As tensas relações diplomáticas entre Argentina e Uruguai podem se agravar se o governo uruguaio aprovar os planos da mineradora anglo-australiana Rio Tinto de construir um porto de minério de ferro no Rio Uruguai, na fronteira entre os países. Argentina e Uruguai travam uma acirrada batalha desde 2005, depois que o consórcio finlandês Metsa-Botnia Oy começou a instalar uma fábrica de celulose na margem uruguaia do rio, despertando dura resistência de ativistas argentinos.
Com a ponte sobre o rio bloqueada há mais de um ano por manifestantes, próximo à fronteira no lado uruguaio, os dois países aguardam uma decisão da Corte Internacional de Haia sobre a queixa argentina de que a fábrica viola um tratado bilateral destinado a proteger o Rio Uruguai e suas várzeas.
Até agora, nenhum país conseguiu uma resposta da Corte: nem o Uruguai em seu esforço para encerrar os protestos, que o país alega estarem causando prejuízo comercial de US$ 400 milhões; nem a Argentina em seu pedido de uma injunção preliminar para bloquear a construção da fábrica.
Agora, o projeto do porto ameaça complicar a disputa ainda mais. De acordo com o porta-voz da companhia, Nick Cobban, a Rio Tinto planeja gastar US$ 205 milhões para montar em Agraciada, no Uruguai, a instalação que embarcará em navios o minério de ferro de sua mina em Corumbá, em Mato Grosso do Sul.
O minério atualmente é transportado por barcaças pelos Rios Paraguai e Paraná até o porto argentino de San Nicolas. Parte é vendida localmente e o restante segue para a Europa, o Oriente Médio e a Ásia. O projeto tem levantado questionamentos por parte de autoridades argentinas, que se ressentem por não terem sido previamente consultadas.
No fim do ano passado, o governo argentino fez uma solicitação formal de informações sobre os planos de desenvolvimento do porto à Comissão de Administração do Rio Uruguai (Caru), uma entidade uruguaia. Autoridades argentinas disseram ao jornal La Nación que não sabiam do projeto até lerem sobre ele no site da prefeitura local.
Consultas. "O tratado do rio diz que a parte que toma a iniciativa tem de informar e realizar consultas antes de qualquer projeto, e não decidir e informar depois", disse ao jornal um diplomata não identificado.
De acordo com o ministro dos Transportes do Uruguai, Víctor Rossi, a resposta da chancelaria argentina faz parte de um padrão de conduta segundo o qual a Argentina faz "tempestade em copo d"água".
"Não pode haver comunicação entre os dois países sobre coisas que não existem", afirmou Rossi ao jornal uruguaio El Pais. "O Uruguai não tomou qualquer providência e muito menos fez uma declaração sobre a proposta (do porto), nem concedeu autorização."
Segundo o porta-voz da empresa, a Rio Tinto já apresentou seu Relatório de Impacto Ambiental ao governo uruguaio. A companhia precisa da aprovação do documento antes de começar a construção do porto.
A Rio Tinto garante que o projeto não causa danos ambientais. "Não pode ser comparado a uma fábrica de celulose e não deveria causar conflito", disse Coban. "Não há concentração populacional no lado do porto, é área rural, nem no lado argentino."
Os ambientalistas, porém, estão examinando o projeto cuidadosamente. Os que aderiram à luta contra a fábrica de celulose têm o apoio tácito da presidente Cristina Kirchner e de seu marido e antecessor no cargo, Néstor Kirchner. Nenhum dos dois interveio para impedir os bloqueios da ponte.
(AE-Dow Jones, Jornal do Commercio-RJ,
FGV, 21/02/2008)