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direitos indígenas
2008-03-05
No dia 17 de outubro de 2007 o ministro da Saúde, José Gomes Temporão, revogou a Portaria 1163/99 e editou, em seu lugar, a Portaria 2656, pretendendo estabelecer "as responsabilidades na prestação da atenção à saúde dos povos indígenas, no Ministério da Saúde e regulamentação dos Incentivos de Atenção Básica e Especializada dos Povos Indígenas".

Esta portaria vem recebendo, nos últimos meses, uma série de críticas (de modo especial de organizações indígenas) em função do pouco debate que houve em torno de seus objetivos e fundamentalmente porque os Povos Indígenas desconfiam de sua eficácia na solução dos problemas na atenção à saúde das comunidades.  Outra preocupação dos indígenas é porque a portaria carrega, em seu conteúdo, uma forte tendência da municipalização dos serviços na política de saúde indígena.

Mas antes de avaliar as conseqüências da Portaria 2656/2007, é importante analisar em que contexto ela foi apresentada para discussão e por que o interesse da Funasa (neste momento) em redefinir as normas para os repasses de recursos financeiros (de fundo a fundo e denominado de Incentivo de Atenção Básica aos Povos Indígenas - IAB-PI e Incentivo para a Atenção Especializada aos Povos Indígenas - IAE-PI) aos municípios prestadores de serviço no âmbito da saúde indígena.

A Funasa e a SAS (Secretaria de Atenção à Saúde do Ministério da Saúde) em articulação com o Conasens (Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde) se dirigiram a CISI (Comissão Intersetorial de Saúde Indígena) para apresentar uma minuta de mudança da Portaria 1163/99 com a alegação de que eles precisavam normatizar o controle no repasse e utilização dos recursos destinados para os municípios prestadores de serviços.

É importante registrar também que as referidas propostas foram apresentadas num período em que estavam sendo veiculadas inúmeras denúncias de uso indevido dos recursos da saúde pelos municípios e também de funcionários da Funasa, principalmente na Amazônia.  Outro aspecto a salientar é o fato de que as pretendidas mudanças ocorreram no segundo semestre de um ano que antecede o início das disputas eleitorais nos municípios.

A minuta de portaria apresentada pela SAS e pela Funasa trazia uma série de imprecisões, e carecia de fundamentação que a vinculasse à Lei Arouca (Lei 9.836/99). A minuta desconsiderava completamente a lei que deve regulamentar a política de saúde.  Na avaliação dos representantes da CISI a proposta evidenciava a perspectiva da municipalização da atenção e serviços da saúde indígena.

Na primeira versão da minuta havia uma grande confusão entre atribuições da Funasa, dos Estados e dos Municípios e, além disso, muitos equívocos no tocante às concepções de política de assistência diferenciada a que os Povos Indígenas têm direito, e, portanto, não correspondia com as determinações da Lei Arouca.  A SAS e o Conasens insistiam que a política para os indígenas é o SUS e que não deve existir qualquer outra perspectiva de assistência fora deste modelo.

Foi travado, a partir dessa explicitação, um árduo debate com a Funasa, Conasens, SAS e secretários municipais de saúde, de modo todo especial da região amazônica.  No debate, as lideranças indígenas buscavam resgatar as diretrizes para a política de saúde que foram consolidadas ao longo de anos de disputas, debates e formulações de propostas que acabaram aprovadas nas Conferências Nacionais de Saúde Indígena, especialmente a de 1993.  Para o Conasens e os secretários municipais de saúde era inconcebível que os Povos Indígenas reivindicassem uma política de saúde para além daquela que se estabelece no âmbito do SUS.  Muitos desses secretários desconheciam o conteúdo da Lei Arouca, sequer sabiam de sua existência.  Os membros da CISI fizeram um resgate de toda a luta do movimento indígena e indigenista pela aprovação desta lei e o que ela estabelece enquanto princípios (estruturação de um subsistema de atenção diferenciada, vinculado ao SUS, tendo por base os Distritos Sanitários Especiais Indígenas e que os Estados, Municípios e ONGs podem atuar de maneira complementar) e que qualquer norma administrativa do poder Executivo, acerca da saúde indígena, deve estar alicerçada nesta lei.

Depois dos debates, os integrantes da CISI propuseram que a minuta fosse amplamente discutida nas comunidades indígenas, nos Distritos Sanitários Especiais, no Fórum dos Presidentes dos Conselhos Distritais e, principalmente, na CNPI (Comissão Nacional de Política Indigenista).  A Funasa não fez os encaminhamentos conforme sugerido e apenas submeteu a minuta para discussão durante um dia de reunião do Fórum dos Presidentes dos Conselhos Distritais e não houve debate no âmbito da CNPI.

O que se podia perceber, neste período, era uma grande ansiedade dos representantes da Funasa e da SAS para que a minuta fosse aprovada por índios, independente do tipo de fórum em que participassem.  Eles queriam um aval, ou da CISI, ou do Fórum dos Presidentes dos Conselhos Distritais, ou de qualquer outro espaço com povos indígenas.  Mas, ao mesmo tempo, a SAS e a Funasa demonstravam insatisfação com as críticas e propostas que eram feitas pelos representantes indígenas e por entidades de apoio.  Ao longo das discussões muitas sugestões foram apresentadas com o intuito de melhorar a proposta de portaria.  Dentre as sugestões acatadas destacam-se quatro que, de fato, contribuíram para mudar a lógica pretendida pelo governo que era a da municipalização: que a Lei Arouca fosse considerada e suas normatizações respeitadas no conteúdo da nova portaria; que os Estados e Municípios aparecessem como prestadores de serviço na complementaridade das ações e não como executores da política nacional de saúde indígena, como pretendia o Conasens; que todas as discussões acerca dos serviços a serem prestados pelos municípios, estados e Ongs fossem discutidas no âmbito dos Distritos; que as ações dos municípios fossem submetidas à programação do plano dos Distritos.

Depois da reunião com o Fórum dos Presidentes dos Conselhos Distritais (embora naquela ocasião os representantes indígenas insistissem para que a reflexão ocorresse em todos os Distritos e que se houvesse mais tempo para os debates) a Funasa se sentiu avalizada a submeter a minuta de Portaria ao Ministro da Saúde, que a publicou no dia 17 de outubro de 2007.  Desde então se percebe muita inquietação da parte de lideranças, comunidades e organizações indígenas sobre as conseqüências desta nova medida nos serviços de assistência, uma vez que aparentemente os municípios passaram a ter mais espaço de atuação no âmbito da atual política.

As conseqüências da nova Portaria podem ser avaliadas a partir de três perguntas:

1- Que mudanças a Portaria 2656/2007 trouxe em relação a anterior (1163/99) para a gestão, execução, planejamento, participação indígena no controle social, e para as ações e serviços executados por prefeituras e ONGs?

2- Os mecanismos para o controle dos recursos que serão entregues aos municípios resolverão os problemas relativos à falta de atenção básica às comunidades, ao combate às endemias, a imunização, ao atendimento em centros de saúde especializados (de alta complexidade) e da qualificação dos agentes que atuarão nas comunidades indígenas?

3- Quais as perspectivas, a partir da nova portaria, de criação do Subsistema de Atenção a Saúde dos Povos Indígenas estabelecido pela Lei Arouca?

Na prática (pergunta 1) não ocorreu mudança substancial em relação às normas anteriores.  Basta ler o que determina a Portaria 2656/2007 em seu artigo primeiro:

Determinar que o planejamento, a coordenação e a execução das ações de atenção à saúde às comunidades indígenas dar-se-á por intermédio da Fundação Nacional de Saúde - FUNASA, com a efetiva participação do controle social indígena em estreita articulação com a Secretaria de Atenção à Saúde (SAS) do Ministério da Saúde, e complementarmente pelas Secretarias Estaduais (SES) e Municipais de Saúde (SMS), em conformidade com as políticas e diretrizes definidas para atenção à saúde dos povos indígenas".  É importante, para entender as atribuições da Funasa, a leitura do Artigo 10, incisos I a XX da portaria 2656/2007.

As pessoas que tiveram acesso às várias minutas de portaria sabem que no seu artigo inicial se pretendia uma explicitação que assegurasse a municipalização da saúde indígena.  No entanto, foi introduzida no artigo primeiro (por sugestão da CISI) uma palavra chave e que está explicitada na Lei Arouca, qual seja, que os demais (Estados, Municípios e ONGs) podem atuar "complementarmente" NAS AÇÕES E SERVIÇOS PARA AS COMUNIDADES INDÍGENAS.  O mesmo artigo primeiro estabelece que a Funasa será a responsável para planejar, coordenar e executar as ações enquanto que aos Povos Indígenas, caberá a "efetiva participação do controle social".  Nada muito diferente do que estava na portaria 1163/99.

Não há, todavia, a caracterização explícita da municipalização, mas, sem dúvida, ao ler o conjunto das medidas se pode constatar que existe a intenção de fortalecer a participação dos municípios nas ações e serviços, ou seja, a Funasa tem a evidente pretensão de que os municípios sejam bem mais do que prestadores de serviços complementares.  Vejamos o que diz o Artigo 12, em seus incisos de I a IX:

Art.  12.  Definir as atribuições dos Municípios e do Distrito Federal:

I - atuar de forma complementar na execução das ações de atenção à saúde indígena, conforme definido no Plano Distrital de Saúde Indígena, nos objetos dos Termos de Pactuação da Atenção à Saúde aos Povos Indígenas e descritas no respectivo Plano Municipal de Saúde;

II - alimentar os sistemas nacionais de informação do SUS, conforme normas em vigor, com os dados relativos à Atenção à Saúde Indígena, mantendo atualizado o cadastro nacional de estabelecimentos de saúde;

III - assegurar a participação de representantes indígenas e dos profissionais das equipes multidisciplinares de saúde indígena no Conselho Municipal de Saúde, em especial nos municípios que firmarem os Termos de Pactuação para a Atenção à Saúde dos Povos Indígenas;

IV - participar do Conselho Distrital de Saúde Indígena;

V - avaliar e acompanhar em conjunto com os DSEI e Estados as ações e serviços de saúde realizados previstos nesta Portaria.

VI - participar da elaboração do Plano Distrital de Saúde Indígena;

VII - garantir a inserção das metas e ações de atenção básica, voltadas às comunidades indígenas no Plano Municipal de Saúde;

VIII - enviar à para CIB os Termos de Pactuação da Atenção à Saúde aos Povos Indígenas para avaliação e homologação; e

IX - definir, em conjunto com a FUNASA, o perfil dos profissionais que comporão as equipes multidisciplinares de saúde indígena, de acordo com os Termos de Pactuação da Atenção à Saúde aos Povos Indígenas.

Na leitura destes 10 incisos se constata que os Municípios poderão intervir de forma direta nos Distritos porque a Portaria determina que eles façam, por exemplo: a pactuação dos serviços; que eles tenham no plano municipal de saúde a descrição das ações a serem prestadas junto aos índios, portanto um planejamento; eles participarão dos Conselhos Distritais; eles irão avaliar e acompanhar as ações e serviços de saúde; vão participar da elaboração dos Planos Distritais; e definirão o perfil dos profissionais, junto com a Funasa, que atuarão nas comunidades indígenas.

Nos artigos 2, 3 e 4 ficam estabelecidas as normas de como a Funasa pretende efetuar os repasses e controlar os recursos que serão destinados aos municípios.  Nestes artigos (com os respectivos incisos e parágrafos) estão explicitadas as grandes mudanças que a Funasa pretende e com as quais ele justificou a edição da nova portaria.  Aqui merece ser feito um comentário de que os repasses de recursos para os municípios ocorriam normalmente e que os mecanismos de controle existem nas normas constitucionais e nas leis que regulam a administração pública.  Portanto, o controle, a fiscalização e a sanção estão previstos nas inúmeras leis em vigor em nosso país.  Mas a SAS e a Funasa, alegavam que o dinheiro não estava sendo usado na forma devida e decidiram explicitar como se fará, de agora em diante, o repasse dos "incentivos de atenção básica e especializada aos Povos Indígenas" (assistência ambulatorial, hospitalar, de diagnóstico).

Art.  2º Regulamentar o Fator de Incentivo de Atenção Básica aos povos indígenas e o Fator de Incentivo para a Assistência Ambulatorial, Hospitalar e de Apoio Diagnóstico à População Indígena, criados pela Portaria nº 1.163/GM, de 14 de setembro de 1999, que doravante passam a ser denominados Incentivo de Atenção Básica aos Povos Indígenas - IAB-PI e Incentivo para a Atenção Especializada aos Povos Indígenas - IAE-PI.

Os parágrafos 1 e 2 estabelecem como os recursos serão transferidos, ou seja, eles sairão do Fundo Nacional de Saúde para os Fundos Municipais e Estaduais de Saúde:

§ 1º Os recursos de que tratam o caput deste artigo serão transferidos ao respectivo gestor na modalidade fundo a fundo mediante pactuação.

§ 2º Os recursos do IAB-PI e do IAE-PI comporão blocos de financiamento da Atenção Básica e da Média e Alta Complexidade, respectivamente, instituídos pela Portaria nº 204/GM, de 31 de janeiro de 2007.

No artigo 3 fica definido que a aplicação dos recursos deve estar em conformidade com o Plano Distrital de Saúde Indígena, bem como com os planos municipais e estaduais:

Art.  3º Definir que a aplicação dos recursos do Incentivo da Atenção Básica aos Povos Indígenas e do Incentivo para a Atenção Especializada aos Povos Indígenas devam estar em conformidade com o Plano Distrital de Saúde Indígena - PDSI e com os Planos de Saúde dos Estados e Municípios.

Parágrafo único.  Os Planos Municipais e Estaduais de Saúde devem inserir as ações voltadas à Saúde Indígena, de forma compatível ao Plano Distrital de Saúde Indígena.

Na seqüência, a portaria trata de especificar como os valores serão repassados, as suas as finalidades e estabelece uma espécie de renda per capita, ou seja, determina o quanto poderá ser gasto por pessoa indígena e esses valores variam de acordo com a realidade geográfica e populacional.  Ficou estabelecido que o valor não será superior a R$ 1.000,00 habitante ano, exceto para Amazônia nas localidades onde a população indígena for superior a 50 mil habitantes.  Nas comunidades com mais de 100 pessoas o valor total fixado na portaria é de R$ 8.100,00 (oito mil e cem reais) mensais e com menos de 100 habitantes o valor é de R$ 4.050,00 (quatro mil e cinqüenta reais) mensais.  Nos estados do Nordeste e Mato Grosso do Sul, Goiás e Minas Gerais a renda será de R$ 150,00 mensais e nos estados do Sul e Sudeste será de R$ 100,00 mensais.  Na Amazônia os valores per capita são de R$ 300,00 mensais ( Art.  4º, § 1º a § 8º ).

Os artigos de 5 a 9 estabelecem à composição das equipes multidisciplinares de atenção a saúde, estabelecem o Incentivo para a Atenção especializada, define como se dará a assistência ambulatorial, hospitalar, apoio diagnóstico e terapêutico (qualitativa e equânime).  Estabelece também como os incentivos serão repassados aos Municípios e Estados mediante plano de pactuação no qual constarão as responsabilidades e atribuições da atenção a saúde dos povos indígenas.  Esta pactuação será entre a Funasa, SAS, Municípios, Estados, Conselhos Distritais.  A definição dos Termos de Pactuação da Atenção Básica e Especializada deve seguir o que estabelece os seguintes artigos:

Art.  8º Definir que o Termo de Pactuação da Atenção Básica aos Povos Indígenas deverá conter: a composição da equipe com a quantidade e a formação dos profissionais; carga horária; plano de trabalho; indicadores e metas a serem alcançados, de acordo com o Plano Distrital e indicadores da Atenção Básica do Pacto pela Saúde.

Art.  9º Definir que o Termo de Pactuação da Atenção Especializada aos Povos Indígenas deverá contemplar: a relação da oferta dos serviços; a população indígena potencialmente beneficiária; metas quali-quantitativas e os seus respectivos valores; definição do fluxo de referência e contra-referência e estratégias de acolhimento.

A Portaria define as atribuições dos entes públicos diretamente envolvidos com a prestação de serviços para as comunidades indígenas.  E ficam estabelecidas que haja a obrigatoriedade de repasse das informações sobre as populações indígenas acompanhadas e assistidas conforme o artigo abaixo:

Art.  16.  Determinar que o monitoramento do Incentivo de Atenção Básica aos Povos Indígenas e o Incentivo da Atenção Especializada aos Povos Indígenas se dará por meio da verificação da utilização dos sistemas nacionais de informação a serem preenchidos e remetidos ao Ministério da Saúde pelos Municípios e Estados contemplados conforme normas em vigor, a saber:

a) Informações no Cadastro Nacional dos Estabelecimentos de Saúde e Profissionais Habilitados;

b) Sistema de Informação Ambulatorial - SIA;

c) Sistema de Informações sobre Mortalidade - SIM;

d) Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos - SINASC;

e) Sistema de Informações de Agravos de Notificação - SINAN;

f) Sistema de Informações do Programa Nacional de Imunizações - SIS-PNI;

g) Informação de Produção dos Estabelecimentos de Saúde previstos nos termos de pactuação; e

h) Sistema de Informações Hospitalares - SIH, quando for o caso.

§ 1º Os Municípios, os Estados e o Distrito Federal que não alimentarem regularmente os Sistemas de Informação em Saúde com o atendimento hospitalar e ambulatorial aos Povos Indígenas por 2 (dois) meses consecutivos ou 3 (três) meses alternados terão o repasse dos incentivos suspenso.

§ 2º O repasse dos incentivos IAE-PI e IAB-PI será suspenso, caso sejam detectadas, por meio de auditoria federal ou estadual, malversação ou desvio de finalidade na utilização dos recursos.

Quanto à segunda pergunta, podemos afirmar que critérios mais rigorosos para o controle dos recursos que serão repassados aos Estados e Municípios, não asseguram que haverá melhoria no atendimento às comunidades indígenas porque os municípios não estão preparados e muitos deles não têm interesse em qualificar-se para uma atenção específica e diferenciada que deve ser prestada aos Povos Indígenas.  Além disso, na maioria dos municípios estão articuladas as grandes forças políticas e econômicas que fazem oposição aos direitos indígenas e não os respeitam na sua diversidade étnica e cultural, portanto, não aceitam que as comunidades sejam assistidas de forma diferenciada.

Outro aspecto que não assegura melhoria nas condições de assistência é o fato de que em outras portarias e normas administrativas também foram estabelecidos mecanismos de controle e a prestação de serviço sempre foi precária.  E, no que se refere ao uso dos recursos, as denúncias sistemáticas demonstram que não há, no âmbito da administração pública, responsabilidade com o que é público, bem como não existe punição a quem pratica corrupção e outros desvios das finalidades no exercício das atividades nos entes municipais, estaduais e federal.

Portanto, não é (era) pela ausência de legislação e/ou de normas administrativas que a assistência à saúde indígena não vem sendo executada com o objetivo de contemplar as necessidades, exigências e direitos dos povos indígenas.  O que determina a má prestação de serviços é o fato do governo não cumprir com o que estabelece a Constituição Federal (Artigo 231), a Lei Arouca (lei 9836/99), as deliberações das quatro Conferências Nacionais de Saúde Indígena e as leis da administração pública, onde ficam estabelecidos os preceitos, princípios e normas para o exercício dos serviços a serem prestados, pelos agentes públicos, para toda a população (Cf.  Art.  37).

Em resposta a terceira pergunta acerca das perspectivas, a partir desta portaria, de criação do Subsistema da Atenção a Saúde Indígena se pode afirmar que, na atual conjuntura, não existe nenhuma possibilidade de sua implementação.  Aproprio-me aqui do que o médico Paulo Daniel Morais, da Pastoral Indigenista da Diocese de Roraima e do Setor de Saúde do Conselho Indígena de Roraima (CIR), escreveu recentemente em artigo, que está disponível no sítio do Cimi, intitulado: A "Via Crucis" da saúde indígena no Brasil.  Diz o Paulo Daniel:

"Um dos principais fundamentos do modelo de atenção à saúde proposto nas Conferências de Saúde Indígena é a autonomia administrativa e financeira dos distritos, que deve ser alcançada com a sua transformação em unidades gestoras do Sistema Único de Saúde (SUS), contando com orçamentos próprios administrados através dos Fundos Distritais de Saúde.  Os chefes ou coordenadores dos distritos devem ser aprovados pelos conselhos distritais, e o controle social deve ser efetivo, com participação indígena legítima em todas as instâncias de decisão".

E ele prossegue: "Após oito anos da aprovação da Lei Arouca que estabeleceu os marcos legais para o funcionamento do Subsistema de Saúde Indígena, os povos indígenas e seus aliados enfrentam ainda o enorme desafio de superar estes obstáculos e construir os mecanismos técnicos e políticos que assegurem as condições adequadas de assistência à saúde e a melhoria dos indicadores e da qualidade de vida em suas comunidades".

Sobre a necessidade de uma nova estrutura para a gestão da saúde indígena Paulo Daniel observa: "O fortalecimento da capacidade gestora do governo federal, tanto nas coordenações dos distritos como no nível de coordenação central, depende da formação de um quadro estável de recursos humanos adequado às necessidades estratégicas da gestão, o que só será possível por meio de um concurso público diferenciado e que assegure a participação indígena nos processos de seleção.  O órgão gestor da saúde indígena precisa ter um perfil técnico independente das ingerências políticas, o que poderia ser alcançado através da reestruturação do Departamento de Saúde Indígena (DESAI/FUNASA) ou pela criação de uma Secretaria Especial de Saúde Indígena de caráter executivo ligada diretamente ao Ministério da Saúde, como tem sido proposto em diversas conferências".

Por fim, se pode afirmar que, no âmbito do Ministério da Saúde, a tendência predominante é de que a União deverá transferir as suas responsabilidades, no tocante a gestão e execução das ações em saúde indígena, para terceiros e que estes prioritariamente sejam os municípios.  Pode-se afirmar isso, em função de que não há interesse e nem vontade política do governo federal em discutir, com o movimento indígena, com as entidades de apoio e outros segmentos interessados, a formulação de uma nova política de saúde.  E o pouco que restou, em termos de deliberações das Conferências Nacionais de Saúde, dentro do atual modelo de prestação de serviços terceirizados foram os Conselhos de Saúde Indígena.  Estes, por sua vez, têm as suas decisões constantemente desrespeitadas, enquanto que deveriam ser balizadoras e suporte para todas as ações e serviços na área da saúde.  Portanto, as iniciativas dos povos indígenas em fazer o controle social têm sido consideradas, por grande parte dos gestores, como um problema a mais e não como espaço fundamental para a organização dos serviços de saúde.  E, em função disso, os Distritos Sanitários Especiais Indígenas, que seriam a base de toda a política tornaram-se uma espécie de referencia geográfica, para que a Funasa possa definir os tipos de convênios e as atribuições dos prestadores de serviços, na sua maioria terceirizados.

Porto Alegre, 03 de março de 2008.

Roberto Antonio Liebgott

Vice-Presidente do Cimi.

(CIMI - Conselho Indigenista Missionário, 04/03/2008)


http://www.amazonia.org.br/noticias/noticia.cfm?id=263123


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