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direitos indígenas
2008-04-02
“A CPI proposta por mim e pelo meu colega Sebastião Madeira vai investigar de quem é a culpa e apresentar sugestões para solucionar essa tragédia, dando uma resposta para o Brasil e para a comunidade internacional”, deputado Valdir Neves para o jornal Agora MS. Quem foi à Assembléia Legislativa do Mato Grosso do Sul no dia 28 de março pôde presenciar mais um triste capítulo da novela “faz de conta”, que vai ao ar para desfocar as questões crucias do genocídio Kaiowá Guarani: terra e violência.

Numa realidade de 62 assassinatos no ano de 2007, onde a criação de gado e a plantação de soja e cana reinam absolutos, inclusive nas terras tradicionais desse povo indígena, até parecia que os deputados tinham errado o endereço. O objeto da CPI era investigar as causas das mortes das crianças indígenas Kaiowá Guarani.

Das quatro pessoas anunciadas para prestarem depoimentos, apenas o representante da Fundação Nacional de Saúde (Funasa) foi ouvido. Charles Pessoa, procurador da República em Dourados, não foi ouvido, aparecendo por volta das 11h e 30 minutos quando a sessão estava sendo encerrada. “Fui convocado para depor à tarde. Por isso havia assumido compromisso de uma audiência com o governador do Estado”, esclareceu o procurador.

Era o desfecho pífio de uma CPI, que já nascera “sem sentido”, na opinião do Deputado Biffi, pois o objeto das mesmas “crianças Kaiowá Guarani desnutridas”, já não mais existia. O presidente e o relator da CPI já haviam retornado a Brasília, conforme noticiou a imprensa local (Campo Grande News).

Dr. Zelick, combativo e competente funcionário da saúde indígena, se esmerou em explicar questões já sobejamente conhecidas, de perguntas repetitivas, vindas no bojo de interesses políticos e não os de objeto da CPI. Procurou demonstrar as substanciais melhoras da situação de saúde das crianças indígenas, graças a medidas técnicas eficazes. “Se existem problemas no funcionamento da saúde indígena, deve ser em outros lugares, na Amazônia, no Maranhão...”, pois a aqui no Mato Grosso do Sul, onde a conveniada Missão Caiouá tem uma receita de 11 milhões de reais e mantém mais de 600 funcionários no quadro da saúde indígena, tudo está funcionando bem”.

Porém, foi irônico e taxativo ao afirmar que “cada vez que a gente mistura questões partidárias as conseqüências são trágicas”. Exemplificou dizendo que não se pode nomear para a saúde indígena quem apenas conhece índios por filmes de Bang Bang americanos. E terminou dizendo “Deixem a gente fazer saúde indígena, independente de partido”.

Abobrinhas e bodes expiatórios
A sessão teve lances hilariantes. O deputado Valdir Neves, que apenas apareceu tempos depois do início da sessão, começou a repetir questões que já haviam sido feitas e respondidas. A presidência da mesa o advertiu dizendo que essas questões já haviam sido feitas. Mas ele insistiu que queria ouvir de viva voz a posição do depoente.

E lá foram sendo repetidas ladainhas, que de resto, já são de amplo conhecimento. Na verdade o que se buscava eram podes expiatórios para uma situação cujo obvio ululante era não tocar na questão central, na causa principal, que é a não demarcação e garantia das terras indígenas. Basta lembrar das iniciativas de parlamentares presentes que são obstáculos que dificultam ainda mais o já moroso processo de regularização das terras indígenas.

Sempre é bom lembrar que estamos em tempos eleitorais. Tempo em que palanques são necessários para se alcançar resultados almejados.

E para afirmar seu grande apreço e empenho em resolver a questão crucial dos povos indígenas, foram afirmadas as verbas conseguidas para se construir a primeira Vila Olímpica em Terra Indígena nas Américas. Será construída na Terra Indígena de Dourados. Já diziam os sábios da antiguidade, poderão ficar sem pão, mas não sem circo.

Terra e eternidade
Enquanto isso os Kaiowá Guarani continuam ansiosamente aguardando o reconhecimento, demarcação e garantia de suas terras. Cada dia que passa parece uma eternidade. Violências e mortes são noticiadas diariamente. A situação das aldeias é de total dependência da cesta básica e do trabalho escravo nas usinas.

A pergunta que se poderia fazer é, porque ao invés de se convocar uma CPI que sobejamente muito pouco poderá trazer para minorar o enorme sofrimento desse povo, não se convoca uma CPI para saber o porque não se está demarcando as terras indígenas no Mato Grosso do Sul, que já deveriam estar demarcadas há 30 anos conforme determinação da Lei 6001 – Estatuto do Índio, e há 20 anos, conforme as disposições transitórias da Constituição Federal.

Quantos Kaiowá Guarani terão ainda que partir para a eternidade, sem verem seu sonho maior, sua terra tradicional, demarcada?

Desde o inicio de o final de 2004, quando iniciou um aumento expressivo de mortes de crianças Kaiowá Guarani, por desnutrição, chegando a várias dezenas, já foram realizadas instituídas duas Comissões especiais e duas CPI, em nível federal e estadual. Por que até hoje nada foi feito para enfrentar a causa principal que é a não demarcação das terras indígenas desse povo?

Até o final de março a Funai se comprometeu a colocar Grupos de Trabalho para identificar as terras Kaiowá Guarani. Amanhã expira o prazo. Haverá amanhã, “terra sem males”? Neste ano lembramos os 25 anos do assassinato de Marçal de Souza – Tupã’y, 25 anos de impunidade, uma eternidade, e a comunidade em que ele foi assassinado Nhanderu Marangatu, ainda continua sem poder estar em sua terra.

(Por Egon Heck, Cimi MS, 31/03/2008)

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