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passivos do agronegócio trabalho escravo direitos indígenas
2008-02-11

Mais da metade dos resgatados de condições análogas à escravidão em 2007 trabalhava no cultivo de cana. Foram 2.947 pessoas retiradas dessa situação em apenas quatro usinas. As fiscalizações nessas propriedades lideram a lista das maiores libertações do ano recordista em número de libertações: 5.877 trabalhadores em 197 fazendas.

Lidera o triste ranking de maiores libertações de 2007 - e também da história do grupo móvel de fiscalização - a fazenda e usina Pagrisa, localizada em Ulianópolis (PA), que foi flagrada submetendo 1.064 pessoas à escravidão.

O segundo maior resgate ocorreu na fazenda Debrasa, unidade da Companhia Brasileira de Açúcar e Álcool (CBAA) em Brasilândia (MS), onde 1.011 indígenas estavam alojados em condições precárias. No início da fiscalização, o MTE havia divulgado que o número de resgatados era de 831, mas no decorrer da operação foram encontrados mais trabalhadores na mesma situação.

Dados do MTE não seguem a distinção entre trabalho análogo ao de escravo e degradante, pois o órgão classifica a infração de acordo com o artigo 149 do Código Penal, em que o trabalho degradante é considerado uma forma de trabalho escravo.

Foi também no Mato Grosso do Sul, no município de Iguatemi, que se deu a terceira maior libertação do ano, na Destilaria Centro Oeste Iguatemi Ltda (Dcoil) quando 498 pessoas foram resgatadas. Um terço desse grupo era de indígenas. A quarta usina é a Coruripe de Açúcar e Álcool, que fica em Iturama (MG). Ela tinha peões terceirizados que trabalhavam em condições degradantes nas plantações de cana. O MTE, porém, considerou a terceirização ilegal e responsabiliza a empresa pela situação encontrada.

Sem emprego
Para o Coordenador do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) no Mato Grosso do Sul, Egon Heck, as condições em que foram encontrados os trabalhadores indígenas nas duas fazendas do estado não fogem muito da situação dos outros cerca de dez mil que trabalham no cultivo da cana.

"Há algumas condições que são melhores, mas o esquema do índio trabalhar por produção, de ter que colher 12 toneladas de cana por dia, invalidando a pessoa para o trabalho em 10 ou 12 anos, já é um trabalho desumano", afirma.

Com dificuldades para arrumar emprego, muitos índios da região não vêem outra alternativa que não seja a cana. "O trabalho que faziam anteriormente, na agricultura, de derrubada nas fazendas, de coleta de erva-mate, desapareceram", explica Egon.

Expansão agrícola
Três dos quatro maiores resgates de trabalhadores ocorreram na área de expansão da cana-de-açúcar, em municípios que fazem fronteira ou estão próximos ao estado de São Paulo.

"A SIT [Secretaria de Inspeção do Trabalho] já emitiu uma notificação preventiva para todas as usinas de álcool, dizendo o que elas têm que cumprir para que não encontremos mais trabalho degradante ou escravo. Ninguém poderá dizer que foi pego de surpresa neste ano.", avisa Marcelo Campos, coordenador nacional dos grupos móveis de fiscalização, confirmando informação dada pela secretária Ruth Vilela em matéria sobre as expectativas de 2008.

O chefe dos grupos móveis também relata que, no final de 2007, houve uma reunião com as Superintendências Regionais do Trabalho (SRTs - antigas Delegacias Regionais do Trabalho) com o objetivo de definir parâmetros comuns para a fiscalização de trabalho escravo e degradante.

De acordo com Marcelo, algumas SRTs, como a do interior paulista, agiam de forma diferente do grupo móvel nacional, em que o padrão de conduta em flagrantes de trabalho degradante é rescindir o contrato do empregador com os trabalhadores, oferecendo-lhes inclusive seguro-desemprego. "No método que São Paulo vinha utilizando, eles não concluíam pela retirada dos trabalhadores".

Com a uniformidade de tratamento desses casos, a tendência é um crescimento nas estatísticas de trabalho análogo ao de escravo no estado de São Paulo, pois em muitos casos o tratamento dispensado às pessoas que trabalham nos canaviais paulistas não é tão diferente do que recebiam os resgatados em Minas Gerais ou no Mato Grosso do Sul.

Denúncias
Apesar do número de libertados ter aumentado, estatísticas de 2007 divulgadas pela Comissão Pastoral da Terra (CPT) revelam que as denúncias de trabalho escravo têm se mantido estáveis. Foram 264 no ano passado, 265 no ano anterior e 278 em 2005.

De acordo com Xavier Plassat, coordenador da campanha nacional da CPT contra o trabalho escravo, há estabilidade nos números, mas o perfil das denúncias têm mudado, principalmente na Região Norte. "Se você fizer um cálculo do número de trabalhadores por denúncia, vai ver que no Norte são 20 ou 25 pessoas. São casos relativamente pequenos se compararmos com o passado, quando havia centenas de pessoas libertadas nas fiscalizações da região", afirma.

Números estaduais
As duas libertações ocorridas no Mato Grosso do Sul fizeram com que o estado subisse na lista de unidades da federação que têm mais problemas com trabalho escravo. Hoje, ele é o sexto estado com maior número de libertações, precedido pelo Tocantins, Bahia, Maranhão, Mato Grosso e Pará.

Outra mudança observada em 2007 foi no estado vizinho do Mato Grosso, onde apenas 112 pessoas foram libertadas durante o ano. O número é o menor desde 1995, quando o grupo móvel começou suas fiscalizações.

Para Xavier, isso não representa a realidade vivida pelo estado. "A situação do Mato Grosso é muito pior do que isso. Houve poucas denúncias no estado, e lá há pouca capilaridade do movimento social, além de existirem estratégias do empregador para inibir as denúncias.", explica.

(Por Iberê Thenório, Cimi, Amazonia.Org, 08/02/2008)


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