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indústria química tratamento de efluentes
2008-04-04

Linha de pesquisa desenvolvida no Departamento de Processos Biotecnológicos da Faculdade de Engenharia Química (FEQ) da Unicamp, sob a orientação do professor Everson Alves Miranda em estreita colaboração com o professor Pedro de Alcântara Pessôa Filho, do Departamento de Engenharia Química da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (DEQ-EPUSP), estuda métodos que utilizam eletrólitos voláteis para a precipitação de proteínas destinadas às indústrias química, alimentícia e farmacêutica. A precipitação dessas proteínas constitui uma das principais etapas do seu processo de purificação. O emprego de eletrólitos voláteis facilita sua posterior remoção tanto do sólido formado como da solução resultante, normalmente descartada, possibilitando o despejo do efluente nos cursos d’água sem agressão ao meio ambiente.

Projeto já deu origem a teses e dissertações

O professor explica que após a síntese da proteína – em animais, bactérias, leveduras, plantas, etc, transgênicas ou não – uma solução aquosa contendo a proteína é preparada por extração e/ou separação de tecidos, células ou fragmentos destes. A partir desta solução aquosa, as proteínas são precipitadas com o objetivo inicial de separá-las dos muitos componentes solúveis que acompanham as águas mães. Na precipitação já ocorre uma certa purificação das proteínas, pois a torta obtida é então submetida a um solvente ‘limpo’, resultando daí uma nova solução de volume em geral dez a vinte vezes menor que o de partida.


Nesta solução, prossegue o docente, a proteína é submetida a processos de purificação, mais ou menos elaborados, que dependem da aplicação a que se destina. No caso de proteínas de uso farmacêutico, esta fase responde em geral por cerca de 70% a 80% do seu custo de produção. A concentração resultante da precipitação das proteínas e sua dissolução em um volume reduzido que antecede a purificação visa baixar o custo, pois permite processar volumes menores em aparelhagens de tamanho mais reduzido, que consomem menos tempo e energia e possibilita o aumento da eficiência das técnicas de separação.

Vencidas as etapas de purificação, a proteína é então muito freqüentemente novamente precipitada preferencialmente na forma cristalina, situação em que resiste mais aos efeitos da desnaturação e em que o sólido é mais facilmente lavado, seco e embalado.

Estes procedimentos sugerem a importância da precipitação tanto no início da purificação quanto na precipitação/cristalização para a obtenção do produto final, porque as substâncias utilizadas no processamento precisam ser eliminadas ou profundamente reduzidas. No caso da precipitação inicial, porque ou comprometem ou encarecem o processo de purificação e no caso da obtenção do sólido final porque, dependendo do uso a que se destina, o produto precisa atingir certo grau de pureza. Além disso, nos dois casos devem ser eliminadas dos efluentes resultantes as substâncias utilizadas nas precipitações.

São exatamente esses problemas que delineiam os objetivos da linha de pesquisa comandada pelo professor Everson Alves Miranda: conhecer, estudar e desenvolver os processos de precipitação de proteínas utilizando eletrólitos voláteis, porque mais facilmente elimináveis, com o manuseio de temperatura e pressão, tanto das tortas resultantes das precipitações quanto das águas mães descartáveis, contribuindo para soluções ecologicamente adequadas.

O processo

O processo clássico de precipitação de proteínas, denominado salting-out, utiliza principalmente altas concentrações dos sais cloreto de sódio ou sulfato de amônio, em temperatura e pH controlados. Ocorre que tanto na torta obtida como no efluente resultante é grande a concentração desses sais, que precisam ser pelo menos parcialmente removidos do sólido para viabilizar sua purificação e das águas mães para que não comprometam o meio ambiente.

A linha de pesquisa orientada pelo professor Miranda estuda a substituição desses sais por eletrólitos voláteis, que podem ser eliminados mais facilmente da torta ou da fase líquida por elevação da temperatura e diminuição da pressão. O docente utiliza eletrólitos voláteis em dois processos distintos, a precipitação salting-out e a precipitação isoelétrica. No primeiro caso, emprega carbamato de amônio, que dissolvido em água origina um sistema em equilíbrio constituído de íons de amônio, bicarbonato, carbonato, carbamato e os gases amônia e dióxido de carbono.

No segundo caso, utiliza gás carbônico para atingir o ponto isoelétrico da proteína, que corresponde ao pH em que sua carga elétrica total é nula, o que diminui sua interação com as moléculas polares da água e a torna menos solúvel e, portanto, mais facilmente precipitável. O processo evita a desnaturação da proteína e pode levar a produtos cristalinos mais bem formados.

O projeto, cuja execução começou em 2002, deu origem a duas dissertações de mestrado e duas teses de doutorado e, embora ainda em andamento, aponta para algumas conclusões e, como toda pesquisa, abre caminho para outros estudos.

O professor Miranda explica que constituem objetivos de mais longo alcance da pesquisa: viabilizar a utilização de eletrólitos voláteis na precipitação de proteínas, mais facilmente removíveis da solução rejeitada, de forma que o efluente não interfira no sistema de tratamento de dejetos; permitir a reciclagem do gás carbônico e da amônia liberados; e eliminar o sal volátil do precipitado, facilitando a purificação da proteína.

Ele considera que as pesquisas já mostraram que é possível precipitar a proteína utilizando eletrólitos voláteis nos dois processos estudados; que se consegue em diversas delas manter a atividade biológica; e que é possível remover eficientemente o sal do precipitado utilizando vácuo e temperaturas relativamente baixas, essenciais para evitar a desnaturação. Por outro lado, a precipitação isoelétrica permitiu desenvolver um modelo que ajuda a entender como a precipitação acontece e abriu caminho para o desenvolvimento de pesquisas que visam determinar seu efeito sobre a qualidade dos cristais obtidos. Miranda observa, entretanto, que falta estudar a remoção do sal da fase líquida e trabalhar a possibilidade de fazer uma reciclagem dos produtos eliminados durante os processos.

Em relação ao salting-out, o professor diz que trabalhos mostraram que 80% da atividade protéica é mantida, embora falte responder o que deve ser feito para preservar a atividade biológica. Afirma ele que “em relação à atividade estudamos a lisozima, a insulina suína, a insulina bovina, a tripsina, a quimotripsina, a lipase, entre outras. A tripsina, a lisozima e a lipase retêm praticamente 100% da atividade biológica. Tivemos alguns indícios de que a insulina sofreu certa desnaturação, o que gerou outro estudo para verificar o efeito dos eletrólitos voláteis em questão em proteínas. Pode-se vir a concluir que para algumas enzimas o processo não seja adequado, o que é normal, porque nem todo método constitui necessariamente solução geral”.

Um dos trabalhos em andamento tem o objetivo de verificar se o emprego do gás carbônico leva a uma diferença na obtenção da insulina cristalizada em relação à obtida pelo processo convencional. “Estamos de posse dos primeiros resultados que se mostram promissores e que, se confirmados, permitirão obter cristais maiores, mais homogêneos, e o processo pode vir a determinar um impacto muito grande no processamento final de proteínas”.

Ao ser apresentado na International Conference on Biopartitioning and Purification, realizado em junho último em Lisboa, Portugal, o trabalho despertou interesse de pesquisadores europeus pelo fato de utilizar eletrólitos voláteis porque, constata o cientista, na Europa existe preocupação e ações práticas maiores pelas questões ambientais.

Histórico

A linha de pesquisa que utiliza eletrólitos voláteis foi iniciada na Faculdade de Engenharia Química (FEQ) da Unicamp em 2001 pelo professor Rahoma Sadeg Mohamed, em colaboração com o professor Gerd Maurer, da Universidade Técnica de Kaiserslautern, Alemanha. Na época, Mohamed submeteu um projeto de cooperação internacional a Capes, do qual era coordenador e que tinha na vice-coordenação o professor Everson Alves Miranda. Paralelamente, o professor Maurer apresentou projeto similar a uma agência de financiamento alemã.

Neste início envolveu-se no projeto o então pós-doutorando Pedro de Alcântara Pessôa Filho, hoje professor do Departamento de Engenharia Química da Escola Politencia de USP, com quem o grupo continua trabalhando em cooperação, além dos pesquisadores Alexandre Keiji Tashima, Leonardo Henrique de França Lima e Érika Ohta Watanabe. Com o falecimento do professor Mohamed, em 2004, o professor Miranda passou a coordenador da linha de pesquisa.

A doutorada Érika realizou parte de sua pesquisa no laboratório do professor Maurer e o doutorando Tashima passou cerca de dois meses no laboratório do professor Luuk van Wielen, da Universidade Técnica de Delft,  Holanda. Mais recentemente ingressaram no grupo as mestrandas Lucimara Lopes Silva e Gisele Atsuko Medeiros Hirata.

(Por Carmo Gallo Netto, Jornal da Unicamp, 03/04/2008)


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