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etanol
2008-02-18
O álcool é um bom substituto da gasolina: não tem impurezas de enxofre e emite menos dióxido de carbono - o principal dos gases responsáveis pelo “efeito estufa” e pelas mudanças climáticas - do que a gasolina. O que se esperaria, portanto, seria um apoio entusiástico dos ambientalistas a estes programas tanto na Europa como nos Estados Unidos. Não é o que está acontecendo e não deixa de ser interessante analisar quais as objeções que são levantadas por eles.

A primeira delas é que a produção das grandes quantidades de álcool, necessárias na Europa e nos Estados Unidos, criará um conflito entre a produção de combustível e a produção de alimentos, o que resultará no aumento dos preços dos alimentos e prejudicará os mais pobres, aumentando a fome no mundo. Entre outros, este argumento foi articulado por A. Ziegler, da Suíça, relator de um documento preparado para a Assembléia-Geral da Organização das Nações Unidas em 2007.

Sucede que os argumentos de Ziegler são incorretos: não existe falta de alimentos no mundo, mas problemas de distribuição, e a fração da população mundial que é desnutrida - cerca de 800 milhões de pessoas - não será atendida enquanto a renda não for melhor distribuída no mundo. Além disso, a área destinada à produção de álcool no mundo hoje é inferior a 1% da área dedicada à agricultura. O preço de cereais e de alimentos, em geral, tem caído ao longo das últimas décadas, apresentando, contudo, flutuações que dependem das condições climáticas e de muitos outros fatores. É por essa razão que atribuir o aumento do preço do milho nos Estados Unidos a uma catástrofe que vai atingir a população mais pobre do mundo é um exagero. Nos Estados Unidos, de 2006 a 2007, a área dedicada ao milho aumentou 5 milhões de hectares sobre a área dedicada à soja. A área total usada na produção de milho e soja nos Estados Unidos é de 60 milhões de hectares e, no mundo todo, cerca de três vezes maior.

A segunda delas, que atribui ao avanço do milho nos Estados Unidos o aumento do desmatamento da Amazônia, como foi feito recentemente por um cientista americano radicado no Panamá, é outro exagero. A idéia é que a redução da área de soja nos Estados Unidos leva ao aumento da sua produção na Amazônia, o que aumentaria a devastação naquela região. Sucede que os números não batem. As plantações de soja não aumentaram nos últimos três anos na Amazônia: o que aumentou foi o rebanho bovino, que já é de 75 milhões de cabeças. Este é o verdadeiro problema. A soja poderia vir depois, mas isso não acontece ainda na escala prevista em base ao argumento acima.

Finalmente, um grupo suíço fez uma análise para verificar se o uso de álcool (de milho e cana-de-açúcar) reduz, de fato, as emissões de carbono. A novidade introduzida por esse grupo é considerar também as emissões resultantes do desmatamento, onde o produto agrícola foi plantado. E conclui, corretamente, que, se isso for feito à custa da devastação de florestas nativas, o resultado seria péssimo.

Sucede que a única região do mundo em que isso está ocorrendo é na Indonésia, onde estão sendo derrubadas florestas nativas para expandir a produção de dendê (que dá origem ao biodiesel). A expansão das plantações de milho nos Estados Unidos ou de cana-de-açúcar no Brasil está ocorrendo em áreas que já são dedicadas à agricultura ou à pecuária e, no Brasil, existem cerca de 200 milhões de hectares de pastagens para expansão não predatória da cana-de-açúcar, que poderiam se transformar em pecuária mais intensiva, liberando áreas para a cana-de-açúcar, como ocorreu no Estado de São Paulo de 2002 a 2006.

As objeções à produção de etanol ganham mais substância quando apontam os problemas que a produção tem quando é baseada no milho ou na beterraba: o balanço energético não é bom porque é usado combustível fóssil na sua preparação. Neste particular o etanol de cana-de-açúcar é claramente superior: o bagaço da cana fornece toda a energia necessária à produção do álcool e o seu custo a partir de 2004 é inferior ao da gasolina. Aliás, com o progresso da tecnologia, as usinas de álcool passaram a “exportar” eletricidade. No Estado de São Paulo se acredita que este excedente chegará a mais de 10 milhões de quilowatts no ano 2015, quase a eletricidade gerada em Itaipu.

Por esta razão o etanol da cana-de-açúcar terá um papel essencial em suprir as necessidades não só brasileiras, como as mundiais, dentro de 10 ou 15 anos. A Europa produz hoje apenas 2 bilhões de litros por ano (a partir da beterraba) e necessitará de pelo menos 20 bilhões de litros em 2020 para cumprir com a meta que adotou de substituir 10% da gasolina derivada do petróleo, que não conseguirá produzir na própria Europa. Os Estados Unidos planejam utilizar 136 bilhões de litros em 2022 (50 bilhões de litros de etanol de milho) e o restante de novas tecnologias. É pouco provável que essas metas sejam atingidas. A solução será importar etanol de países da área tropical, principalmente do Brasil, e as barreiras alfandegárias que existem nesses países foram introduzidas justamente para proteger os produtores locais, que, sem elas, não teriam condições de competir.

As resistências ao uso crescente de etanol se originam, portanto, de duas direções: de alguns ambientalistas pouco esclarecidos sobre as verdadeiras proporções do problema e dos produtores locais na Europa e nos Estados Unidos, que usam os argumentos dos ambientalistas para proteger seus interesses comerciais.

Artigo de José Goldemberg é professor da Universidade de São Paulo
(O Estado de São Paulo, 18/02/2008)


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