O presidente francês, Nicolas Sarkozy, acusou os governos do Brasil e dos Estados Unidos de praticarem um "dumping fiscal sem precedentes na produção de biocombustíveis". E afirmou também que "a Europa não pode ignorar os dispositivos de apoio implementados por esses dois países para desenvolver certos biocombustíveis".
Sarkozy fez essas declarações na quarta-feira durante uma reunião da principal federação sindical agrícola da França, a FNSEA. Em entrevista à BBC Brasil, o consultor do presidente francês para questões agrícolas, Christophe Malvezin, reforçou as críticas de Sarkozy à política do Brasil para o setor.
"A política fiscal do governo brasileiro, de reduzir os impostos nesse setor, incita os consumidores do país a utilizarem etanol e comprarem carros movidos a álcool. E reduz os encargos das empresas que produzem biocombustíveis e carros, criando distorções no mercado", disse Malvezin.
"Essa redução de impostos equivale a uma ajuda direta aos fabricantes de biocombustíveis. É preciso parar de ser ingênuo. O conceito de apoio direto não deve se limitar somente às ajudas concedidas aos agricultores. Benefícios fiscais também são uma forma de apoiar diretamente um setor", argumentou. Segundo o consultor de Sarkozy, o sistema fiscal favorece as empresas brasileiras do setor, que teriam condições mais vantajosas para exportar seus produtos para a Europa.
Negociações na OMC
A França presidirá a União Européia a partir de julho próximo e Sarkozy deixou claro em seu discurso que endurecerá as posições do bloco nas negociações para a liberalização do comércio mundial na Organização Mundial do Comércio (OMC). "Vou me opor fortemente a qualquer acordo contrário aos interesses da França. Há um desequilíbrio flagrante nas negociações, que deve nos levar a reflexões mais aprofundadas sobre o futuro dessas discussões", disse Sarkozy.
"Quero reciprocidade e quero equilíbrio nessa negociação internacional", afirmou o presidente francês, acrescentando que a "Europa deve parar de ser ingênua". A rodada de Doha da OMC para a liberalização do comércio mundial foi lançada em 2001 e deveria ter sido concluída em 2004, mas as discussões estão bloqueadas por causa da falta de avanços nas negociações agrícolas.
Países em desenvolvimento como o Brasil condicionam eventuais concessões nas áreas de bens industriais e serviços a avanços na negociação agrícola, reivindicando maior acesso aos mercados dos países ricos e também o fim dos subsídios aos agricultores nessas economias desenvolvidas.
Concessões
Sarkozy deixou claro nesse discurso que, durante a presidência francesa da União Européia, o bloco não aceitará propostas que não sejam acompanhadas de concessões por parte dos Estados Unidos e dos países em desenvolvimento. Ele também expressou seu ponto de vista em uma carta enviada na quarta-feira ao presidente da Comissão Européia, José Manuel Durão Barroso.
"As condições de um acordo equilibrado para a União Européia não me parecem reunidas atualmente. A degradação das discussões agrícolas em detrimento dos interesses da União Européia é muito clara", afirmou Sarkozy na carta. "A ausência de esforços da parte de grandes países emergentes não condiz com os benefícios que eles obtiveram nos últimos anos com a abertura do comércio internacional", disse o presidente francês.
(BBC Brasil, Ultimo Segundo, 04/04/2008)