Uma grande manifestação reunindo movimentos sociais, entidades da sociedade civil, lideranças políticas e sindicais, associações de classe e representantes de grupos que defendem os direitos humanos será realizada em Brasília, nesta quarta-feira (12/03), em favor da aprovação da Proposta de Emenda Constitucional 438/2001. A "PEC do Trabalho Escravo", como ficou conhecida, prevê o confisco de terras para quem pratica trabalho escravo e é considerada como uma medida que pode ajudar a por fim a esta grave violação de direitos humanos que envergonha o Brasil 120 anos após a abolição da escravidão.
Desde 1995, quando foi criado o grupo móvel de fiscalização do governo federal, responsável pela apuração de denúncias de trabalho escravo, mais de 28 mil pessoas foram libertadas. Os relatórios de fiscalização mostram que a maioria das operações de resgate ocorre em grandes propriedades rurais, muitas produzindo para os mercados interno e externo. A Constituição afirma que toda propriedade rural deve ter função social, portanto, não pode ser utilizada como instrumento de opressão ou submissão de qualquer pessoa. Por isso, a PEC do Trabalho Escravo, quando aprovada, vai ajudar nesse sentido e atacar a impunidade daqueles que lucram com a exploração do trabalhador.
São esperadas mais de mil pessoas, principalmente trabalhadores rurais e entidades que atuam no combate ao trabalho escravo, que virão em caravanas de estados como Pará, Maranhão, Piauí, Tocantins e Goiás, para um dia de intensa movimentação política em Brasília. O evento deverá culminar com um "abraço" no Congresso e uma audiência com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva para pedir mais empenho do governo federal na aprovação da PEC.
Os participantes da manifestação deverão se reunir a partir das 10 horas no Auditório Nereu Ramos, da Câmara dos Deputados, para dar início ao evento – que inclui discursos em defesa da proposta e contra o trabalho escravo, distribuição de material a deputados e senadores, além de visitas às principais lideranças da Câmara e do Senado para pedir apoio à aprovação da PEC.
O texto foi aprovado em dois turnos pelo Senado e em primeiro turno pela Câmara dos Deputados. No entanto, sua votação em segundo turno está parada desde agosto de 2004.
Além das principais lideranças do combate ao trabalho escravo, o evento irá contar também com participação dos presidentes da Câmara dos Deputados, Arlindo Chinaglia, e do Senado Federal, Garibaldi Alves, do ministro-chefe da Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República, Paulo Vannuchi, com Dom Tomás Balduíno e frei Henri des Roziers, da Comissão Pastoral da Terra, entre outros políticos e personalidades.
A organização do evento é responsabilidade do Movimento Nacional pela Aprovação da PEC 438 e pela Erradicação do Trabalho Escravo, e conta com a participação da Subcomissão de Combate ao Trabalho Escravo no Senado Federal, Subcomissão de Combate ao Trabalho Escravo, Degradante e Trabalho Infantil na Câmara dos Deputados, Secretaria Especial dos Direitos Humanos, OIT, CPT, Fórum Nacional da Reforma Agrária, MST, Contag, Fetraf, Coetrae-MA, Coetrae-TO, CDVDH, CRS, Sinait, Anamatra, ANPT, ANPR, AMB, Ajufe, OAB, Abra, Repórter Brasil, Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social.
Informações para a imprensa com Severino Goes (61-2106-4634), Leonardo Sakamoto (11-9713-9700), Rita Soares (61-8409-2055). Kits com informações sobre a PEC e o Trabalho Escravo no Brasil e no Mundo estão à disposição da imprensa.
Saiba mais sobre a "PEC do Trabalho Escravo"
O que é
A Proposta de Emenda Constitucional (PEC) número 438 foi apresentada em 1999 pelo ex-senador Ademir Andrade (PSB-PA), sob o número 57/1999. Ela propõe nova redação ao Art. 243 da Constituição Federal, que trata do confisco de propriedades em que forem encontradas lavouras de plantas psicotrópicas ilegais, como a maconha. A nova proposta estende a expropriação – sem direito à indenização - também para casos de exploração de mão-de-obra análoga à escravidão. A PEC 438/2001 define ainda que as propriedades confiscadas serão destinadas ao assentamento de famílias como parte do programa de reforma agrária.
A "PEC do Trabalho Escravo" é considerada pelos órgãos governamentais e entidades da sociedade civil que atuam nas áreas trabalhista e de direitos humanos como um dos projetos mais importantes de combate à escravidão, não apenas pelo forte instrumento de repressão que pode criar, mas também pelo seu simbolismo, pois revigora a importância da função social da terra, já prevista na Constituição.
Trâmite
No Senado Federal, a PEC tramitou durante dois anos e foi aprovada em 2001. Na Câmara, permanece parada desde 2004. No mês de agosto daquele ano, a matéria foi aprovada em primeiro turno no Plenário da Casa - com 326 votos favoráveis (18 a mais que o necessário: emendas constitucionais exigem a anuência de 3/5 do total de 513 deputados federais), dez contrários e oito abstenções. Desde então, permanece à espera da votação em segundo turno.
O avanço da proposta em 2004 foi impulsionado pelas pressões geradas após o assassinato de três auditores fiscais e um motorista do Ministério do Trabalho e Emprego, em Unaí (MG), durante uma emboscada em janeiro do mesmo ano.
Devido a mudanças propostas por membros da bancada ruralista (para inserir os imóveis urbanos na expropriação), a PEC 438/2001 terá que retornar ao Senado depois de aprovada na Câmara.
Caso Pagrisa
No final de julho de 2007, o grupo móvel de fiscalização flagrou 1.064 pessoas submetidas à escravidão na fazenda e usina de cana-de-açúcar Pagrisa, localizada em Ulianópolis (PA). A operação mobilizou alguns integrantes do Senado, que passaram a atacar a equipe do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e formaram uma comissão externa para averiguar o caso, sob a justificativa de que os fiscais cometeram abusos. A refrega ganhou maiores dimensões quando o MTE decidiu suspender as ações de fiscalização por falta de segurança institucional.
Com a divulgação pública do relatório da Pagrisa pelo ministro do Trabalho e Emprego, Carlos Lupi, as imagens e relatos da operação foram reproduzidos pela mídia. Organizações da sociedade civil, juristas e parlamentares saíram em defesa da fiscalização e repudiarem o posicionamento do grupo de senadores, que chegaram a ouvir alguns dos envolvidos no caso, mas não deram prosseguimento à tentativa de deslegitimar os fiscais do governo federal. O episódio acabou fortalecendo o trabalho do grupo móvel e reavivou a necessidade de aprovação de leis mais duras contra quem pratica esse tipo de crime.
Em setembro de 2007, parlamentares, representantes de instituições engajadas no combate ao trabalho escravo e o ministro do Trabalho e Emprego, Carlos Lupi discutiram a retomada da mobilização pela aprovação da PEC 438/2001. Em janeiro deste ano, entidades da sociedade civil e parlamentares criaram o Movimento Nacional pela Aprovação da PEC do Trabalho Escravo.
Linha do tempo da PEC do Trabalho Escravo
11/10/1995
Apresentação da PEC 232/1995 na Câmara dos Deputados pelo deputado Paulo Rocha (PT-PA), com o mesmo conteúdo da futura PEC 438/2001.
11/03/1999
Apresentação da PEC 57/1999 pelo senador Ademir Andrade (PSB-PA) no Senado Federal.
31/10/2001
Aprovação em segundo turno pelo Senado da PEC 57/1999: 55 votos a favor e nenhum contra. Proposta remetida à Câmara dos Deputados sob o número PEC 438/2001.
06/11/2001
Como as propostas de Ademir Andrade e Paulo Rocha se equivalem e a PEC 57/1999 já havia sido aprovada no Senado, a proposta de Paulo Rocha (PEC-232/1995) é apensada à PEC 438/2001.
21/11/2003
Parecer favorável do deputado Luiz Eduardo Greenhalgh (PT-SP) na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).
28/01/2004
Crime de Unaí, em que três auditores fiscais e um motorista do Ministério do Trabalho e Emprego foram assassinados durante uma emboscada de fazendeiros locais, faz reascender o esforço para a aprovação da PEC do Trabalho Escravo.
03/03/2004
Câmara dos Deputados instala Comissão Especial para Trabalho Escravo, que vai analisar a PEC 438/01. A ação surgiu de um Ato da Presidência da Casa, de março do mesmo ano, que solicitou que fosse emitido um parecer sobre a PEC em até 40 sessões.
27/04/2004
O relator designado pela Comissão Especial para Trabalho Escravo, deputado Tarcísio Zimmermann (PT-RS), entrega o parecer pela aprovação da PEC 438.
12/05/2004
Comissão Especial aprova por unanimidade PEC 438.
26/05/2004
No Plenário da Câmara, se inicia a discussão para a votação em primeiro turno.
11/08/2004
Aprovação em primeiro turno no Plenário da Câmara: Sim: 326; Não: 10; Abstenções: 8; Total: 345.
01/03/2007
A Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) do Senado cria a Subcomissão Temporária do Trabalho Escravo.
30/06/2007
Libertação de 1.064 pessoas da fazenda e usina Pagrisa, localizada em Ulianópolis (PA), provocou um movimento de senadores que atacou a fiscalização e defendeu a empresa. No entanto, o caso acabou por fortalecer o grupo móvel de fiscalização, responsável por apurar denúncias de trabalho escravo. Como uma das repercussões do caso Pagrisa, governo, parlamentares e entidades sociais intensificaram os esforços para aprovar a PEC 438/01.
(Repórter Brasil, 11/03/2008)