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segurança alimentar impactos mudança climática
2008-04-01

O que fazer primeiro: reduzir o problema da fome mundial pela metade ou salvar o planeta dos efeitos da mudança climática? O cientista político e estatístico dinamarquês Bjorn Lomborg, de 43 anos, passou os últimos dez anos de sua vida tentando encontrar a resposta, que não é a esperada pelos defensores do meio ambiente. A conclusão a que chegou está no livro Cool It (da Editora Alfred Knopf), lançado no fim do ano passado. Em tradução livre o título poderia ser Calma lá - O guia do ambientalista cético para o aquecimento global. Segundo Lomborg, que também levantou polêmica com seu livro anterior, O Ambientalista Cético, "é possível atacar nas duas frentes. Basta fazer a conta certa".

A aposta dele não endossa o Protocolo de Kyoto. Para segui-lo, afirma, países de todo o mundo gastariam US$ 180 bilhões por ano, "um investimento inútil e sem retorno algum". Pelos cálculos de Lomborg, com sete vezes menos é possível encontrar soluções para a elevação da temperatura, sem deixar de priorizar outras questões emergenciais. "Num mundo onde mais de 15 milhões de pessoas morrem a cada ano por doenças infecciosas, não faz sentido gastar tanto com o clima", diz o cientista, que foi eleito uma das cem pessoas mais influentes do mundo pela revista Time. Em visita a São Paulo, onde participará de um seminário sobre mudanças climáticas organizado pelo Ibmec e pelo Centro de Liderança Pública, Lomborg deu a seguinte entrevista.

Em seu novo livro, o senhor argumenta que priorizar o aquecimento global investindo muito dinheiro na tentativa de solucionar o problema é errado. Fazer pouco em relação à mudança climática, também. O que é ideal?
Bjorn Lomborg:
Se fizermos muito pouco, tornaremos o problema do aquecimento - uma das maiores ameaças ao planeta - ainda maior. Por outro lado, se priorizarmos o clima, abandonaremos outros assuntos de extrema relevância, como a Aids, a tuberculose, a malária e a desnutrição. É preciso discernir onde concentrar esforços. Lidamos com dilemas como esse na nossa vida diária. Ao lavarmos um prato, diluímos a sujeira que há nele, mas não acabamos com ela. Por mais que se lave, sempre haverá micróbios ali. Mas em algum momento precisamos parar e pensar o quanto vale a pena continuar lavando louça em detrimento de outras obrigações, como limpar o banheiro ou ir para o trabalho. Essa é a discussão que proponho no livro. Com o dinheiro que pretendemos gastar no aquecimento global, podemos salvar milhões de vidas.

Qual o custo do aquecimento?
Lomborg:
Seguir as metas propostas pelo Protocolo de Kyoto custaria US$ 180 bilhões por ano. É muito dinheiro para um negócio que não dá retorno. Com essa quantia, muita coisa pode ser feita no mundo. Mais de 4 milhões de pessoas morrem de fome todos os anos. Com US$ 12 bilhões por ano é possível reduzir pela metade as mortes por fome no mundo. Mais de 1 milhão de pessoas morrem de malária todos os anos - um investimento de US$ 13 bilhões por ano diminuiria a incidência em 50%.

O que pode ser feito hoje para resolver o problema?
Lomborg:
Quase nada. Não vamos mudar o mundo em dez anos, não vamos achar a solução mágica nem convencer a população a deixar de usar carros. A única saída para já é taxar o CO2 em US$ 2 por tonelada, um valor bem menor do que o proposto pelo Protocolo de Kyoto. Uma taxa mais alta seria inviável. Dessa forma, o custo do aquecimento cairia para US$ 25 bilhões anuais - sete vezes menos. Sobraria muito para outras questões globais.

Esse dinheiro ajudaria realmente a combater o aquecimento global?
Lomborg:
Sim, se bem aplicado. A idéia é aplicar esse dinheiro em pesquisas sobre novas formas de energia e sobre o barateamento das energias alternativas já existentes. Apenas 13% da energia usada no mundo hoje são renováveis. Trata-se de uma opção ainda muito restrita e muito cara. Os painéis solares, por exemplo, custam dez vezes mais do que as fontes convencionais. É uma realidade que deve mudar. As energias renováveis já estão 60% mais baratas do que há dez anos, e devem ficar mais acessíveis a cada ano.

Quanto tempo será necessário para reverter o processo do aquecimento global? Isso é possível?
Lomborg:
É possível, sim, amenizar os efeitos do aquecimento. Reduzir drasticamente as emissões de carbono nos próximos dez ou vinte anos, como propõem alguns governos, é passar por cima da realidade. Se isso for feito, os resultados não serão sequer mensuráveis. Temos de pensar a longo prazo. É preciso parar de queimar combustíveis fósseis até o fim deste século. Estudos apontam que, com investimentos corretos, até 2050 as energias alternativas estarão bem mais baratas, o que vai permitir a substituição dos combustíveis fósseis.

Qual a importância da experiência brasileira com o etanol?
Lomborg:
O etanol é uma experiência única. Para o Brasil, atualmente, esse combustível é a ótima alternativa, principalmente pelo preço competitivo. Infelizmente, o etanol é uma solução ruim. Primeiro, porque também emite poluentes. Segundo, porque é algo restrito, que depende da plantação de cana-de-açúcar. O aumento das exportações de etanol para o resto do mundo implica desmatamento ou uso de áreas onde poderia haver o crescimento de florestas. Sou contrário inclusive ao etanol feito de milho. Acho errado transformar comida potencial em combustível. É trocar um problema por outro.

No livro, o senhor diz que o aquecimento global não é uma catástrofe e que as pessoas vivem um estado de pânico.
Lomborg:
É preciso acabar com o pânico. Só assim as pessoas poderão avaliar a situação com mais clareza. Cito no livro o caso dos ursos polares. A mídia alardeia a extinção da espécie, mas o fato é que a população de ursos polares aumentou nas últimas décadas. Eles somavam 500 em todo o planeta na década 1960. Hoje são 2500. Das 20 subpopulações da espécie, duas estão em extinção. Nesses locais, a maior causa de morte dos ursos é a caça, não o degelo.

(JC-RS, 01/04/2008)
 


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