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raposa serra do sol terras indígenas
2008-04-03
O deputado federal Márcio Junqueira (DEM-RR) disse ontem que um documento assinado por toda a bancada federal de Roraima será encaminhado ao ministro da Justiça, Tarso Genro, para solicitar ao governo aguardar que a questão seja decidida no mérito pelo Supremo Tribunal Federal.

"Ainda existem ações pendentes.  O Supremo até hoje só se posicionou liminarmente.  É uma situação complexa que demanda necessidade de discussão no pleno", argumentou.

Para Junqueira, a forças políticas estaduais vão deixar de lado diferenças partidárias para defender o direito dos roraimenses que produzem na terra indígena.  "Os roraimenses estão armados de ideais, sonhos e convicções, enquanto a Polícia Federal está armada de metralhadora, fuzil e granada", comparou.

Operação Upatakon 3 - PF está fazendo levantamento de fazendas

Mesmo com as manifestações realizadas na segunda-feira, por indígenas contrários à homologação e por rizicultores, para impedir a execução da Operação Upatakon 3, a ação da Polícia Federal continua visando a retirada de não-índios da terra indígena Raposa Serra do Sol.

A informação foi confirmada ontem pela manhã pelo coordenador do Comitê Gestor das Ações do Governo Federal em Roraima, Nagib Lima, após se reunir com representantes da Polícia Federal (PF), Fundação Nacional do Índio (Funai), Advocacia-Geral da União (AGU) e o Ministério Público Federal (MPF).  O encontro aconteceu na sede do MPF.

Durante a reunião foi feita uma avaliação do desdobramento da operação realizada pela PF na segunda-feira, em Surumu, "deixando claro que a polícia apenas foi ao local para continuar com os trabalhos de levantamento das fazendas na região, e não para realizar a retirada dos não-índios".

"Foi uma reunião apenas esclarecedora.  O trabalho da Polícia Federal continuará normalmente.  Não existe nenhuma orientação do Governo Federal para que a Operação Upatakon 3 seja suspensa ou cancelada", frisou o coordenador.

Sobre a possibilidade de indígenas e arrozeiros bloquearem as vias de acesso ao Estado, Nagib foi enfático: "O governo não tolerará esse tipo de ação".

A informação de que a Upatakon 3 continua também foi confirmada pela Polícia Federal.  De acordo a instituição, novos policiais vindos de outros estados chegaram ontem a Roraima e "outros mais chegarão nos próximos dias, até que o quadro de policiais necessário para agir na operação esteja completo".  A Polícia Federal afirmou ainda que os trabalhos de planejamento e coordenação da operação e apoio à Superintendência Regional continuam normalmente.

Além dos trabalhos da PF, a advogada do Conselho Indígena de Roraima (CIR), Joênia Wapixana, que participou da reunião, pediu aos demais representantes uma aceleração no processo de retirada dos não-índios da Raposa Serra do Sol, bem como proteção aos indígenas contrários à homologação que permanecem na área.

Manifestantes fazem novo bloqueio e planejam mais ações

A ponte do rio Cotingo, na Vila do Contão, foi bloqueada terça-feira por manifestantes contrários à homologação da terra indígena Raposa Serra do Sol.  A ponte Araujinho, próxima da ponte de Surumu, que havia sido queimada parcialmente na segunda-feira, foi totalmente incendiada na madrugada .  Com estas novas ações, o acesso à Vila Surumu ficou ainda mais prejudicado.

De acordo com os manifestantes, a passagem pela ponte do rio Contigo é proibida apenas para a Polícia Federal e demais órgãos federais.  Ambulâncias, moradores e produtores têm livre acesso.

O presidente da Sociedade dos Índios em Defesa de Roraima (Sodiur), Lauro Joaquim Barbosa, que esteve ontem em Surumu, disse que sua visita era para "unir forças em favor do desenvolvimento da região".  Ele anunciou que hoje trará 300 indígenas da Comunidade do Flechal para o Surumu, "integrando mais militantes na frente da resistência".

Também está confirmado para hoje o isolamento total de Surumu, pela via terrestre e fluvial.  Manifestações na região Sul do Estado e o fechamento de estradas de Roraima permanecem confirmados.

O presidente da Federação das Associações de Moradores do Estado de Roraima (Famer), Faradilson Mesquita, que ontem se uniu aos manifestantes, afirmou que o movimento de resistência tem pessoal preparado para agir contra ação de retirada dos não-índios.  "Aqui nós vamos fechar tudo.  É só a Polícia Federal vir para cá que nós começaremos a luta.  Para isso temos 400 homens, todos preparados", ressaltou.

Em Boa Vista, o presidente da Associação dos Criadores de Gado de Roraima, José Luiz Zago, disse que unirá todos os segmentos nas próximas horas, bloqueando todas as estradas principais e secundárias que dão acesso ao Estado.

"Essa não é uma causa de meia dúzia, é uma causa de todos de Roraima.  Essas ações de agora representarão o desenvolvimento, emprego e futuro de Roraima.  Não queremos prejudicar a população, mas é preciso agir e ampliaremos as atividades hoje", disse Zago.

CIR vai denunciar na PF ações terroristas na região

Indígenas da Comunidade do Barro, na Vila Surumu, que são favoráveis à homologação da terra indígena Raposa Serra do Sol, construíram duas barreiras para impedir o acesso de outros indígenas, não-índios e rizicultores na região.

Às 10 horas de ontem, representantes do Conselho Indígena de Roraima iriam à Polícia Federal denunciar ações terroristas praticadas por pessoas ligadas supostamente aos produtores de arroz.

Conforme informações do CIR, manifestantes ligados aos arrozeiros explodiram a cabeceira da ponte do Surumu com dinamite, serraram a ponte do Igarapé Grande, em Normandia, com motosserra.

A entidade disse que existiriam 75 homens armados no Surumu passeando pela vila e que chegaram dois ônibus lotados de moradores do bairro São Bento para apoiar os arrozeiros.

"Estão fabricando bombas caseiras para esperar a PF e já explodiram quatro delas.  Os índios do CIR fizeram uma barricada para se proteger na casa de apoio dentro da vila e os alunos estão entrincheirados na Missão Surumu", informou o CIR.

Os ligados ao CIR transportaram cerca de 200 índios da região das serras para dar apoio na Vila Surumu.

Governador vai à área de conflito e pedirá ao STF julgamento rápido

Um dia após ter se instalado o clima de tensão na terra indígena Raposa Serra do Sol, o governador Anchieta Júnior (PSDB) foi à região de Surumu, onde índios contrários e a favor da permanência de arrozeiros ameaçam um confronto.

Ele prometeu buscar uma saída pacífica para a crise e disse aos manifestantes que vai pedir ao ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Carlos Ayres Brito, que decida logo os processos sobre a reserva.  Também vai solicitar ao ministro da Justiça, Tarso Genro, que suspenda a Operação Upatakon 3.

Maioria dos deputados federais acha que governo se precipitou

A maioria dos deputados federais de Roraima entende que o Governo Federal se precipitou ao mandar retirar não-índios da reserva Raposa Serra do Sol, quando existem no Supremo Tribunal Federal (STF) ações questionando a demarcação e o direito de propriedade defendido por alguns sobre as terras que ocupam.

Na avaliação do deputado Édio Lopes (PMDB), a questão da reserva indígena foi definida em 1992 - quando o Governo de Roraima foi omisso e até partícipe - os produtores acharam que não ia dar em nada e se acomodaram.  Por outro lado, entende que o Governo Federal não poderia ter chegado até onde chegou.

"Poderia ter evitado isso de forma pacífica permitindo a avaliação justa das propriedades, pago as indenizações e reassentado os produtores em áreas equivalentes.  Mas, além de oferecer uma indenização aviltante, o governo ainda é mau pagador.  Basta ver o que aconteceu a muitos fazendeiros que saíram da reserva São Marcos.  A mim parece que o mérito da questão não seja a saída dos arrozeiros, por entender que esta questão está decidida.  Para mim, basta fazer a indenização justa e prévia, e reassentar os produtores em áreas compatíveis com a atividade que cada um exerce", sugeriu Édio.

Para a deputada Maria Helena (PSB), não seria necessário chegar a esse ponto se o Governo Federal tivesse avaliado melhor a demarcação em área contínua.  Argumenta que em 1,7 milhão de hectares há espaço para acomodar bem todos os índios e não-índios que ali vivem.  Bastava apenas retirar algumas áreas que em nada prejudicariam a demarcação das terras indígenas.

"Lamentavelmente chegamos a esse momento e Roraima não merece isso.  Com apoio de outros parlamentares, vamos encaminhar ao ministro da Justiça, Tarso Genro, um pedido para que a desintrusão seja suspensa até a decisão do Judiciário que, de fato, é a quem cabe dirimir conflitos, ainda mais quando há provocação daquele poder pelas partes envolvidas", comentou a deputada.

Neudo Campos (PP) lamenta que a Constituição de 1988 tenha excluído o governador eleito pelo povo de representar os interesses do Estado em algo tão importante como a questão das terras.  Sendo assim, se agiganta o poder da Funai e esta comete algumas injustiças.

"A questão dos arrozeiros não teria porque acontecer.  É lamentável esse fato.  A retirada deveria ser melhor planejada, sem tanto tumulto.  Como parlamentar, espero que a Funai não volte a pleitear novas áreas que venham a se somar com a exagerada extensão de terras indígenas já homologadas em Roraima", declarou.

Após presenciar o comportamento de policiais na região do Surumu, o deputado Márcio Junqueira (DEM) entende que a ação seja um exagero contra pessoas que apenas esperam a decisão sobre pleitos judiciais por aquilo que acreditam ser seus direitos.

"Vamos continuar coletando assinaturas para o abaixo-assinado pedindo a intervenção do Exército em função do despreparo de algumas pessoas da Polícia Federal - e tenho como comprovar isso - para conduzir essa operação.  Da tribuna da Câmara vou denunciar os fatos que vi e levar a preocupação para a Comissão da Amazônia", comentou Junqueira.

No entendimento de Urzeni Rocha (PSDB), a situação em Roraima chegou ao ponto que nenhum cidadão gostaria.  Ele desaprova a ação da PF, porque não se trata de abordagem a criminosos ou malfeitores, mas a cidadãos que defendem seus direitos.

"A ordem de mobilizar a Polícia Federal para fazer a desocupação demonstra claramente a truculência e o autoritarismo do Governo Federal quando trata da questão da Raposa Serra do Sol.  Ainda há na instância judicial medidas a serem decididas.  Mas o Governo Federal se antecipa mandando retirar na marra trabalhadores, produtores rurais e cidadãos comuns que estão nessa área.  Por entendê-las ilegais, repudio as ações desenvolvidas pela Polícia Federal", destacou Urzeni Rocha.

Para a deputada Ângela Portela (PT), a terra indígena Raposa Serra do Sol está demarcada e homologada pela autoridade competente.  Malograram - conforme ela - todas as iniciativas no âmbito do Judiciário e do Legislativo com o propósito de reverter a demarcação ou alterar o perímetro da reserva.

"Parte significativa da sociedade roraimense já entende que este é um processo irreversível.  É preciso, a partir de agora, construir alternativas econômicas e sociais para incluir as populações indígenas no processo de desenvolvimento do Estado de Roraima.  O que a classe política de Roraima espera é que esta retirada seja feita dentro da legalidade, primando sempre pelo entendimento e pela não-violência", sugeriu a deputada petista.

O deputado Chico Rodrigues (DEM) disse que, após a audiência que teria com Michel Temmer, retornaria a ligação, mas não o fez.  A secretária da liderança do PR também informou que o deputado Luciano Castro entraria em contato, mas até o fechamento desta matéria isso não aconteceu.  (C.P)

Vítima de explosão continua internada

Apesar dos ferimentos, Renato Quartiero não corre qualquer risco O filho do rizicultor Paulo César Quartiero, o jovem Renato Quartiero, 23, continua internando em um hospital particular, mas passa bem depois de ser submetido à cirurgia em um dos dedos da mão esquerda.  Ele foi internado na tarde de segunda-feira, depois de ficar ferido com a explosão de uma bomba, na ponte do Surumu, na terra indígena Raposa Serra do Sol.

Os estilhaços causaram ferimento no rosto, tórax, braços e mãos do jovem, que nega que estivesse com qualquer tipo de artefato nas mãos e alega também que não sabe de onde surgiu.  Segundo ele, muitas pessoas estavam na barreira montada na ponte do Surumu quando os policiais federais chegaram.  "A gente pensou que a polícia ia chegar para conversar, mas os policiais foram logo agredindo todo mundo e prendendo meu pai", disse.

No momento da prisão do rizicultor Paulo César, começou uma confusão e Renato contou que saiu correndo para pegar o carro para seguir as viaturas da Federal, pedindo para as pessoas que estavam fazendo o bloqueio na ponte que tirassem as máquinas, quando ouviu uma explosão.  "Vi um clarão na minha frente e minha vista escureceu.  Quando eu vi, era sangue na minha mão", relata, negando que estivesse com algum objeto explosivo na mão.  Apenas ele ficou ferido.

Diante a situação, ele conta que o primeiro pensamento que passou por sua cabeça foi chegar à fazenda do pai, distante cerca de oito quilômetros do Surumu.  Uma enfermeira da vila prestou os primeiros socorros na fazenda.  De lá, Renato pegou um avião agrícola e veio para Boa Vista.

PF - A Polícia Federal negou na coletiva com a imprensa que tenha arremessado bomba.  Na coletiva, o delegado Fernando Romero, coordenador regional da Upatakon 3, mostrou os armamentos usados pelos policiais na Raposa.  Ele mostrou granadas de gás de pimenta e de lacrimogêneo, bombas de efeito moral, munições de borracha, além de spray de pimenta, todos não-letais.

Quartiero volta à região de Surumu

O rizicultor Paulo César Quartiero voltou ontem à Vila Surumu, lugar onde a tensão é maior, depois de ter sido preso em flagrante pela Polícia Federal por desacato.  Acompanhado do deputado federal Márcio Junqueira (DEM) e do presidente da Sociedade dos Índios em Defesa de Roraima (Sodiur), Lauro Barbosa, ele foi ovacionado pelos seus simpatizantes após desembarcar em um avião monomotor na região.

Com a chegada do rizicultor, foram deflagrados fogos de artifício.  Indígenas e funcionários do arrozeiro se aproximaram, todos queriam lhes dar um abraço ou apertar a sua mão.  Paulo César, Márcio Junqueira e moradores seguiram em direção à ponte do Surumu, onde foi feita uma oração em homenagem ao rizicultor, além de todos presentes cantarem em voz alta o Hino nacional.

Invocando a Deus, Quartiero disse não ao ódio e ao rancor.  Pediu a todos presentes que dessem exemplo de como se trabalha com satisfação e paz.  "Pacaraima tem brasileiro que não se entrega, que dá exemplo de honestidade e patriotismo.  Os olhos da Pátria estão sobre nós.  Somos rizicultores da palavra de Deus", discursou.

CARTA - O deputado federal Márcio Junqueira disse que ainda hoje todos os parlamentares da Câmara Federal e do Senado - com exceção dos senadores Romero Jucá e Augusto Botelho, com quem não conseguiu estabelecer um contato telefônico - irão assinar o documento de judicialização na Assembléia Legislativa do Estado.

A idéia, segundo ele, é trazer para mais próximo o apoio da Assembléia.  Assim que for assinado, o documento será entregue ao governador Anchieta Júnior, para que o mesmo repasse-o ao ministro da Justiça, Tarso Genro, que por sua vez se encarregará de entregar a carta de judicialização ao presidente Lula.  A carta pede que a situação da Raposa Serra do Sol seja resolvida na Justiça.

Márcio Junqueira confirmou ainda que permanece em busca de um apoio do Exército, já que não acredita que a Polícia Federal tenha condições de atuar no processo de retirada dos não-índios.

(Folha de Boa Vista,  FGV, 02/04/2008)

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