Governo patrola ambientalistas e aprova zoneamento sem restrições para silvicultura no RS
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2008-04-10
Foi ontem (09/04) à noite que o plenário do Conselho Estadual do Meio Ambiente (Consema) aprovou, sem a presença das ONGs ambientalistas, o Zoneamento Ambiental para Silvicultura (ZAS) do Rio Grande do Sul.
A votação só foi possível depois que o Presidente do Tribunal de Justiça, Desembargador Armínio José Abreu Lima da Rosa suspendeu, por volta das 22h, a eficácia da liminar proferida pelo Juízo da 5ª Vara da Fazenda Pública da Capital que impedia a votação das Propostas do ZAS em reunião do Consema, reconhecendo o direito do Estado do Rio Grande do Sul de decidir sobre questões que possam causar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas.
O texto aprovado incorporou as propostas aprovadas pelas Câmaras Técnicas Permanentes da Biodiversidade e Política Florestal, da Agricultura e Pecuária e de Assuntos Jurídicos (veja abaixo). Dessa forma, o zoneamento se baseará em um planejamento misto, mesclando a Unidade de Paisagem Natural (UPN) previsto no texto original elaborado pela Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam) com a legislação federal no que se refere ao solo e recursos hídricos. Para o Presidente do Consema e titular da Sema, Otaviano Moraes, a aprovação traduz o desejo dos gaúchos por um ambiente saudável, conservado e protegido. Segundo ele, “o zoneamento é essencial porque limita o espaço desta atividade econômica”.
Confusões e ofensas
A intenção era votar o ZAS, mas na reunião do Consema iniciada na tarde de ontem (09/04), teve de tudo. De abandono da reunião por parte das ONGs, faixas protestando contra o eucalipto no Pampa e até um bate-boca entre um dos pioneiros do movimento ambientalista, Flávio Lewgoy e o presidente da Sociedade de Engenharia do Rio Grande do Sul, Luis Antônio Germano da Silva, que causou mau-estar no auditório lotado da Sema.
Logo na abertura dos trabalhos, a presidência do conselho foi notificada que uma liminar expedida pela 5° Vara da Fazenda Pública do Foro Central de Porto Alegre impedia a votação do ZAS, ao garantir o prazo de 15 dias do pedido de Vista do Processo solicitada pela Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan) na ultima sexta-feira (04/04). As ONGs rejeitam a retirada de restrições a percentuais limitadores do plantio de eucalipto em áreas de de alta e média vulnerabilidade proposta pelas Câmaras Técnicas da Biodiversidade e Política Florestal, da Agropecuária e Agroindústria, e de Assuntos Jurídicos.
Mesmo sem votação
“Esses percentuais das Unidades de Paisagem foram retiradas na última hora”, justifica Paulo Brack, da ONG Ingá. O ambientalista ainda questionou o real tamanho dos maciços florestais que serão permitidos pelo ZAS. Além dessa questão, os ambientalistas alegam dúvidas sobre o tamanho dos corredores entre esses maciços. “Pelo atropelo final essas questões fundamentais foram retiradas das discussões”, lamenta. O presidente da Câmara Técnica de Biodiversidade e Política Florestal do Consema, Ivo Lessa (Farsul / Irga), contestou as razões do pedido de Vista. Ele ressaltou que a Câmara era aberta a todos, inclusive com direito a voto. “É necessário respeito pelas pessoas que nela trabalharam”, argumenta.
O presidente da Sociedade de Engenharia, reafirmou que “ está plenamente convencido de que o dano ambiental provocado pelos plantios de eucalipto no Estado serão baixos”. De acordo com Germano, sua decisão de apoiar os projetos florestais no Estado são embasadas por “diversos estudos a que teve acesso nos últimos tempos”.
Foi o momento mais crítico da tarde. Antes de abrir seu apoio à Silvicultura no Estado, o engenheiro rendeu homenagens a Lewgoy, que agradeceu, mas recusou o mesmo por partir de uma entidade conservadora e que sempre votou em favor das empresas, nunca observando o aspecto social nas discussões do Consema. Germano revidou acusando a Agapan de ser omissa e covarde por fugir dos debates das Câmaras Técnicas. Os ânimos se exaltaram. Foi a partir daí que as ONGs decidiram por deixar a reunião.
Não foram apenas as ONGs que se retiraram da sala. Momentos antes, o Secretário Estadual do Meio Ambiente, Carlos Otaviano Brenner de Moraes, que acumula o cargo de presidente do Consema, também desapareceu. Rumores davam conta que, o ex-promotor buscava incansavelmente derrubar a liminar para dar início à votação do ZAS.
ONGs querem ser ouvidas
A diretora do Núcleo Amigos da Terra, Lúcia Ortiz, lembra que a Câmara não tem uma ata sequer com o que foi aprovado. E que a votação sobre os limites quantitativos dos plantios e uma consequente extinção de biodiversidade não foi consensual. “Propomos que as ONGs sejam ouvidas porque podemos contribuir para a discussão”, afirma. O que se discute na Câmara Técnica da Biodiversidade e Política Florestal é a intenção de limitar o plantio em 2% a 10% em áreas tidas como de alta vulnerabilidade, conforme aspectos hidrológicos, do solo, fauna e flora. Outro ponto polêmico é a possibilidade de limitar em 15% a 30% para áreas de média vulnerabilidade.
Paulo Brack, do Ingá diz que é possível chegar a um consenso desde que as entidades ambientalistas possam participar das discussões, sem o atropelo do Governo do Estado. “No entanto, nesse momento, não há condição de debate na Câmara Técnica”, lamenta. Conforme Brack, a Sema atua em desvio de função, em prol dos interesse das grandes empresas. “Se não colocarmos esses percentuais de restrição, podemos colocar espécies em extinção”, afirma. Sobre a suposta retirada de restrições aos percentuais limitadores do plantio, o representante da Secretaria do Desenvolvimento e dos Assuntos Internacionais (Sedai), Doadi Brena, ressaltou que em nenhum momento a matriz de biodiversidade foi extinta. "Foi retirada apenas uma equação linear que apontava um índice de vulnerabilidade, sem prejuízos a fauna e flora", garante ele.
Licenças sem o Zoneamento
Para a presidente da Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam), Ana Pelini, legalmente o órgão ambiental pode tocar as licenças sem o ZAS, de acordo com a legislação vigente e estudos técnicos. O Zoneamento, explica ela, facilita e oferece segurança jurídica ao empreendedor. “ É uma diretriz apenas”. O presidente da Associação Gaúcha das Empresas Florestais (Ageflor), Roque Justen, concorda que a Fepam têm profissionais competentes e condições técnicas para tanto. Conforme Justen, cabe uma análise individual de cada projeto, mesmo sem a conclusão do zoneamento. A Ageflor calcula que deixaram de ser plantados em 2008 cerca de 80 mil hectares, acarretando prejuízos às empresas e frustração nos municípios que receberiam os investimentos de toda cadeia florestal.
(Por Carlos Matsubara, Ambiente JÁ, 10/04/2008)