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2008-02-28
Ambientalista Nobel da Paz e premiê inauguram banco de grãos construído em caverna no Ártico.  Embrapa selecionará amostras

Até o final do ano, espécimes brasileiras de sementes estarão protegidas contra quaisquer ameaças de extinção, incluindo ataques nucleares, terremotos e aquecimento global.  José Manoel Cabral, chefe-geral da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, confirmou ao Correio que a entidade enviará amostras para a caixa-forte do Fundo Global de Diversidade Agrícola, construída no interior de uma montanha e inaugurada ontem pela manhã no remoto arquipélago norueguês de Svalbard, no Ártico.  "A decisão do Brasil de participar desse banco mundial de sementes está tomada.  O que estamos fazendo é estudando aspectos jurídicos e legais envolvidos no envio desse material", destacou Cabral.  "Os gestores do banco querem receber materiais únicos e, por isso, entramos na questão das leis sobre patrimônio genético", acrescentou.

O pesquisador afirmou que interessa ao Brasil manter uma cópia do material genético.  "A importância estratégica em participar será inegável, porque teremos uma reserva de segurança de nossas sementes.  Além disso, será a oportunidade de criarmos um banco de dados mundial e firmar um intercâmbio com outras nações", disse.  Com 100 mil amostras de mais de 400 espécies vegetais, a Embrapa já mantém cooperação técnica com países como Estados Unidos, Japão e China.  De acordo com Cabral, a idéia é enviar, em um primeiro momento, espécies para alimentação mais difundidas, como arroz, feijão, trigo e soja.  "Depois, poderíamos mandar espécies de biodiversidade ativa, como açaí e cupuaçu", comentou.  Os cientistas analisam incluir o guaraná e o amendoim entre as sementes.

O primeiro-ministro da Noruega, Jens Stoltenberg, destrancou ontem pela manhã as quatro portas de aço maciço que levam ao interior da caixa-forte conhecida como "Arca de Noé" — em alusão à arca criada pelo personagem bíblico para salvar animais do dilúvio.  Com a ajuda da ambientalista queniana Wangari Maathai, Prêmio Nobel da Paz em 2004, transportou a "Caixa 1", com grãos de arroz de 104 países.  Eram as primeiras das 100 milhões de sementes do carregamento inicial.  A cerimônia foi assistida por José Manuel Barroso, presidente da Comissão Européia.

Em Svalbard, Maathai falou ao Correio por telefone e não escondeu a alegria por ter sido convidada pelo governo norueguês a depositar as primeiras amostras na caverna.  "Foi um momento muito emotivo.  É tocante saber que alguém virá um dia e encontrará as sementes que coloquei lá."

Cooperação A Nobel da Paz sublinhou a importância da "Arca de Noé verde", cuja obra teve custo de US$ 9,1 milhões.  "É algo visionário, um sinal de como a cooperação internacional pode ser valiosa para o bem comum", declarou.  "Sabemos que há várias ameaças contra as sementes, e é crucial termos um depósito ao qual os países possam recorrer", disse a queniana.

Maathai comentou o envolvimento do Brasil com o projeto.  "O Brasil é muito rico em algumas das melhores e mais originais sementes do mundo, e seria maravilhoso se o país pudesse participar", argumentou.  Ela citou a castanha-do-pará como exemplo de material a ser guardado e destacou a riqueza da Amazônia.

Jório Dauster, ex-embaixador do Brasil na União Européia e membro do Fundo Global de Diversidade Agrícola, lembrou que culturas foram perdidas com a guerra civil no Afeganistão e com o conflito no Iraque.  "No local onde funciona a prisão de Abu Ghraib, famosa pelas torturas de iraquianos, havia uma coleção de sementes que foi destruída", exemplificou.  "Guerras, aquecimento global e escassez de dinheiro poderiam eliminar sementes extraordinárias, frutos de 13 mil anos de cultura.  Por isso, a caixa-forte foi construída em um lugar a salvo, a 1.200km do Pólo Norte", disse.

O diplomata acredita que sementes de plantas do agreste brasileiro e da Amazônia, além de oleaginosas como a mamona (usada na produção de biodiesel), poderiam um dia ser armazenadas no local.

(Correio Braziliense, 27/02/2008)

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