monitoramento para verificar a possibilidade de ampliação. Já nas áreas de média restrição para a silvicultura, 15%, 20%, 25% e 30% de ocupação. E nas áreas com baixa restrição, 35% a 50% de ocupação.
”O importante é que essas regras, esses parâmetros reguladores, são apresentados como inviabilizadores da atividade, mas no documento mostramos justamente que não é o caso, seguindo nossas sugestões teríamos 8 milhões de hectares para silvicultura”, comenta um técnico.
“Não é exatamente onde querem, para não atrapalhar a política de compra de terras deles, porque querem comprar conforme a oferta, e se houver limites eles precisam distribuir os investimentos por uma área um pouco maior. Outro temor (das papeleiras) é que nas áreas já plantadas o Ministério Público exija retroatividade para os plantios já estabelecidos”, completa.
Distâncias dos Maciços
Para os maciços - plantios com 500 hectares ou mais - em 15 das 45 UPNs não haveria nenhuma exigência de distanciamento entre os maciços. Nas demais UPNs, foram propostos distanciamentos mínimos entre eles de 01 a 05 quilômetros. Em apenas duas áreas teria que haver a distância máxima de 05 quilômetros, nas regiões de Quaraí/Santana do Livramento e Bom Jesus/São José dos Ausentes. Ali estão os maiores remanescentes do Bioma Pampa e dos Campos de Cima da Serra.
Segundo a proposta, entre os maciços não está proibida a presença de bosques menores nas pequenas propriedades, esclarece a proposta. “São regras claras que garantem que a silvicultura vá se expandir dentro de limites seguros. No futuro pode se aperfeiçoar, mas não podemos partir de uma falta total de critérios, como foi aprovado no Consema, para não chegarmos depois à conclusão de que se passou dos limites e não é mais possível voltar atrás”, defendeu o técnico que mostrou a proposta dos seus colegas da FZB.
Embora tenha sido votado e vencido o modelo de ZAS que o governo do Estado queria, na noite de quarta-feira, sem restriçoes definidas para a silvicultura, as ONGs ainda estão se movimentando, com o apoio discreto dos técnicos do órgão ambiental, para tentar reverter essa decisão. Procuramos o secretário do Meio Ambiente e presidente do Consema, Otaviano Moraes, para perguntar-lhe sobre o impedimento da presença do conselheiro da FZB na reunião e o sumiço do documento, deixando as perguntas com sua assessoria, mas até 19h não houve resposta. O espaço continua disponível.
(Por Ulisses A. Nenê, EcoAgência, 10/04/2008)