Mais de 40 milhões de hectares de terras públicas da Amazônia --área equivalente ao território dos Estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Paraíba e Sergipe-- são ocupados e explorados por posseiros, sem qualquer registro formal. A indefinição fundiária impulsiona a violência no campo e a devastação ambiental.
Os dados fazem parte do estudo "Quem é dono da Amazônia? Uma análise do recadastramento de imóveis rurais", lançado pela ONG Imazon (Instituto do Homem e do Meio Ambiente da Amazônia) nesta semana.
"Estas terras, legalmente públicas, na prática representam uma privatização gratuita. Os posseiros extraem madeira, exploram a agropecuária e não pagam nada por isso", avalia o pesquisador Paulo Barreto, do Imazon.
Ele diz considerar ineficaz o simples cadastramento dos posseiros --o último, concluído pelo Incra em 2003, listou 302 mil registros de posses que totalizavam aproximadamente 42 milhões de hectares.
Segundo ele, é preciso definir uma política clara para as terras públicas ocupadas na Amazônia. "Ou o governo retoma as terras ou faz os posseiros pagarem pela terra. Se nada disso ocorrer, até mesmo os esforços de combate ao desmatamento ficarão prejudicados."
Barreto acredita que, pela facilidade de acesso a grandes porções de terras --pagando pouco ou nada por isso--, os posseiros se sentem pouco motivados a investir em produtividade. Para produzir mais, abrem novas áreas.
"Se tenho acesso facilitado à terra, porque vou me preocupar em produzir mais no mesmo espaço? Neste sentido, as posses são um dos motores do desmatamento na região."
Não se trata de um problema de pequenos lavradores, diz o pesquisador. Conforme os dados do Incra, a maior parte das áreas públicas ocupadas informalmente na Amazônia em 2003 era constituída por propriedades acima de mil hectares. Estas, no entanto, representavam pouco mais de 5% do número de posses cadastradas no Incra em 2003. "A concentração fundiária é muito grande. Até mesmo porque, em muitos casos, a ocupação dessas áreas se deu por meio de conflitos, onde vigora a lei do mais forte", diz.
O estudo reconhece que uma ampla regularização enfrentará resistências, "pois implicará eliminar o subsídio que a apropriação e uso gratuito dessas terras tem significado durante mais de duas décadas".
(Por RODRIGO VARGAS, da
Agência Folha, 28/02/2008)