Como diz o dicionário, é a abundância de coisas nocivas ou desagradáveis. No caso, trata-se da praga da poluição do ar. Um assunto batido, que não empolga mais mingúem. Vejam o caso de São Paulo, que atingiu a nobre marca de 6 milhões de carros. O Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), com sede em São José dos Campos, acompanha o rastro da poluição provocada pelos veículos paulistas, e sempre incrementada pelas chaminés das indústrias – sem filtros, lógico. Agora, chegaram à conclusão que o rastro pode percorrer 600 km, atingindo o oeste do Estado, na fronteira com o Mato Grosso do Sul. Depende das correntes atmosféricas.
Também não há nenhuma novidade nisso, porque os satélites da Nasa vivem registrando as espessas nuvens de poluição, carregadas de dióxido de carbono, dióxido de enxofre, óxido de nitrogênio, todos elementos ácidos – provocam chuva ácida – saindo da Ásia em direção a outras regiões. Em 2002, com a conseqüência de grandes incêndios na Malásia e na Indonésia, os satélites acompanharam uma nuvem com espessura de 3 quilômetros.
A novidade no caso brasileiro é o ozônio, conforme informações da companhia que acompanha as condições do ar na capital paulista – a Cetesb . Segundo matéria publicada em 02 de março na Folha de São Paulo, a concentração de ozônio – na fórmula O3, significa três átomos de oxigênio que se combinam no contato da luz solar – tem aumentado. Em 24 pontos de monitoramento, durante 67 dias, em pelo menos um deles, o ar foi classificado como inaceitável. Em 2006, foram 46 dias, portanto, um aumento de 45,6%. Carlos Lacava, assessor da diretoria de engenharia da Cetesb, disse que São Paulo é uma das piores cidades do mundo em relação à poluição por ozônio, pior do que a cidade do México, com seus mais de 20 milhões de habitantes.
Cegueira total
O ozônio na estratosfera, acima dos 15 km, é o responsável por rebater os raios ultra - violetas, já identificados como cancerígenos. Mas na baixa atmosfera é tóxico. Ele provoca tosse seca, irritação nos olhos, nariz e garganta e agrava os problemas respiratórios. Ou seja, quem sofre de algum tipo de doença respiratória e mora numa metrópole como São Paulo, ou parecida, como qualquer outra capital brasileira, sofre com o problema. Daí a expressão praga urbana.
Uma praga, provocada por nós mesmos. A maior quantidade de poluição liberada na atmosfera é conseqüência da queima dos combustíveis – gasolina, óleo diesel, principalmente. A qualidade do combustível também é responsável por isso. No problema brasileiro temos mais um ingrediente: o diesel contém uma quantidade muito acima do recomendado, em termos de enxofre. Desde 2002, o conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama), baixou uma resolução – a de número 315 – proibindo o uso do diesel com mais de 50 ppm (partes por milhão) de enxofre. A média brasileira, usada pela Petrobrás é de 500 ppm. Só dez vezes mais. Pior: no interior de São Paulo, pelo menos, a quantidade é de 2000 ppm. O relato foi apresentado pelo presidente do instituto Ethos, Oded Grajew, na Conferência Mundial de Cidades, ocorrida recentemente em Porto Alegre.
A Petrobrás anunciou que pretende mudar a fórmula em 2009. O caso da poluição do enxofre, em conseqüência do uso de combustíveis, já foi resolvida nos Estados Unidos e Europa, há muito tempo. Não totalmente equacionado, mas encaminhado. Aqui o negócio passa batido. Por exemplo, com o crescimento econômico registrado no ano anterior, houve um aumento de 6,31% no consumo de diesel em São Paulo. Parece que o delírio energético e automobilístico dos urbanos não tem limite. Ou melhor tem. Porque a poluição atmosférica mata.. Segundo dados da ONU provoca 3 milhões de mortes por ano no mundo – na Índia são 500 mil, principalmente em função das doenças respiratórias. No Brasil, também têm registros de mortes, segundo relatórios apresentado pela Organização Mundial da Saúde em 2007. Foram 12,9 mil mortes em conseqüência de poluição do ar nas cidades.
Pior na Amazônia
De levarmos em consideração outros problemas ambientais, principalmente água tratada e falta de esgotos, o número chega a 233 mil pessoas no Brasil. Causas das mortes: diarréia, malária, infecções respiratórias. No planeta, ainda segundo a Organização Mundial de Saúde, 24% das doenças estão relacionadas ao ambiente, onde as pessoas vivem. Na pesquisa eles analisaram a poluição do ar, saneamento, ambiente de trabalho, exposição ao barulho, métodos agrícolas, construções urbanas e mudanças ambientais. O mesmo estudo indica que 13 milhões de mortes poderiam ser evitadas, se o ambiente onde a população vive, fosse mais saudável. Um detalhe sobre o cotidiano brasileiro: 13% dos lares continuam usando carvão ou lenha para cozinhar.
Entender esta situação numa grande cidade é mais ou menos óbvio. O problema é saber de índices de ozônio e outros poluentes ainda maiores em plena floresta Amazônia. É o que acontece durante o período oficial das queimadas, entre os meses de agosto e outubro. O físico Paulo Artaxo, do Laboratório Atmosférico da USP, integra um grupo que acompanha o funcionamento da floresta em vários aspectos. Um deles é a respiração. A quantidade de dióxido de carbono consumido e liberado pela evapotranspiração das árvores, várias substâncias orgânicas e inorgânicas que são liberados pelos poros (os estômatos) das árvores. Na época das queimadas, o número de partículas sobe de 300 para 15 mil por metro cúbico. A carga de aerossóis, como os cientistas definem as micropartículas, no caso de São Paulo, nos piores dias de inverno, chega entre 100 a 150 microgramas por metro cúbico. Em regiões como Alta Floresta, no norte do Mato Grosso, e em outros municípios do arco do desmatamento na Pará e Rondônia, esse número alcança entre 400 e 600 microgramas por metro cúbico.
Um último detalhe: já é bastante conhecido, mas duas áreas consideradas lúdicas em São Paulo – o parque do Ibirapuera e o perímetro da USP – estão entre as que registraram os maiores índices de ozônio, no ano passado. A concentração maior do gás sempre atinge o pico na parte da tarde. Portanto, em dias de muita poluição, névoa seca no ar, não façam esforços físicos, se não quiserem engrossar as estatísticas da tragédia brasileira.
(Por Najar Tubino*, Eco Agência, 11/03/2008)
*Najar Tubino é jornalista e autor da palestra