Boa Vista (RR) - Governador de Roraima, Anchieta Filho, acredita que o presidente Lula não foi devidamente informado por assessores sobre o histórico da Terra Indígena Raposa Serra do Sol
Ao falar sobre a ação da Polícia Federal montada para retirar arrozeiros e não-índios da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, o governador de Roraima, Anchieta Filho, destacou o peso dos arrozeiros para a economia do estado. Em entrevista exclusiva à Agência Brasil, ele afirmou que a forma como o governo homologou a terra indígena foi ruim. Anchieta Filho também criticou a atuação de órgãos federais, como o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e a Fundação Nacional do Índio (Funai).
Agência Brasil: A homologação da Raposa Serra do Sol foi boa ou ruim para o estado de Roraima?
Anchieta Filho: A homologação, nos termos em que foi feita, de área contínua, indiscutivelmente foi ruim para o estado de Roraima. Ela foi proposta no governo do presidente Fernando Henrique, pelo então ministro da Justiça Nelson Jobim, para ser feita em ilhas. Aquela era a situação ideal, mas da forma como foi feita, foi ruim.
Agência Brasil: O senhor acredita que a autorização da Operação Upatakon 3 é uma agressão ao estado?
Anchieta Filho: Juridicamente falando, o Ministério da Justiça está cumprindo uma determinação. Então, o erro foi lá atrás, na hora da demarcação, no decreto presidencial de abril de 2005. Agora, a operação é uma conseqüência desse erro e a Polícia Federal só executa ordens.
Agência Brasil: O senhor acredita num possível recuo do governo federal?
Anchieta Filho: Não. Ficou bem claro para mim que essa operação é irreversível e de fato vai acontecer. Esse foi um sentimento não só meu, mas de todos os parlamentares que estavam no encontro [com o secretário executivo do Ministério da Justiça].
Agência Brasil: O senhor já teve ou ainda pretende ter algum contato direto com o presidente Lula a respeito?
Anchieta Filho: Já estive com o presidente duas vezes: uma vez para tratar de questão referente à nossa companhia energética e outra sobre questão fundiária, transferência de terras. Mas especificamente em relação à Raposa, tenho sempre tratado com os assessores da Presidência.
Agência Brasil: O presidente está mal informado sobre a situação em Roraima?
Anchieta Filho: O termo mal informado não seria, mas talvez mal assessorado pelas pessoas que o rodeiam.
Agência Brasil: Qual o peso do arroz para o estado de Roraima?
Anchieta Filho: Eles representam 6% do PIB [o Produto Interno Bruto] do estado. Um valor significativo, expressivo e, com certeza, sentiremos muito. Vão deixar de gerar cerca de 2 mil empregos, de imediato. Agora eu solicito aos arrozeiros uma parceria com o governo do estado para a realocação em novas terras, e que a gente possa fornecer infra-estrutura de estradas, ponte e energia para que eles possam retomar a atividade.
Agência Brasil: Muitos índios reclamam que os políticos de Roraima ficam do lado de quem tem poderio econômico.
Anchieta Filho: Não concordo. Os políticos de Roraima, legitimados para representar o povo, estão preocupados com o desenvolvimento do estado. Não estamos preocupados com quem tem maior poder aquisitivo. Essa minha empreitada pelo cancelamento da operação visa exclusivamente a evitar esse confronto, pensando nas pessoas menos favorecidas, que são os índios e não-índios que moram naquelas comunidades há mais de 30 anos.
Agência Brasil: Como é possível desenvolver um estado que tem mais de 70% de suas terras como áreas indígenas ou reservas ambientais?
Anchieta Filho: Primeiro temos de tentar reverter, com a transferência de terras da União para o estado, que esperamos resolver nos próximos 90 dias. Aí nós vamos conseguir estabelecer um plano de desenvolvimento.
Agência Brasil: O Incra não assiste o estado como deveria?
Anchieta Filho: O problema do Incra não é em Roraima, é no Brasil, junto com a Funai e o Ibama. São três órgãos que deixam a desejar em sua função. Não cabe a mim julgar a limitação deles de orçamento, custeio efetivo, mas sentimos. Os assentamentos do Incra, em alguns lugares, são favelas rurais. Mas não posso culpar o Incra de Roraima, que precisa de apoio maior para desenvolver políticas de agricultura.
Agência Brasil: Roraima depende em que medida da transferência de recursos federais?
Anchieta Filho: Na mesma medida que dependem os outros estado da federação. Nem mais, nem menos. Estamos sendo atendidos na devida proporção. A necessidade iminente de recursos federais que temos não é diferente de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Bahia.
(Por Marco Antônio Soalheiro, Agência Brasil, 05/04/2008)