Belo Horizonte perdeu, mais uma vez, a oportunidade de aprovar uma legislação que restrinja a poluição visual. Manobra do vereador Wagner Messias (DEM), o Preto, tirou de circulação o Projeto de Lei 1.416, proposto pelo prefeito Fernando Pimentel (PT) no ano passado, com o objetivo de limitar a afixação de outdoors e outros painéis de propaganda nas ruas e avenidas da capital. O texto foi retirado de tramitação, a requerimento do parlamentar, e só voltará a ser discutido se ele, principal articulador dos interesses do setor de publicidade, quiser. A façanha foi possível graças às brechas do Regimento Interno da Câmara Municipal.
A proposta foi levada ao Legislativo pelo próprio prefeito, em junho, depois de um imenso desgaste causado pelo vereador. Meses antes, Pimentel foi obrigado a vetar projeto de sua autoria sobre o mesmo tema, porque o Ministério Público Estadual (MPE) abriu investigação para apurar outra manobra de Preto. Em plenário, ele conseguiu suprimir uma das poucas regras que dificultava a proliferação dos painéis, na votação em segundo turno.
Desta vez, o parlamentar usou o conjunto de normas que disciplinam o funcionamento da Câmara como arma. O regimento diz que o presidente do Legislativo só pode aceitar projetos que “não guardem identidade ou semelhança” com outros previamente apresentados. Caso isso se verifique, a proposição pode ser anexada à primeira, ficando prejudicada.
O vereador é autor do Projeto 417, proposto em abril de 2005, que também versa sobre a publicidade em BH. Graças a ele, obteve seu xeque-mate, numa jogada de três atos. O texto estava suspenso, mas, depois que o prefeito levou a sugestão que fere os interesses das empresas de outdoors, Preto pediu que a sua proposta voltasse a tramitar. O requerimento foi apresentado ao presidente Totó Teixeira (PR) em 18 de outubro e deferido cinco dias depois. Na mesma data, chegou às mãos de Totó outra solicitação do parlamentar, prontamente aceita, reivindicando a anexação do texto da prefeitura, devido à duplicidade do tema.
Com isso, passou a prevalecer o projeto de lei de Preto. Em caso de votação, os vereadores são obrigados a apreciá-lo, em detrimento do outro. O golpe final veio em 21 de dezembro, quando ele apresentou o último ofício, também acatado pelo presidente, para suspender a tramitação do seu texto, o que, devido à anexação, inutilizava também o da prefeitura. Na prática, a decisão de reabrir as discussões está nas mãos do parlamentar. Isso porque a suspensão só pode ser revogada a requerimento dele.
Antes de executar a manobra, a bancada do outdoor na Câmara tentava negociar emendas para suavizar as regras propostas por Pimentel. De acordo com uma fonte ligada ao governo, o pedido de suspensão veio dias depois que o secretário municipal de Políticas Urbanas, Murilo Valadares, se negou a ceder. “Foi uma chantagem e ela funcionou”, afirma, acrescentando que dificilmente será possível anular a derrota.
Caso a prefeitura apresente outra proposta, Preto poderá anexá-la novamente. Para sugerir um substitutivo ao texto do vereador – emenda que, se aprovada, se sobrepõe ao projeto de lei original –, terá que convencê-lo a recolocar seu texto em tramitação. “E, obviamente, será preciso aceitar o que ele propõe”, comenta a fonte.
O vice-líder de governo na Câmara, Paulo Lamac (PT), diz que ainda será discutida uma estratégia para aprovar o projeto. Uma das possibilidades, segundo ele, seria propor alterações novamente e, via requerimento ao presidente, tentar declará-la distinta do Projeto de Lei 417. A jogada pode não dar certo, pois cabe à Diretoria do Legislativo dar parecer sobre o assunto. “Foi uma batalha, mas o resultado não é definitivo”, pondera o vereador, ressaltando que o Executivo não perdeu absolutamente.
Nos bastidores, a informação é de que a prefeitura jogará a toalha. Diante da derrota, já se discute fazer apenas pequenas alterações no Código de Posturas – legislação que disciplina a publicidade –, por meio de decretos. Neste caso, não seriam tantas as restrições, pois é preciso respeitar o texto da lei e ele não permite muitas limitações.
Restrições
O projeto do Executivo tinha recebido parecer favorável da Comissão de Legislação e Justiça e aguardava apreciação de outras duas para ser colocado em pauta. Ele proíbe a afixação de outdoors dentro do perímetro da Avenida do Contorno. Fora dessa área, a instalação só é permitida em grandes avenidas (vias regionais e arteriais), respeitando-se o limite de um por face de quarteirão. As empenas – painéis pregados na fachada cega dos prédios – são liberadas nos grandes corredores, mas restritas a uma por face de quadra na área central.
Preto alega que a manobra é uma maneira de forçar a bancada governista, maioria na Câmara, a apreciar projetos dos vereadores. “Nesta Casa, só se vota o que é do Executivo. Não tenho que me curvar. Se eles (os vereadores de situação) quiserem, vão ter que votar o meu”, justifica, acrescentando que já recorreu à estratégia em outras situações. É o caso do Código de Obras, aprovado recentemente.
Ele diz que pediu a suspensão do texto porque estava envolvido na campanha contra a transferência da rodoviária para o Bairro Calafate, na Região Oeste de BH, mas garante que vai recolocá-lo em tramitação em abril ou maio. Em ano eleitoral, a possibilidade de que a proposta avance a partir dessa época é mínima. Envolvidos em campanha, os vereadores deixam de lado os temas mais polêmicos. Além disso, como vários têm candidato a prefeito, fica difícil para o governo conseguir apoio. “Infelizmente, matéria que é tão importante para o município só deve ser votada na próxima legislatura”, lamenta Fred Costa (PHS). “Mas caso Preto não chegue na frente”, pondera a fonte.
(Fábio Fabrini, Estado de Minas, 18/02/2008)