Entre os feriados do Natal e do Ano Novo, a Câmara Municipal do Rio de Janeiro aprovou uma lei que, se for levada à prática, obstruirá uma parte significativa da pesquisa científica realizada na cidade por instituições como a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), as universidades federal e estadual do Rio de Janeiro e o Instituto Nacional do Câncer (Inca).
De autoria do vereador e ator Cláudio Cavalcanti, a lei tornou ilegal o uso de animais em experiências científicas na cidade. “Um ser humano que tortura seres dominados e incapazes de se defender, seres que gritam e choram de dor – seja esse ser um pesquisador ou um psicopata – representa o rebotalho da Criação”, justificou Cavalcanti, um destacado militante na defesa dos direitos dos animais, em favor de seu projeto.
A comunidade acadêmica reagiu. A estratégia foi definida na primeira semana de janeiro, numa reunião entre o secretário de Ciência e Tecnologia do estado do Rio, Alexandre Cardoso, e pesquisadores de várias instituições.
A bancada de deputados federais do estado será mobilizada para ajudar a aprovar um projeto de lei que tramita no Congresso há 12 anos e estabelece normas para a utilização criteriosa de animais em experimentação. A lei municipal perderia efeito se o projeto federal sair do papel.
Paralelamente, os pesquisadores também decidiram partir para a desobediência e ignorar a lei. “Continuaremos trabalhando com animais de laboratório, cujos protocolos foram aprovados pelos comitês de ética, e com animais das instituições de pesquisa”, diz Marcelo Morales, presidente da Sociedade Brasileira de Biofísica (SBBf) e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), um dos líderes da reação dos cientistas.
Acontece que a interrupção do uso de animais geraria prejuízos imediatos com repercussão nacional, como a falta de vacinas, inclusive a de febre amarela. O controle de qualidade dos lotes de vacinas fabricados no Rio pela Fiocruz é feito por meio de animais de laboratório. A inoculação em camundongos atesta a qualidade dos antígenos antes que eles sejam aplicados nas pessoas.
Sem poder usar roedores, a distribuição de vacinas como a de hepatite B, raiva, meningite e BCG teria de ser interrompida, por falta de segurança. “Também é fundamental esclarecer à população que, se essas experiências forem proibidas na nossa cidade, todos os nossos esforços recentes para descobrir vacinas para a dengue, a Aids, a malária, a leishmaniose seriam jogados literalmente no lixo”, diz Renato Cordeiro, pesquisador do Departamento de Fisiologia e Farmacodinâmica da Fiocruz.
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(Por Fabrício Marques, Agência Fapesp, 14/02/2008)