Até 20h30min, os conselheiros do governo do Estado, das empresas e entidades que apoiam as papeleiras continuavam reunidos, aguardando a cassação da liminar para votarem o zoneamento ambiental da silvicultura. ONGs e Ibama se retiraram mas reunião pode prosseguir até a madrugada.
Lanches estavam sendo providenciados no início da noite para acalmar a fome dos conselheiros representantes do governo, das entidades empresariais e outras que apoiam a implantação dos megaprojetos das papeleiras no Estado, reunidos desde as 14h de quarta-feira (09/04) no auditório da Secretaria Estadual do Meio Ambiente (Sema). Eles aguardam a cassação, se acontecer, da liminar obtida pela Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan) que suspendeu a votaçao do Zoneamento Ambiental da Silvicultura (ZAS), marcada para quarta, em reunião extraordinária do Conselho Estadual do Meio Ambiente (Consema).
Quando começou a reunião, o secretário estadual do Meio Ambiente, Otaviano de Moraes, avisou que havia recebido uma ordem judicial da 5ª. Vara da Fazenda Pública, suspendendo liminarmente a reunião em função do mandado de segurança da Agapan. A entidade, com base no Regimento Interno do Consema, pediu prazo de 15 dias para examinar a proposta que está sendo apresentada, em função das modificações introduzidas no projeto original dos técnicos da Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam).
Antes, numa exposição com data-show, o secretário e presidente do Consema mostrou o que, segundo ele, seriam diferenças entre pedido de vistas de documento e vista de processo. Procurador por profissão, o secretário disse a seguir que teria havido confusão nos dois conceitos quando foi concedida a liminar. Logo em seguida, colocou em votação a continuidade da reunião para debates, proposta que foi aprovada.
Na verdade, um artifício para que os conselheiros continuassem reunidos, enquanto ele saía, deixando um substituto para dirigir os trabalhos, a fim de providenciar a tentativa de cassação. Assim, ainda é possível que o ZAS seja votado ainda nesta noite, ou na madrugada, conforme a resistência dos que permaneceram no recinto e a decisão da Justiça. Após cerca de uma hora de debates tensos, às 16h, os representantes das ONGs se retiraram.
O biólogo e professor da Ufrgs Paulo Brack, da ONG Ingá, criticou a ausência dos técnicos da Fepam e Fundação Zoobotânica, que por suas entidades afirmam estarem sendo pressionados pelas direções da Sema, Fepam e FZB. Em entrevista à EcoAgência, ontem, a diretora-presidenta da Fepam, Ana Pellini, confirmou ter pressionado servidores. “É uma vergonha o que está acontecendo”, afirmou Brack, antes de se retirar.
Uma novidade em relação à reunião anterior (04/04) foi a presença de estudantes com faixas protestando contra a impantação das florestas de pinus eucalipto na Metade Sul. “Conselheiros! Certas decisões não deve ser pautadas pelo lucro. Aja com responsabilidade. A saúde de nossas crianças está em suas mãos! Vida é BIODIVERSIDADE”, dizia uma delas.
Farsa de Democracia
O químico e geneticista Flávio Lewgoy, conselheiro da Agapan no Consema, criticou a composição do conselho, onde o governo estadual tem maioria folgada para aprovar o que quiser, como disse o secretário Otaviano Moraes na reunião passada. “O governo tem maioria automática no conselho, a composição dele desde o início foi distorcida, botaram onze representantes de secretarias e mais alguns que automaticamente votam com o governo, é uma sopa aprovarem o que quiserem”, disse Lewgoy.
Ele citou o exemplo o Conselho Estadual da Saúde, onde a representação é paritária: 25% dos representantes apenas são do governo, 50% da sociedade civil e 25% das entidades empresariais do setor 25% (hospitais e outros). “A Agapan tem participado no Conselho Nacional do Meio Ambiente, na CTNBio e temos visto, realmente, o totalitarismo do grande empreendedor, do grande capital, em relação à sociedade, nestes conselhos somos sistematicamente derrotados”, afirmou Celso Marques, ex-prsidente da ONG .
"Se pegarem as atas deste conselho vão ver que os ambientalistas são derrotados sistematicamente, estamos aí por compromisso com a sociedade, fazendo muitas vezes o papel de vaca de presépio. Mas se a gente não comparecer nestas instâncias nos cobram ou não ficamos sabendo o que está sendo decidido no Estado”, continuou Marques. “Estamos vivendo uma farsa de democracia”, arrematou.
Sem Hora para Terminar
Após a saída das ONGs a reunião prosseguiu, com os conselheiros restantes criando temas para debates. Depois que vários já tinham falado, as três Câmaras Técnicas do Consema apresentaram seus pareceres e, para esticar a conversa, foi sugerido que fosse lido todo o zoneamento original feito pelos técnicos da Fepam, descaracterizado na proposta final, e discutido ponto à ponto.
O conselheiro do Ibama que havia permanecido, Marcelo Madeira, pediu então que fosse fixado um teto de horário para terminar a reuniião. A sugestão não foi aceita e ele se retirou, enquanto alguém também saía para buscar os sanduíches dos que permaneceram. A informação que circulava, às 19h30min, era que o secretário Otaviano de Moraes estava no Tribunal de Justiça e a cassação da liminar poderia sair a qualquer momento.
(EcoAgência, 09/04/2008)