Ao que tudo indica, a operação chamada desde o ano passado de Upatakon 3, para retirada dos não-índios da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, deve sair mesmo do papel. O superintendente da Polícia Federal, Cláudio Lima, confirmou ontem para a Folha que está na cidade o delegado federal Jonas Cleber Rossati, que vai coordenar a operação. O dia e horário serão mantidos em segredo sob a justificativa de questões de segurança. O superintendente da PF alegou não saber de detalhes sobre a ação, como, por exemplo, da chegada na cidade de policiais federais. O nome Upatakon na língua Macuxi quer dizer "nossa terra".
No mês de abril completam-se três anos que a terra foi homologada. De lá para cá surgiram várias datas para a operação. Inclusive, duas datas foram anunciadas por parlamentares federais que se disseram preocupados com a megaoperação planejada pelo Governo Federal para retirada de menos de dez produtores de arroz de dentro da terra Raposa Serra do Sol.
A primeira Operação Upatakon, da Polícia Federal, começou dia 17 de março de 2005, com objetivo de garantir a homologação em área contínua da Raposa Serra do Sol. A previsão inicial era de que a operação durasse 60 dias, mas seu fim foi adiantado pelo fato de quatro policiais federais terem sido mantidos reféns pelos indígenas na comunidade do Flechal, durante oito dias (eles foram libertados dia 30 de abril).
A Upatakon 2 iniciou no dia 22 de abril de 2006, quando policiais federais começaram a entrar nas fazendas de arroz localizadas no chamado "cinturão de arroz", dentro da reserva Raposa Serra do Sol. Cerca de 260 homens chegaram à Vila Surumu um dia antes para acompanhar a equipe técnica do Incra e da Funai, a qual procedeu às medições dos terrenos e benfeitorias existentes. Algumas pessoas tentaram atear fogo na ponte de madeira que liga Pacaraima a Vila Surumu.
Preparados com armas e usando coletes, capacetes e escudos à prova de balas, bombas de gás de pimenta e de efeito paralisante, os policiais federais fecharam as principais vias de acesso à comunidade. A estratégia foi para evitar problemas com indígenas que poderiam tentar fazer agentes federais como reféns em represália à retirada dos não-índios da reserva, como ocorreu na primeira fase da operação, no ano passado. O Exército cedeu helicópteros e material de apoio. Além de quatro ônibus, foram enviadas para a área da reserva carretas, motocicletas e pick-ups carregadas de equipamentos. Para a terceira operação, o Exército não deverá participar. Alguns dirigentes militares em visita ao Estado deixaram clara a preocupação com o vazio nas áreas de fronteira para a segurança nacional.
Na entrevista concedida no início de janeiro deste ano, o coordenador do Comitê Gestor, José Nagib Lima, que estava em Rorainópolis ontem, havia descartado a participação do Exército sob o argumento de que a Funai tem larga experiência e a Polícia Federal iria fazer o trabalho de acompanhamento dos técnicos. "Não é necessário colocar o Exército aqui, mesmo porque não é sua competência. Se o Exército viesse era para dar apoio logístico". (RL)
Quartieiro diz que índios planejam seqüestrá-lo e que haverá resistência
O presidente da Associação dos Rizicultores de Roraima, Paulo César Quartieiro, disse que existe um plano orquestrado por indígenas ligados ao Conselho Indígena de Roraima (CIR) para que durante a assembléia a ser realizada na Vila Surumu, em março, ele e outros produtores sejam seqüestrados. Além do suposto seqüestro, ele disse que "pessoas" foram contratadas para invadir as fazendas, atacar os caminhões carregados e colocar fogo nas casas e outras propriedades rurais. Questionado sobre como saberia de um plano como este, afirmou existirem informantes: "Não somos tão bobos assim, nós temos nossas fontes".
Quartieiro reforçou que a qualquer momento que aconteça a operação do Governo Federal os produtores estarão preparados para reagir à ação de retirada. "Foram muitas ameaças de retirada, mas nós vamos nos defender e não entregaremos nossas terras de graça. Se o Governo Federal acha que vamos entregar, está muito enganado". Sobre a possibilidade de diálogo, o presidente da associação rebateu, questionando como pode haver diálogo onde o Governo Federal entra com "a guilhotina e os produtores com o pescoço". Na existência de um provável conflito em área, disse que a Polícia Federal estará para apaziguar, mas que eles serão as vítimas e os índios "teleguiados" pelas organizações não-governamentais.
CIR
O coordenador-geral do Conselho CIR, Dionito José de Souza, repudiou as declarações de Quartieiro sobre o planejamento de atos de violência durante a realização da Assembléia Geral Extraordinária dos Tuxauas. "Isto é uma calúnia, falta de respeito com os índios, porque não tem planejamento dessa maldade", afirmou.
Conforme o líder do CIR, a assembléia, que acontece de 06 a 10 de março na Maloca do Barro, antiga Vila Surumu, servirá para discutir várias pautas de interesse dos indígenas, como questões de saúde, educação, direitos, garantias, questão fundiária. Lideranças de todo o Estado vão participar. Também foram convidados órgãos como Funai, Ibama, Incra, secretarias de Educação e de Saúde. "Somos contra a violência e o que vamos fazer nessa assembléia, que está planejada desde o ano passado, é discutir em conjunto ações que serão executadas durante este ano para que beneficiem os indígenas".
(Folha de Boa Vista, 25/02/2008)