Os moradores do bairro São Joaquim, em Cachoeiro de Itapemirim, onde a empresa CTRVV quer instalar um aterro sanitário, abandonaram a audiência pública realizada na noite desta terça-feira (25). Eles afirmam que suas respostas não foram respondidas e que foram tratados com truculência por representantes da Justiça, que segundo eles, mais pareciam advogar a favor do empreendimento.
“Colocaram duas promotoras de Justiça que agiram com a maior truculência possível. Uma delas chegou a afirmar que a comunidade não queria o lixão na região por falta de discernimento e ao ouvir manifestações dos moradores sobre as perguntas não respondidas, chegou a chamar a polícia e ameaçá-los de prisão. Eram pessoas simples, da roça, que estavam ali, houve manifestações mas não houve excesso, baderna ou tumulto, nada que justificasse isso”, ressaltou um dos participantes da audiência que não se identificou, por receio de retaliação.
As duas promotoras presentes eram Andira Diwali, da Vara de Meio Ambiente de Cachoeiro de Itapemirim, e Isabela Cordeiro, da Vara da Fazenda Pública do município.
O professor Maurício Pereira do Nascimento, que coordena o laboratório de Ecologia Terrestre da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), também reclamou da audiência. Ele que apresentou um estudo afirmando que há características na área suficientes para caracterizar a região como uma Área de Proteção Ambiental (APA), ressaltou que seus questionamentos também não foram respondidos.
O professor contou que perguntou se o aterro já tem autorização da Agência Nacional de Aviação Civil (Anaq) e da Infraero para funcionar, devido à proximidade com o aeroporto, mas que a resposta não foi satisfatória e o levou a concluir que não há esta autorização. Além disso, disse ainda que o Iema não conseguiu deixar claro como seria tratado o chorume provindo do empreendimento.
“O chorume é tóxico, tem que haver algum tratamento, e eles falaram que tudo será levado para Cariacica para tratamento. Isso não é viável e é preciso acompanhar de perto tudo que vem sendo feito para que a área não seja prejudicada”, ressaltou.
Outro ponto questionado era se o empreendimento estudou a área pretendida também nos períodos de cheia. Segundo o professor Maurício, os estudos foram feitos em período de estiagem, mas a região é propícia a alagamentos, o que tornaria o aterro inviável. Ele afirma que nenhum estudo em épocas de cheia foi feito pela CTRVV.
Em meio aos questionamentos, os moradores se sentiram acuados com o forte esquema de segurança, com oito viaturas da polícia e três ônibus lotados de funcionários da CTRVV, que participaram da audiência sem ao menos morarem na região. Foi neste contexto, que um dos moradores da região levantou e se recusou a continuar na audiência. Pouco a pouco, outros moradores foram deixando o loca, restando apenas os funcionários do Iema e da CTRVV. A audiência para discutir o empreendimento foi marcada às vésperas do feriado da Semana Santa.
Para a comunidade, o aterro vem sendo implantado de forma autoritária, ignorando os argumentos da comunidade de São Joaquim. Os moradores afirmam que o empreendimento causará ainda mais danos ambientais e de saúde pública para a qualidade de vida, e prejuízos na geração de emprego. A área pretendida para o aterro, segundo os estudos do professor Maurício, concentra várias vertentes, boqueirões, nascentes e olhos d’água nas encostas de baixa altitude.
Segundo o estudo, não contempla os pré-requisitos para a instalação do empreendimento, não só pelas questões ambientais e sociais, mas também pela proximidade com o aeroporto de Cachoeiro, contrariando a resolução Conama nº4 de 09/10/95, que estabelece a Área de Segurança Aeroportuária.
A Associação de Moradores da região aponta que há outras áreas com potencial de se instalar o aterro sem os custos sociais. A rejeição pelo aterro é de 99% da comunidade. Na região onde a empresa CTRVV pretende instalar o aterro, há 402 áreas industriais e 763 lotes residenciais.
Ao todo, o governo do Estado anunciou a construção até 2010, de quatro grandes sistemas regionais de aterramento sanitário, entretanto, o aterro de Cachoeiro de Itapemirin não foi nem citado nos planos, deixando a comunidade intrigada sobre a real necessidade do lixão na região. Estes quatro grandes sistemas anunciados pelo governo terão capacidade para dar destinação final adequada aos resíduos sólidos urbanos dos 78 municípios capixabas.
(Por Flávia Bernardes, Século Diário, 27/03/2008)