Instalação com garrafas nas margens do rio integra exposição no Itaú Cultural"Quase Líquido" reúne obras de 14 artistas, como Eduardo Srur, Rosângela Rennó, Débora Bolsoni e Cao Guimarães, entre outros
O leito pegajoso do Tietê dificulta a navegação dos barcos. Às margens do rio, filas de carros se formam num mar de luzes imóveis -a velocidade média no horário de pico chega a 22 km/h, menos do que quando São Paulo tinha bondes movidos a tração animal.
O rio que mais emperra do que flui serve de metáfora visual para a mostra "Quase Líquido", que o Itaú Cultural abre hoje. Num acesso panfletário, o artista Eduardo Srur montou nas margens do Tietê uma instalação com 20 garrafas PET infláveis de 11 m de comprimento e 3 m de altura.
Iluminadas com luzes coloridas, vão ser contraponto ao vermelho dos faróis no congestionamento. "O rio Tietê é um símbolo do erro urbanístico de nossa cidade", diz Srur, que há dois anos pôs cem caiaques ao longo de 4 km do rio Pinheiros.
Num lugar bem mais visível, em plena avenida Paulista, Débora Bolsoni instalou grades na fachada do Itaú Cultural, uma denúncia do medo da violência que imobiliza a metrópole.
"A gente cuspiu para cima e isso está caindo na nossa cara agora", diz o curador Cauê Alves, que usou na mostra o conceito de modernidade líquida do polonês Zygmunt Bauman.
Depois da polarização do mundo entre capitalismo e comunismo no pós-guerra, o filósofo previu um mundo moderno de relações fluidas entre pessoas, economias e Estados.
Mas a modernidade brasileira ficou no meio do caminho."Não vivemos uma modernidade líquida se precisamos de uma lei para as pessoas se moverem na cidade", provoca Alves, lembrando o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) da mobilidade urbana. Contra a paralisia, o mexicano Héctor Zamora instalou 36 ventiladores de teto no espaço expositivo. O vendaval que se forma sobre as obras parece soprar a bolha de sabão que flutua num vídeo de Cao Guimarães e Rivane Neuenschwander.
No subsolo, Rosângela Rennó projeta imagens sobre uma cortina de vapor, invertendo a idéia de cinema, já que é o suporte que está em movimento, e não a imagem. "A fumaça rouba contraste e produz um movimento que não existe", diz. São tentativas de fixar aquilo que não pegou até agora na metrópole explorada por esses artistas -a realidade como utopia em construção.
Silas Martí
Barcos farão trajeto até obra no TietêO público poderá visitar de barco as garrafas PET de Eduardo Srur nas margens do Tietê. Além de receber visitas agendadas de escolas, haverá passeios diários para grupos de até 160 pessoas. A duração do trajeto varia de uma a duas horas, dependendo do dia, horário e de condições climáticas.
As visitas, gratuitas, podem ser agendadas pelo tel. 0/ xx/11/2168-1876.
QUASE LÍQUIDO
Quando: abertura hoje, às 19h30; de ter. A sex., das 10h às 21h; sáb. E dom., das 10h às 19h; até 25/5
Onde: Itaú Cultural (av. Paulista, 149; tel. 0/xx/11/2168-1776)
Quanto: entrada franca
(Folha de S.Paulo,
FGV, 26/03/2008)