O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva estuda a criação de um mecanismo para que os bancos brasileiros, tanto públicos quanto privados, sejam obrigados a condicionar a concessão de empréstimos à legalidade ambiental dos produtores rurais.
A proposta foi discutida ontem, no Palácio do Planalto, em uma reunião em que participaram o presidente Lula, os ministros Guido Mantega (Fazenda), Miguel Jorge (Desenvolvimento) e Marina Silva (Meio Ambiente), além de representantes do Ministério do Desenvolvimento Agrário e dos bancos estatais brasileiros.
"Estamos criando mecanismos efetivos para que produtores rurais que realizam o desmatamento fiquem proibidos de receber incentivos financeiros", disse Marina Silva a jornalistas, ao final da reunião.
No encontro, Mantega propôs uma edição de uma resolução do Conselho Monetário Nacional, que deve se reunir no final do mês, para regulamentar tal mecanismo.
Além disso, o presidente encomendou aos participantes da reunião uma série de medidas, para serem apresentadas na semana que vêm, com o intuito de por em prática uma lei de 1981.
Durante a discussão, segundo a Folha apurou, o presidente Lula disse que "não é correto a gente ficar financiando coisas que depois nos dão prejuízo enorme, não só nacionalmente como internacionalmente".
A lei no 6.938 diz que as "entidades e órgãos de financiamento incentivos governamentais condicionarão a aprovação de projetos habilitados a esses benefícios ao licenciamento, na forma de lei, e ao cumprimento das normas, dos critérios e dos padrões expedidos pelo Conama [Conselho Nacional do Meio Ambiente]".
Tal lei também prevê aos que não cumprirem as determinações exigidas "a perda ou restrição de benefícios fiscais concedidos pelo Poder Público, em caráter geral ou condicional, e a perda ou suspensão de participação em linhas de financiamento em estabelecimentos oficiais de crédito".
Em 2003, o governo também anunciou que a verba do FNO (Fundo Constitucional da Região Norte) seria totalmente usada para financiar atividades sustentáveis, como o manejo florestal de baixo impacto.
Na prática, nada disso aconteceu. Os bancos continuam fornecendo empréstimos a juros subsidiados -os mais baixos do país- a agricultores e pecuaristas na Amazônia. Do começo do governo Lula até 2007, segundo um cálculo do Imazon (Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia), a pecuária na região recebeu R$ 1,89 bilhão em financiamento só do FNO. Apesar da proibição formal, o dinheiro acaba sendo usado indiretamente para derrubar a floresta, já que o produtor sabe que terá lucro com sua atividade.
De acordo com o diretor do Serviço Florestal Brasileiro, Tasso Azevedo, apesar da existência dessa lei e de um compromisso firmado em meados dos anos 1990, chamado de Protocolo Verde, as entidades financeiras não têm mecanismos para saber se estão financiando o desmate ilegal.
"O banco só tinha como saber isso indo ao local. Agora com o recente decreto, editado em dezembro passado, as entidades não terão como não saber", afirmou Azevedo. "Mesmo com a legislação, grande quantidade de recursos foi alocada nos últimos anos na Amazônia, e com certeza parte desse dinheiro foi usado para o desmatamento ilegal."
O decreto estabeleceu o recadastramento de propriedades rurais dos 36 municípios considerados os campeões no recente desmatamento da Amazônia. Para se recadastrar, os proprietários devem mostrar aos técnicos do Incra a planta georreferenciada, ou seja, uma imagem de satélite com as coordenadas completas da propriedade, que ao final será disponibilizada na internet. Um sistema será criado até abril, com o novo cadastro, mostrando quais realizam e quais não realizam o desmatamento ilegal.
Ao financiar produtores rurais, os bancos serão obrigados a checar tal sistema.
(Felipe Seligman, Folha de São Paulo, 12/02/2008)