Presidente combina com ministros elaborar plano
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva combinou ontem com os ministros que o acompanharam no vôo à Holanda montar uma estratégia mais permanente de defesa do álcool como combustível alternativo, em face do que o ministro Miguel Jorge (Desenvolvimento, Indústria e Comércio) considera uma "surpreendente campanha na Europa" contra o álcool.
Se se trata de uma campanha e se ela é surpreendente, é uma questão subjetiva. O que há de concreto é que, depois de um momento de deslumbramento com os combustíveis alternativos, em especial o álcool, começaram a surgir críticas a partir de três tipos de argumentos.
Primeiro, as áreas plantadas com cana-de-açúcar para produção do álcool tomariam terras que deveriam ser destinadas a alimentos.
Rebate Miguel Jorge: "No Brasil, não há essa substituição. A cana-de-açúcar ocupa apenas 4% do território. Além disso, avanços na produtividade na pecuária poderiam liberar áreas hoje usadas para pastagens, sem, portanto, afetar a produção de alimentos".
Segunda crítica: o uso de trabalho precário ou até mesmo escravo em canaviais. O ministro brasileiro diz que "os europeus estão tomando casos ocorridos em duas ou três fazendas no Pará como se fossem uma prática generalizada no Brasil".
Miguel Jorge diz que, em São Paulo, não há esse problema, até porque, segundo ele, a vigilância da mídia não permitiria.
Terceira crítica: o álcool é menos favorável ao ambiente do que se supõe e, para chegar a ele, causam-se danos ambientais eventualmente superiores aos benefícios que a substituição da gasolina traz.
"Não consigo imaginar a vida em São Paulo, com seus 6 milhões de veículos, se 90% da frota não fosse flex-fuel", diz o ministro, aludindo aos veículos capazes de usar diferentes tipos de combustível. Conta ainda que, no bimestre fevereiro/ março, pela primeira vez o uso do álcool nesses veículos igualou-se ao da gasolina.
Obsessão presidencial
Todos esses argumentos, com maior ou menor ênfase, já foram utilizados mais de uma vez pelo próprio presidente Lula, em seus discursos no exterior, ele que se tornou um verdadeiro obcecado pelo tema dos combustíveis alternativos.
Se, agora, Lula pede uma estratégia permanente é porque os esforços não produziram efeitos. Mas Miguel Jorge argumenta que Lula vai num dado mês a um país, depois a outro país, depois a outro, o que fragmenta demais o esforço pró-álcool.
"Não temos uma estratégia permanente", admite o ministro.
É ela que Lula determinou que seja elaborada, reunindo os especialistas dos ministérios do Desenvolvimento Agrário, do Meio Ambiente, da Agricultura e do Desenvolvimento.
"Talvez estejamos começando tarde a nova estratégia", admite Miguel Jorge.
(Clóvis Rossi, Folha de São Paulo, 10/04/2008)