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desmatamento da amazônia gestão de florestas públicas
2008-04-08
Proposta de um “Pacto pela Valorização da Floresta”, envolvendo ONGs, fazendeiros, extrativistas, povos da floresta e grupos indígenas procura induzir os produtores a evitar o desmatamento na Amazônia.

Nos últimos meses, uma proposta para zerar o desmatamento na Amazônia Brasileira até 2014 gerou bastante discussão em fóruns de políticas públicas e entre membros da comunidade científica. O chamado “Pacto pela Valorização da Floresta”, proposto por nove ONGs brasileiras e internacionais (1) , inclui um esquema de pagamento para fazendeiros que adotam melhores práticas e restauram, ou evitam o desmatamento adicional nas suas propriedades. Também compensaria produtores agroextrativistas, povos da floresta e grupos indígenas que ajudem a proteger essas áreas contra a abertura predatória e a ocorrência de queimadas em florestas, processo que se verifica desde os anos 1970 na Amazônia, tendo como conseqüência a perda de 18% da sua cobertura florestal original até 2007, segundo dados de 2008 divulgados pelo INPE.

O Pacto procura buscar uma alternativa à posição de negociação assumida pelo Brasil, que se diz contrária à proposta – que conta com a adesão da maioria dos demais países detentores de florestas tropicais – de que florestas em pé sejam incluídas em esquemas de pagamento ou comercialização de créditos de carbono. Neste sentido, o Pacto representa uma resposta pro-ativa aos emissores de grande porte de gases de efeito estufa (GEE), tais como o Brasil, a China, a Índia e os EUA, os quais rejeitam a imposição de alvos quantitativos para redução de emissões durante o período subseqüente àquele que marcou a primeira rodada de compromissos (2008-12) definidos no Protocolo de Quioto na Conferência das Partes de 1997.

O governo brasileiro passou o ano de 2007 festejando a taxa de redução no desmatamento obtida durante o período de 2004 a 2006, que alcançou 57% quando comparada à área de desmatamento registrada no pico mais recente, em 2002. Mas este declínio pode ter se dado mais em função de os preços de soja e carne terem despencado, por conta da sobrevalorização do Real, do que propriamente pelo controle reforçado sobre as mudanças no uso do solo amazônico, como argumentam as instituições com trabalho na área, como o Imazon.

Uma proposta nacional por parte dos negociadores brasileiros da Convenção do Clima, apresentada inicialmente em Nairobi em 2006 e novamente em 2007 em Bali, propõe medir o progresso incremental dos países tropicais em reduzir o desmatamento, em termos de emissões de CO2 evitadas. Considera como carbono fixado a diferença entre a taxa observada e aquela que teria resultado de um cenário tendencial, e solicita “doações voluntárias” dos países avançados para o carbono “adicional” assim mantido na biosfera. Estas reduções de emissões não poderiam ser creditadas contra os alvos quantitativos estabelecidos para os países avançados para redução de emissões de GEE, e assim não teriam lastro no mercado de carbono.

Tais doações seriam destinadas aos governos centrais, não aos usuários do solo cujas oportunidades econômicas teriam sido constrangidas pela vigilância crescente e pelas medidas de controle impostas como resultado do financiamento. Assim, o elo entre esta abordagem de política ambiental e a mudança no uso do solo em propriedades privadas parece bastante tênue e temporário. A proposta brasileira foi redondamente rejeitada pelas partes do acordo reunidas em Bali. Entretanto, conforme noticiou o Jornal do Brasil em dezembro último, o ministro Celso Amorim declarou em Bali que o governo federal não está, em princípio, contrário ao uso de créditos de carbono para compensar esforços que evitem o desmatamento, mas este procedimento deve ser cuidadosamente monitorado para evitar desvios ou vazamentos.

O Pacto pela Valorização da Floresta (PVF) toca no cerne da questão, construindo o seu arcabouço operacional em restrições fundamentadas no Código Florestal, que limita o desmatamento em terrenos privados a 20% da área total da propriedade em zonas com florestas do bioma amazônico. Embora as restrições da Reserva Legal existam há bastante tempo (tendo sido os percentuais de reserva a serem observados aumentados no governo FHC para 80% da área do imóvel, dos 50% exigidos anteriormente), elas se tornam instrumentos ineficazes em desestimular o desmatamento, pois são raramente fiscalizadas. Há uma série de projetos de lei no Congresso Nacional propostos por membros da bancada ruralista prevendo o retorno ao status quo anterior de 50%.

Por outro lado, programas estaduais visando o fortalecimento dos requisitos do Código Florestal foram implantados nos últimos anos com base no licenciamento ambiental do uso do solo rural, com algum êxito. Licenciamento em combinação com monitoramento de mudanças no uso do solo por satélite permite verificar se a Reserva Legal vem sendo observada. Este tipo de experiência foi iniciado notadamente no estado de Mato Grosso que, mesmo assim, se mantém como campeão de desmatamento na região.

O PVF procura reforçar a efetividade do licenciamento do uso do solo rural, estabelecendo um incentivo financeiro para aqueles que adotam melhores práticas, na forma de um “pagamento para serviços ambientais”. Para reduzir os custos de transação entre poder público e proprietários de terras sob ameaça de desmatamento, o zoneamento ecológico-econômico (ZEE) poderia identificar áreas prioritárias para atuação (por exemplo, locais com fragmentos maiores de florestas remanescentes em áreas contíguas). O ZEE poderia ser complementado com uma análise do custo de oportunidade do desmatamento evitado (para identificar o máximo que deve ser oferecido em compensação ao produtor por desistir de abrir novas áreas de floresta).

Segundo estudos realizados em Mato Grosso para complementar a proposta do PVF por pesquisadores do IE/UFRJ, os custos de oportunidade para manter a floresta em pé, mesmo em áreas propícias para soja, seriam da ordem de R$ 140/hectare/ano. No entanto, há uma gradiente neste custo que responde à qualidade do solo, logística de escoamento e sistemas de produção. Isto faz com que seja mais viável compensar inicialmente aqueles que queiram abrir florestas para pastagens marginais do que alocar recursos para a redução compensada do desmatamento em áreas aptas para soja. Estes resultados são reforçados por pesquisas de modelagem bioeconômica conduzidas pelo IPAM junto com o Centro de Pesquisa Woods Hole, e estudos voltados ao desenho de um esquema de pagamentos para serviços ambientais, pelo ICV em Mato Grosso.

Argumentos contra o desmatamento desenfreado já são consensuais mesmo entre representantes do agronegócio. O próprio governador matogrossense Blairo Maggi, conhecido como o “rei da soja”, um dos maiores traders globais desta commodity, percebe que passou a ser interessante identificar seu ramo de atividade (agrícola e agroindustrial) integrado à “onda verde” após um boicote na Europa forçar a indústria a cortar suas importações de soja provenientes de áreas originalmente sob cobertura florestal na Amazônia. No entanto, da perspectiva deste grupo de interesse, há uma motivação evidente para pressionar tendo em vista um valor compensatório maior, considerando a inabilidade do governo em fiscalizar as limitações de uso do solo existentes. Assim, os números que estão na mesa permanecem negociáveis, mas uma quantia entre US$ 500 milhões e US$ 1 bilhão por ano é estimada como necessária para evitar o desmatamento adicional em terras que oferecem poucas oportunidades para produção lucrativa.

Quem paga a conta? Estimativas preliminares calculadas por estudiosos como Carlos Young e colaboradores em 2007 sugerem que este nível de financiamento poderia ser atendido tendo como base o próprio Orçamento Geral da União. Esta fonte poderia ser “adoçada” com créditos de carbono, oriundos de investimentos voluntários ou mesmo do Mecanismo do Desenvolvimento Limpo, se o quadro regulatório pós-Quioto contemplar efetivamente tais atividades adicionais.

Há considerável debate sobre o conteúdo da proposta do PVF, incluindo um repúdio por parte de um grupo de pesquisadores em institutos públicos do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT) voltados ao acompanhamento de mudanças na Amazônia. Por quanto tempo este tipo de “servidão florestal” teria de ser pago, com quais expectativas em termos de monitoria, melhores práticas, uso intensificado de áreas já desmatadas, e qual o seu real impacto sobre desmatamento constituem questões que mereceriam ser elaboradas e testadas na prática. O monitoramento aqui aludido deve tomar em consideração, inclusive, o problema do “vazamento” para outras partes da Amazônia (se a sociedade pagar para não desmatar em um lugar, o que impede que desmate para o mesmo propósito em outro?), especialmente tendo em vista que grileiros avançam sobre as áreas de floresta densa, sem fiscalização e nominalmente de domínio público. Mas fica patente que há necessidade de um debate amplo na comunidade científica e política para subsidiar as propostas para compensar economicamente os serviços ecossistêmicos de benefício global.

(1) As ONGs envolvidas em elaborar e deslanchar a proposta de articulação com o setor privado e o governo, intitulada “Pacto pela Valorização da Floresta e pelo Fim do Desmatamento na Amazônia” incluem Amigos da Terra-Amazônia Brasileira, Instituto Centro de Vida – ICV, Instituto Socioambiental – ISA, Instituto de Pesquisas Ambientais da Amazônia – IPAM, Instituto de Homem e Natureza para Amazônia – Imazon, The Nature Conservancy – TNC, Greenpeace, World Wildlife Fund – WWF Brasil e Conservation International – CI.

(Por Peter H. May, Agencia Carta Maior, 04/04/2008)
Peter H. May é professor do CPDA/UFRRJ.

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