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gerenciamento do uso do solo regularização fundiária apps
2008-03-27
Nunca se viu na história recente mundial, um êxodo rural tão intenso quanto o que ocorreu no Brasil nos últimos 40 anos. Entre 1960 e 2000 os brasileiros que viviam nas cidades passaram de 40% para 80%, sendo que a população total crescia de 80 milhões para 180 milhões. Isso concentrou nos centros urbanos um contingente que eles não estavam preparados para receber, gerando entre outras coisas, um aumento considerável na degradação do meio ambiente, especialmente no bioma da Mata Atlântica, ainda remanescente nas maiores capitais brasileiras.

Esse foi o tema central do painel “Parcelamento do Solo, como fica a questão ambiental com o PL 3057/00”, o primeiro do Seminário de Gestão Sustentável dos Municípios, que acontece até amanhã (28/03) na Pontifícia Universidade Católica em Porto Alegre.

Rogério Rocco, superintendente do Ibama do Rio de Janeiro, fez um resgate histórico do embate entre as políticas urbanísticas e ambientais. Lembrou que o modelo urbanístico atual tem no mínimo cem anos, quando a economia do país ainda era periferia e baseada no modelo agrícola –exportador e que uma mudança nesse padrão tem uma série de paradigmas a serem observados. O desafio, segundo ele, é incorporar oportunidades de emprego e moradia às pessoas que chegaram do meio rural.

Um dos instrumentos seria o PL 3057, em tramitação desde o ano 2000 e que no ano passado foi aprovado por uma Comissão Especial da Câmara dos Deputados. “O PL traz algumas inovações, mas é necessário desvincular as políticas ambientais do sistema urbanístico, caso contrário haverá um grande retrocesso no processo de reordenamento das cidades”, afirma. Conforme o geólogo, o modelo de ordenamento atual ainda prevalece na disputa com as questões ambientais porque é mais organizado juridicamente. “Não são raras as vezes em que uma secretaria de obras ou planejamento atropela os órgãos ambientais municipais”, diz ao citar como exemplo o Rio de Janeiro que teve eliminado de seu ambiente uma série de áreas de vegetação em virtude da urbanização desordenada e da especulação imobiliária. “O Rio perdeu inúmeras lagoas e áreas de manguezais que foram aterradas. Não é por menos que hoje vive uma epidemia de dengue”, lamenta.

Sem atenção devida
Para a assessora jurídica da Associação Nacional de Órgãos Municipais de Meio Ambiente (ANAMMA), Cynthia Cardoso, o PL é relevante, mas com alguns equívocos. “Analisando o texto, observa-se que muitos são os tópicos que merecem atenção das pessoas ligadas à questão ambiental”. Citou como exemplo possíveis prejuízos com relação às Áreas de Preservação Permanente (APPs). No artigo 5º onde se "admite o parcelamento do solo para fins urbanos nos casos de área alagadiça ou sujeita a inundação, antes de tomadas as providências para assegurar o escoamento ou a contenção das águas", a especialista afirma: “Fica evidente que o parcelamento é proibido em áreas alagadiças, a exemplo das áreas de nascentes, mas permitindo-se o escoamento destas como requisito para deferimento do parcelamento, restará legalizada a supressão destas APP's”, analisa.

Com relação ao artigo 12 do PL: Admite-se a intervenção ou supressão em vegetação de Área de Preservação Permanente (APP) por utilidade pública, interesse social ou baixo impacto ambiental, nos casos previstos pelas normas ambientais e por esta Lei, Cynthia argumenta que “encontra-se a possibilidade dos mais diversos usos e edificações em APP´s, a critério da autoridade licenciadora, legalizando-se assim as intervenções em áreas de APP com a simples anuência do órgão licenciador municipal”.

Outro ponto nevrálgico no projeto é o artigo 86 que diz que o plano de regularização fundiária de interesse social deve definir parâmetros urbanísticos e ambientais específicos. Conforme o artigo, "nos assentamentos informais anteriores à entrada em vigor da Lei, o plano de regularização fundiária de interesse social pode prever a redução das faixas de APP previstas na legislação ambiental, desde que a regularização implique na melhoria das condições ambientais da área em relação à situação de ocupação irregular anterior e que a APP pode ser transposta pelo sistema viário ou utilizada para a implantação e manutenção de sistemas de drenagem de águas pluviais, ou atividades consideradas de utilidade pública, bem como para obras exigidas pelo Poder Público ou por concessionários de serviços públicos, a critério da autoridade licenciadora".

Este artigo, conforme a assessora da ANAMMA, apresenta o mais aterrorizante prejuízo nas regularizações fundiárias de interesse social, uma vez que possibilita a redução das APP's em assentamentos já estabelecidos antes da vigência da lei. “Ou seja, todas as invasões, favelas ou aglomerações urbanas já existentes no Brasil, ao enfrentarem o processo de regularização norteado pelo texto deste PL, será vedado ao órgão licenciador requerer a desocupação das áreas de preservação, a exemplo das margens de um córrego”, afirma. O temor da ANAMMA é que, assim, a APP ao longo dos pequenos rios urbanos, estipulada em 30 (trinta) metros pela Lei 4.771/65 e que vem inspirando inúmeras leis estaduais e municipais por quase meio século poderá ser completamente esquecida.

De acordo com Cynthia, o plano de regularização fundiária (que pode ser elaborado pelos próprios interessados) pode prever a redução desta APP urbana para meio metro, desde que tal regularização implique em melhoria das condições ambientais da área em relação à ocupação irregular anterior. “Este critério legal para a redução das APP's é extremamente subjetivo, restando a pendência de definições doutrinárias e legais acerca do que vem a ser melhoria ambiental”.

Seminário termina amanhã
O Seminário Gestão Sustentável nos Municípios acontece desde terça-feira (25/03) e será encerrado amanhã (28) com a Carta de Porto Alegre. A programação do evento está no site www.seminariogestaosustentavel.com.br . Hoje às 19h, a Secretaria do Meio Ambiente do Município de Porto Alegre (SMAM), promove em sua sede na avenida Carlos Gomes, um coquetel para o relançamento do Almanaque Brasil Socioambiental 2008, confeccionado pelo Instituto Socioambiental.

(Por Carlos Matsubara, Ambiente JÁ, 27/03/2008)

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