Apesar de críticas de ONGs e órgãos públicos, reconstrução da rodovia não pára O longo impasse que já dura mais de 30 anos sobre a pavimentação da BR-319, que liga Manaus a Porto Velho, parece estar ainda distante do seu fim. O ingrediente mais quente dessa novela se deu por conta de uma alternativa à rodovia apresentada por órgãos do governo e organizações da sociedade civil. A proposta visa substituir a BR por uma Ferrovia.
Em evento recente organizado pelo jornal O Estado de S. Paulo, o ex-secretário de meio ambiente e desenvolvimento sustentável do Amazonas e agora gestor-executivo da recém criada Fundação Amazonas Sustentável, Virgílio Viana, defendeu a criação da ferrovia. Segundo ele, "temos o mal hábito no Brasil de investir somente em rodovias e isso é um equivoco, uma estupidez. Investimos muito pouco em navegação de cabotagem, seja navegação litorânea ou a navegação no interior da Amazônia, e menos ainda em ferrovias. Pensando nisso fizemos um estudo com o BNDES [Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social] sobre a viabilidade econômica de uma ferrovia substituindo a BR-319."
As obrasApesar de toda essa discussão e das alternativas apresentadas, de acordo com apurações do site Amazônia, as obras vêm sendo tocadas mesmo com o aparente interesse do governo do Amazonas em avaliar melhor sua viabilidade.
O DNIT (Departamento Nacional de Infra-estrutura e Transportes) alegava, ao início da obra, que se tratava apenas de uma reforma da pista, o que eliminaria a necessidade de um Estudo de Impacto Ambiental da mesma. O IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente) não aceitou tal justificativa, já que o novo projeto prevê que muitos trechos serão retraçados, e exigiu toda documentação necessária para liberar a obra. Além disso, organizações como a Fundação Moore continuam investindo na identificação do modal mais adequado e os impactos ambientais para a região, além de debates realizados pela ONG Preserve a Amazônia e da Secretaria de Meio Ambiente do Amazonas.
De acordo com o chefe do serviço de engenharia do DNIT de Manaus, Edson Moreira Cavalcante, as obras do primeiro trecho da BR-319 estão paradas por causa da chuva. Cavalcante informou ainda que o trecho localizado entre o km 250 da rodovia (o km zero fica em Manaus) e o km 655 depende de licença do IBAMA para ter suas obras iniciadas. "Pesquisadores da UFAM (Universidade Federal do Amazonas) estão realizando o Estudo de Impacto Ambiental (EIA-RIMA) para atestar a viabilidade da obra", diz. Segundo ele, o empecilho se dá pela complexidade da obra, que precisa refazer todo o acostamento da autopista, e para isso, desmatar grande quantidade de mata em regeneração (a original foi arrancada quando a estrada foi construída, nos anos 1970).
As declarações de Edson Moreira Cavalcante, inclusive, contrastam com o que alegava o órgão ao qual ele é vinculado. O engenheiro afirmou que a obra "não é de manutenção, estamos refazendo a estrada toda". De acordo com Cavalcante, a licença do IBAMA para a continuidade das obras deve sair em meados do mês de maio.
Erro históricoDe acordo com o diretor adjunto da ONG Amigos da Terra, Mário Menezes, trata-se de um grande erro investir na reconstrução da estrada amazonense. "Quando ela foi feita pela primeira vez, a localização da fronteira urbano/agrícola ainda não chegava ao coração da Amazônia. Passados 30 anos, os estados de Mato Grosso e Rondônia não estão mais isolados. Se a reabrirem agora, será uma avalanche de pessoas, carros etc. sobre Manaus", alerta. Ao reativar a estrada, o governo federal está criando um atrativo para as já predatórias atividades madeireiras e agropecuárias.
Além disso, pesa contra a rodovia o contingente populacional que costuma se instalar de maneira desordenada na beira das estradas. Por dificuldades de locomoção das próprias pessoas e de mercadorias, essas ocupações geram a construção de novas pistas de acesso, atraindo mais gente para essas localidades agora trafegáveis, num ciclo vicioso de destruição.
Marcos Mariani, da organização Preserve a Amazônia, declarou no mesmo evento organizado pelo Estadão que "80% do desmatamento que ocorre na Amazônia está há uma distância de até 50 km das rodovias". Para ele "são esses eixos de 'desenvolvimento' que acabam causando um problema seriíssimo, até pela própria valorização da terra".
(
Amazonia.org, 05/03/2008)