O aquecimento global é real, é em parte causado por atividades humanas e deve permanecer modesto nos próximos decênios. É certo que não temos capacidade tecnológica para reduzi-lo significativamente agora, mas essa tecnologia deve surgir se investirmos no futuro. Essa foi a minha mensagem na conferência que fiz no dia 31/3, promovida pelo Centro de Liderança Política e realizada no Ibmec (Instituto Brasileiro de Mercados de Capitais). Entretanto, a apreciação da minha apresentação feita pela Folha não deixou essa impressão.
Ao contrário, começou por dizer que os céticos em relação ao aquecimento global mudaram de opinião devido a um virtual consenso existente. Ora, tenho dito que o aquecimento é real há mais de uma década. Antes disso, havia boas razões para questionar o que ocorria com o clima da Terra. Portanto, qualquer afirmação que me relacione a pessoas que "mudaram" de opinião é velha há pelo menos dez anos. Com efeito, só há três relatórios sobre a temperatura da Terra. Um deles é o dos termômetros de superfície, publicado pela Universidade de East Anglia (Inglaterra) e usado pelo IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática, na sigla em inglês). A reportagem, aliás, afirma corretamente que o painel dividiu o Nobel da Paz com Al Gore, mas convenientemente omitiu o fato de eu ser membro atuante e presente do IPCC.
Aquele relatório mostrou um aquecimento que começou em 1977. Dois outros relatórios, de satélites e balões atmosféricos, não revelaram nenhum aquecimento desde aquele ano. Mas então, no final da década de 1990, ocorreram dois fatos notáveis.
Descobriu-se que havia um desvio na órbita dos satélites e que seus sensores eletrônicos também estavam alterados. Quando esses fatores foram levados em conta, a tendência de aquecimento aumentou. Além disso, alguns balões atmosféricos de nações pobres não foram considerados confiáveis o suficiente, e sua remoção também ampliou a tendência de aquecimento.
Por isso, a Folha equivocou-se. Os cientistas céticos mudaram porque os dados mudaram. Folha também se equivocou ao dizer que iniciei a minha fala atacando o IPCC. Minha apresentação começou mostrando a realidade da mudança climática. Afirmei em seguida que "centenas de cientistas" -e me incluí entre eles- podem estar errados quanto à mudança do clima.
O tema que analisei foram projeções sobre o aumento das emissões de dióxido de carbono (o que mais contribui para o aquecimento) e o metano (o segundo mais importante) quando surgiram as primeiras previsões sobre o aquecimento global, em meados a década de 1970.
Isso ocorreu quase 15 anos antes de o IPCC existir. Todos -eu inclusive- acreditávamos que os gases se acumulariam na atmosfera num ritmo bem maior do que o afinal verificado.
Em relação ao futuro, mostrei que o ajuste dos modelos de computação aos resultados verificados do aquecimento leva a uma previsão para o aumento global de temperatura de 1,7ºC neste século. Isso está dentro dos limites estimados pelo IPCC, cujo extremo inferior é de 1,4ºC.
É um aquecimento modesto, o que é bom. Neste momento, mesmo se tentássemos, não conseguiríamos alterar esse valor. Considere o seguinte: se todas as nações cumprirem o Protocolo de Kyoto -um tratado da ONU-, o aquecimento cairá cerca de 0,07ºC a cada meio século. É uma quantidade muito pequena para ser medida. Entretanto, seu custo é alto -e é por isso que os países não cumprem o protocolo.
Gastar dinheiro em tentativas fúteis de conter o aquecimento é desperdiçar recursos que poderiam ser investidos em tecnologias futuras e avanços tecnológicos que poderiam funcionar de fato. Essa foi a minha mensagem. Supus que seria auspiciosa e encorajadora -certamente, não uma mensagem que pudesse ser considerada "cética".
Por fim, a Folha disse que fiquei muito irritado quando me perguntaram sobre o financiamento da indústria a minha pesquisa. Isso não corresponde aos fatos, com o que a maioria dos ouvintes concordará. Mas é também verdade que fatos são fatos, aquecimento global é aquecimento global e nenhum financiamento da indústria pode alterar isso.
PATRICK J. MICHAELS, 58, Ph.D. em climatologia ecológica pela Universidade de Wisconsin-Madison (EUA), é pesquisador e professor de ciências ambientais da Universidade de Virgínia (EUA) e titular de estudos ambientais do Instituto Cato, em Washington DC.
(Folha de São Paulo, 09/04/2008)