Escrevo-lhes, como mulher e mãe, em nome de tantas mulheres e mães que enfrentam a luta pela cura de seus filhos contra uma das doenças, cuja origem cientifica está nos agrotóxicos, químicos e industrializados: os tumores.
Como mulheres e mães, lutadoras em defesa da vida, vivemos hoje a crueldade do sofrimento ao acompanhar e carregar em nossos braços, nossos filhos, que lutam em hospitais e clínicas de oncologia, para se curar de tumores, leucemias e os mais diversos tipos de câncer, hoje comprovados cientificamente, que uma de suas principais causas está na forma pela qual a ganância humana, em busca do progresso, polui, destrói e mata a vida, as espécies e a energia de nosso planeta. Os rios, a água, o solo estão contaminados. O ar poluído pela desenfreada fumaça das indústrias, pela destruição das matas nativas, em troca de extensas plantações de monocultivos. Os pássaros e animais de todas as espécies estão sendo exterminados. Os salgadinhos, as salsichas, enlatados, transgênicos são colocados na mesa da grande maioria da população, no lugar da produção de comida que vem da própria natureza e é produzida pelas mãos de mulheres e homens do campo. É a produção que alimenta e cura: frutas, verduras, feijão, arroz e toda comida camponesa.
É com esse sentimento que somente pode medir quem vive e se encontra hoje na condição de milhares de mães, mulheres que lutam pela cura e pela vida dos seus filhos, vítimas de tumores, destruidores da vida que lhes escrevemos, evidentemente, indignadas, para somar com a multidão de vozes que protestam contra a sua conduta, que determinou amparo e defesa á empresa capitalista, multinacional, Stora Enso, nefasta para humanidade, para a natureza e para o planeta, que, amparada por um “interdito proibitório” essa empresa STORA ENZO conseguiu com a “justiça” a autorização da polícia para fazer despejo sem mandato judicial, em qualquer de suas áreas ocupadas. Entendemos que, isso nada mais é do que o estado brasileiro, ao invés de investir na agricultura camponesa, nas melhores condições de vida a seu povo, se coloca a serviço de uma empresa Finlandesa, que comete um crime de ter comprado 86 mil hectares de médios e grandes proprietários, na área de fronteira com o Uruguai e Argentina o que é proibido por lei. E mais que isso, sob o seu comando governadora, e do seu governo, foi colocado todo um aparato contra uma multidão de mulheres, mães camponesas, que de mãos calejadas e sonhos grandes, gritam hoje, em forma de protesto, de luta, pela vida que está ameaçada. Desta forma, todo nosso apoio e solidariedade ás mulheres da Via campesina.
Governadora, essas mães, mulheres camponesas sabem que essa forma de luta é o único grito que têm hoje a fazer. Não há outra forma para que mulheres, mães camponesas, sejam ouvidas pelos governos, por aqueles que se dizem “responsáveis” para buscar solução aos maiores problemas de hoje. Sem sombra de dúvidas, estão prestando um serviço à humanidade, e um dia serão reconhecidas, como aquelas que, mesmo sendo espancadas, violentadas, presas, torturadas, condenadas, vendo seus filhos sendo arrancados de seus braços... disseram/alertaram/chamaram atenção no sentido de que os problemas sociais precisam ser atacados pela raiz. E que é preciso mudar a sociedade. Há outros modos de viver, mais digno, mais justo, mais humano e, portanto, mais adequado à vida humana. E somente os seres humanos, mulheres e homens que acreditam nos sonhos de uma pátria livre, poderão fazer as grandes mudanças.
O capitalismo é selvagem. Não serve para a vida humana. Ele tem várias facetas e formas de arrancar nossos filhos de nós. Arranca produzindo os diferentes tipos de doenças, enfermidades que não têm cura, pouco mais pouco menos, vai levando um a um..., arranca pela fome, resultado da concentração de renda, dos latifúndios, da ganância, arranca pela miséria resultado das grandes desigualdades sociais, arranca também pela agressão policial, como aconteceu no seu Estado governadora, quando mulheres e mães tiveram a coragem, de coletivamente colocar o dedo na raiz do problema... gritar por solução, pois a vida para quem trabalha é cruel e dolorosa demais... O que as camponesas fizeram foi denunciar um modelo de sociedade que não serve, e anunciar que não dá mais para permitir, omissas e caladas, a invasão de empresas estrangeiras no meio de nós. Essas mulheres trabalhadoras do campo, mães de família, sabem que somente nós, seres humanos, somos capazes de construir um modo de vida inteligente e sábio, capaz de viver em dignidade. Mas essa construção não se faz a base da mediocridade que se humilha frente a opressão de gênero e a exploração de classe. Recuperamos o sentimento das mães da praça de maio: “Nem um passo para traz”. Insatisfeitas e indignadas nos colocamos a questionar:
Será possível, nos dias atuais, acreditar que uma mulher é capaz de colocar um contingente da Brigada Militar para agredir, violentar centenas de mulheres, camponesas, trabalhadoras e mães, que, com suas vidas, prestam hoje um serviço à humanidade de amanhã, como aconteceu com a invasão de forma violenta no acampamento das mulheres da Via Campesina na Fazenda Tarumã, em Rosário do Sul, por volta das 17h, nesta terça-feira, dia 03.03.2008?
Será possível, nos dias atuais, acreditar que uma mulher governadora de um Estado, usa da máquina e do “poder” para deixar centenas de camponesas, mulheres e mães feridas pela crueldade em defesa de um sistema à mercê do domínio das multinacionais, contra a vida humana e a vida do planeta?
Será possível, nos dias atuais, acreditar que uma mulher, permite ver com seus próprios olhos e sob sua aprovação, 250 crianças serem separadas das suas próprias mães, jogadas no chão, deitadas com suas mãozinhas na cabeça? Junto com suas mães tão cedo, vidas pequeninas, no chão das estradas, dos roçados e das favelas, conhecem o destino de um preço a pagar quem ousa acreditar na vida e lutar por ela. Certamente um dia essas crianças farão a pergunta:
Professora Ieda, economista, porque você fez isso conosco? Porque Professora? Que lição é esta? As Ferramentas de trabalho de nossas mães, que utilizam para garantir o nosso café da manhã, o almoço e o jantar, que nem todos têm, ferramentas utilizadas para produzir comida saudável, foram apreendidas e os barracos que nós estávamos todos destruídos. Por que fizeram isso professora, economista? Já imaginou seus filhos, netos, bisnetos, tataranetos (...) sendo tratados dessa forma como nós fomos tratados?...
Nesse mesmo dia, a Exma. Governadora, de um lado usou de violência sobre as camponesas e, de outro lado, entregou o troféu Ana Terra a 25 mulheres em festividade no Teatro São Pedro. Ali também, o grito de uma corajosa mulher, denunciando o apoio da governadora e de seu governo ao plantio de eucaliptos no estado do RS, o que impede a produção de alimentos para a população, foi entoado em alto e bom som. Os gritos da camponesa chegaram aos ouvidos da governadora, que num gesto com as mãos acenou para esta mulher trabalhadora. Será por ironia do destino, reafirmando sua posição? Enquanto isso a mulher camponesa foi sendo retirada de dentro do teatro, pelos “seguranças” do evento, pois ali não há lugar para a diferença.
Certamente essas crianças um dia dirão: Ainda pequeno, nos braços de minha guerreira mãe, eu já aprendi a lutar pela vida, pela natureza, pelo planeta. Minha mãe sempre me dizia que o deserto verde, coloca em risco a vida da humanidade hoje e condena a humanidade de amanhã. Aprendemos com nossas mães lutadoras aquilo que, quem tem a tarefa de nos ensinar, não o faz: Cuidar do planeta, a casa onde moramos. Como diz a canção do Pe. Zezinho: quando eu crescer eu vou cuidar do meu planeta e libertá-lo da destruição, vocês verão!
Porque fez isso conosco mulher professora, economista
Foi duro e cruel demais ver com nossos olhos de crianças, a Brigada Militar, aqueles soldados que deveriam nos proteger, e exigir que a empresa que roubou o nosso espaço, arrancou o nosso pão, sugou o nosso sangue, nos deixássemos viver em paz, mas não foi isso que nós vimos. Vimos nossas mães, mulheres camponesas que trabalham dia a dia, sol a sol, sendo agredida na entrada daquela fazenda, que é nossa, e nos roubaram. Não nos cansaremos de perguntar: Por que permitiu isso professora, economista?
Vimos com nossos próprios olhos jornalistas que ali estavam prestando o serviço que lhes cabe, serem coagidos de forma violenta. Porque os donos da mídia não permitem mostrar a dura e cruel verdade de quem trabalha e luta para sobreviver. Jornalistas a serviço das grandes empresas e a serviço desse modelo destruidor da vida tem lugar e prestigio. Porque, professora economista, não permitiu sequer mostrar os dois lados dessa moeda? Um cinegrafista foi detido por mais de uma hora e a sua fita com o registro da agressão apreendido. O que o seu governo e os tribunais farão com esse material?
Professora, economista, está colecionando em seu governo, ações violentas para afirmar-se como a primeira mulher que, ao assumir o comando do Estado do RS, fez igual e/ou pior que os maiores ditadores do mundo, que usurparam o direito e alegria de viver de tantos seres humanos? É claro que, dos ditadores, você fez a diferença: Na semana em que se marca o dia Internacional da Mulher, determinou a crueldade e a violência à dezena de mães, camponesas, mulheres que no dia a dia, plantam, regam, colhem, são aquelas que cultivam com suas próprias mãos a semente que poderá garantir as espécies para a perpetuação da vida. Sua escolha foi a defesa da empresa Stora Enso que ajudou financiar sua Campanha. Sabe muito bem a governadora que não foi o desejo e o sentimento das mulheres camponesas, das trabalhadoras, dos trabalhadores que ela chegou ao cargo onde está hoje. Professora, esse cargo não é eterno, mas os resultados de suas ações deixarão suas marcas.
O que nos resta fazer senão condenar esse tipo de ação e denunciar “aos ventos” que a professora, economista, hoje governadora tucana, está colocando o aparato policial do Estado a serviço da multinacional Stora Enso. Só porque é uma de suas maiores financiadoras de sua campanha?
Certamente dirão essas crianças: Nós e nossas mãezinhas, trabalhadoras do campo, estamos denunciando com nossas vidas que essa área foi adquirida ilegalmente pela empresa estrangeira e burlando a Constituição Federal, por se localizar em faixa de fronteira, o que é proibido por lei, professora, economista. Tudo que podemos fazer é clamar por justiça. Essas crianças falam e falarão à humanidade sempre! As mulheres camponesas propõem a soberania alimentar, que prevê a cada país condições de produção dos alimentos, garantindo autonomia e criando condições para combater a fome, a miséria e as desigualdades sociais, possibilitando o desenvolvimento da agricultura.
Pedimos em nome da vida e do direito à liberdade que sejam liberadas todas as mulheres camponesas, indenizadas em seus danos, sejam eles morais ou pessoais e que seja condenada a Empresa Stora Enso, multinacional ilegal. Pedimos justiça às mulheres camponesas, às crianças camponesas e punição à Empresa STORA ENSO.
Fortalecer a luta em defesa da vida, todos os dias!
(Por Sirlei A. K. Gaspareto,
Cimi, 07/03/2008)