A rede Carrefour acaba de lançar, na imprensa nacional, a campanha e caderno "Eu uso a cuca", contendo "dez mandamentos" para seus clientes. O décimo reza "Escolha empresas comprometidas com o desenvolvimento sustentável". Mas, pelas informações disponíveis até o momento, parece difícil para o consumidor implementar este mandamento nos supermercados da rede, pelo menos no que disser respeito aos produtos da Amazônia.
O Carrefour possui mais de 100 mil cabeças de gado na Amazônia Legal, cujo abate é realizado em parte pela Friboi e cuja origem parece ser, em sua maioria, ilegal. Quem o sugere é o próprio Carrefour, em seu site. Das várias fazendas que possui, a empresa menciona apenas aquela supostamente melhor em termos de desempenho ambiental, isto é a São Marcelo, em Juruena, no Noroeste de Mato Grosso. Eis o que consta no site da rede varejista: "Só para se ter uma idéia, da importância que o Carrefour dá ao tema (sic), quase a metade da Fazenda São Marcelo, no Mato Grosso, tem suas matas nativas totalmente intocadas."
De fato, a informação consegue "dar uma idéia": se "quase a metade" da fazenda São Marcelo tiver ainda mata nativa - admitindo portanto que ela tenha aproximadamente 40% de cobertura florestal - metade da produção do Carrefour nesta fazenda seria ilegal, pois o mínimo que a lei exige nesta região é uma cobertura florestal de 80%. O Carrefour nem sequer menciona outras fazendas. Entre elas há a Vale do Sepotuba e a Matovi, que possivelmente devem apresentar indicadores de ilegalidade maiores, pois nem sequer aparecem na lista "Garantia de Origem" do mesmo site. De acordo com informações divulgadas pela Secretaria de Comunicação do estado de Mato Grosso, a fazenda Vale do Sepotuba teria 4.300 hectares, dos quais seriam preservados apenas um quarto, ou seja 1.104. Já no caso da Matovi, de 1.200 hectares, apenas 160 seriam mantidos como reserva. Ainda de acordo com o site da SECOM/MT, o grupo teria também parceria com outros 15 pecuaristas no estado, além de arrendar mais fazendas nas regiões de Juína e Juruena. Dessa forma, na mais otimista das interpretações a rede teria, por sua própria admissão, a maioria de sua produção bovina de origem ilegal. Além disso, o Carrefour não divulga ter adotado qualquer sistema de controle da legalidade ambiental de fornecedores terceiros.
Mas o dever de casa que a rede terá de cumprir, caso deseje se enquadrar em seus próprios mandamentos, vai muito além da questão da carne. De acordo com Karina Aharonian, gerente do Grupo de Compradores de Produtos Florestais Certificados, o Carrefour também não faz parte até hoje desta associação empresarial, que reúne as empresas que buscam madeira, carvão, papel, castanhas e outros produtos com certificação de origem pelo FSC. Da mesma forma, no site da empresa não consta qualquer compromisso relacionado com a certificação florestal, ou até mesmo uma priorização de tais produtos perante seus fornecedores. O Grupo de Compradores relata que tem recebido algumas demandas para compra de produtos certificados pela matriz do Carrefour, na França, mas nada por parte da empresa no Brasil, até o momento.
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Amazonia.org.br, 08/02/2008)