Há quase três anos, no dia 1º de março de 2005, aproximadamente 60 índios xoklengue invadiram a Barragem Norte, no município de José Boiteux. Na oportunidade, equipamentos da barragem foram totalmente destruídos. O objetivo era cobrar do governo federal o cumprimento do protocolo de intenções, assinado em 1992, que indeniza sete aldeias pelas perdas sofridas com a construção da barragem. A invasão já vinha sendo noticiada há mais de 30 dias pela imprensa local e tomou fôlego após os indígenas não obterem respostas em relação ao pedido de reinício da demarcação efetiva de suas terras.
Dias após a invasão, o procurador da República em Blumenau João Marques Brandão Néto ingressou na Justiça Federal para obrigar a União e o Estado de Santa Catarina, réus na ação, a manter a segurança, determinada em sentença de 2001, no sistema de barragens que protege o Vale do Itajaí das enchentes. Na inicial (Ação de Atentado nº 2005.72.05.000766-3), o procurador Brandão lembrou que manter a segurança da Barragem de José Boiteux é assunto antigo no Ministério Público Federal. Em outubro de 1997, uma ação foi proposta para requerer a contratação de vigias a fim de efetuar a segurança permanente do local. Para o procurador da República, após 11 anos a situação de insegurança da Barragem de José Boiteux permanece a mesma.
Nas alegações finais, o procurador Brandão afirma que a invasão de 2005 retrata um quadro de total omissão das autoridades responsáveis pela segurança pública. Segundo ele, a União e o Estado de Santa Catarina largaram a referida barragem (e a população que por ela deveria ser protegida das cheias) à sua própria sorte. Durante mais de um ano, não cumpriram com o dever de vigilância que já havia sido objeto de Sentença. Para o procurador Brandão, em vistoria judicial realizada no final de janeiro, ficou claro que, caso não haja um plano funcional de segurança para a barragem, ela continuará a ser usada como meio de pressão para as reivindicações dos indígenas.
Mas, se a primeira vista o posicionamento do MPF gera confusão em virtude de suas atribuições (o órgão tem como função institucional proteger os direitos indígenas), para Brandão a confusão de atribuições só haveria caso fosse direito dos índios ocupar e destruir a barragem de José Boiteux. “A barragem de José Boiteux não se inclui mais nas terras indígenas. Além disso, a ocupação e destruição dessa barragem coloca em risco a vida, a segurança e o patrimônio de cerca de um milhão de outras pessoas, todas com a mesma dignidade dos índios”, afirma ele. Desde que assumiu a Procuradoria da República em Blumenau, o procurador Brandão presenciou três invasões à barragem de José Boiteux: em 1997, 2001 e 2005.
As invasões e depredação da barragem, implicam crimes do artigos 163, III, 255 e 345 do Código Penal Brasileiro (grave dano ao patrimônio da União; destruir prédio ou obra destinada a impedir inundação; fazer justiça pelas próprias mãos, respectivamente), além da hipótese do art. 15, da Lei de Segurança Nacional (Lei nº 7.170/1983).
Na ação, o MPF apresenta um plano de segurança que estabelece inúmeras medidas preventivas e coercitivas contra a invasão da barragem e, na falha destas, estabelece um padrão de procedimento a ser adotado pelas autoridades, bem como pela sociedade civil envolvida com a questão. Entre as medidas preventivas, a colocação de segurança no local 24 horas por dia. Em caso de ameaça ou de invasão, para desocupar e restabelecer o funcionamento da barragem deverá ser executado plano de segurança, envolvendo a vigilância do local, a Polícia Militar, a Polícia Federal e, em caso necessário, o Exército brasileiro.
ACP nº 2005.72.05.000766-3
(Ascom MPF-SC, 26/02/2008)