Cuba só vai aderir à febre do etanol se conseguir produzir o álcool como subproduto da cana, sem afetar a produção de açúcar, disseram especialistas na sexta-feira. O anúncio da aposentadoria de Fidel Castro, nesta semana, alimentou especulações de que, no eventual governo de seu irmão Raúl, o etanol poderia se tornar uma importante fonte de divisas para o país comunista.
Raúl, que deve ser efetivado no domingo como presidente do país, é considerado menos ideológico e mais pragmático do que Fidel, e já sinalizou em discursos durante sua interinidade, iniciada em julho de 2006, que está interessado em atrair mais investimentos estrangeiros para a ilha.
Mas Fidel, que deve manter enorme influência em Cuba, já recriminou diversas vezes o uso de lavouras alimentícias para a produção de biocombustíveis, o que ele qualificou de crime contra a humanidade por elevar o preço dos alimentos e provocar fome entre os mais pobres.
Um economista local ligado ao setor açucareiro disse que Cuba está desenvolvendo uma tecnologia para a produção de etanol a partir do bagaço da cana. Só se isso der certo, segundo essa fonte, o país se interessaria mais pela produção de álcool combustível.
"É inconcebível enquanto Fidel estiver vivo que seu irmão Raúl ou quem quer que seja converta uma proporção significativa dos nossos canaviais ou de nossas terras ociosas em etanol", disse esse economista, pedindo anonimato.
"Mesmo depois que Fidel morrer, não consigo imaginar isso acontecendo durante algum tempo." Atualmente, o etanol é obtido da garapa da cana. Assim como ocorre no Brasil, há pesquisas com a tecnologia de celulose, que aproveitaria o bagaço já usado.
Cuba já foi o maior exportador mundial de açúcar. Em 1990, produziu 8 milhões de toneladas. Mas o fim da União Soviética, a queda nos preços e a má administração deixaram o setor em ruínas. Em 2006-07, a safra foi de apenas 1,2 milhão de toneladas.
O açúcar deixou de ser a principal fonte de divisas para a ilha, que na verdade atualmente importa por ano cerca de 200 mil toneladas de açúcar refinado para atender à demanda doméstica.
O economista Ronald Soligo, especialista em energia na Universidade Rice, em Houston (EUA), disse que Cuba poderia produzir cerca de 6 bilhões de litros de etanol por ano caso seus canaviais recuperassem a produtividade da época em que a União Soviética comprava açúcar a preços mais favoráveis.
Na época - década de 1980 - cada hectare rendia 55 toneladas, enquanto atualmente, rende 22 toneladas, segundo dados citados por Soligo numa conferência sobre Cuba na Universidade Internacional da Flórida, em Miami. "Parece que o etanol de cana realmente é uma oportunidade para Cuba suplementar, substituir parte do seu combustível importado e talvez até exportar etanol", afirmou.
Alguns especialistas acreditam que Cuba poderia ser o terceiro maior produtor mundial de álcool combustível, atrás de EUA e Brasil, mas isso exigiria enormes investimentos, não só para melhorar a produtividade dos canaviais, como também para financiar a pesquisa e a construção de usinas.
O governo, porém, reluta em autorizar empresas estrangeiras a administrarem as fazendas, uma pré-condição para os investidores interessados em atuar na agricultura cubana.
(
Gazeta do Povo, 25/02/2008)