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direitos indígenas desmatamento
2008-02-07
Os indígenas do Mato Grosso do Sul não se parecem com as tribos retratadas pelo cinema, vestidas com trajes típicos e vivendo em suas ocas na selva amazônica. Porém, alguns de seus problemas são semelhantes e inclusive mais graves. Entre eles se destacam a falta de terras para cultivo e a destruição do meio ambiente. Os poucos que desfrutam de algumas florestas sofrem a ameaça de perdê-las. É o caso dos que vivem no Pantanal Matogrossense, um ecossistema úmido cuja preservação é uma das maiores preocupações nacionais, embora atualmente a atenção se concentre na Amazônia.

Florestas da área de assentamento dos indígenas kadiweu são cortadas para atender a crescente demanda do pólo siderúrgico instalado na cidade de Corumbá, no coração do Pantanal, denunciou ao Terramérica o presidente da organização não-governamental Ecologia e Ação, Alessandro Menezes. A companhia MMX, que desde 2007 produz aço e ferro-gusa em Corumbá, já sofreu uma interdição por usar carvão ilegal e continua operando graças a uma liminar. As autoridades ambientais apreenderam, por duas vezes, carvão procedente de florestas nativas e destinado à siderúrgica. Antes de instalar-se, a MMX assinou com a promotoria e o governo do Estado um compromisso de que iria adquirir carvão apenas de áreas reflorestadas. Por violar várias vezes o acordo, recebeu multa de R$ 1 milhão.

A demanda do pólo siderúrgico de Corumbá, que reúne outras quatro grandes empresas, supera amplamente o carvão vegetal que se possa produzir por projetos de reflorestamento próximos, segundo Sonia Hess, professora da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul. Assim, cerca de 3,5 mil toneladas de árvores nativas são convertidas em carvão diariamente. Além disso, as autoridades ambientais garantem que florestas nativas matogrossenses também abastecem siderúrgicas do vizinho Estado de Minas Gerais.

Esse setor industrial já é conhecido por ter devastado extensas florestas em Minas Gerais e de repetir o dano na Amazônia oriental, após a exploração das imensas reservas de minério de ferro da Serra de Carajás, no Pará. As carvoarias aproveitam que parte do território kadiweu “está em litígio, ainda ocupado por fazendeiros”, apesar de seu reconhecimento como terra indígena, explicou Menezes. Também estão ameaçadas áreas de outro povo autóctone do Pantanal, o terena, acrescentou.

Em Taunay, uma das áreas dos terena, o desmatamento se acelerou nos últimos tempos, diante da possibilidade futura de sua demarcação e entrega da posse indígena, disse Lisio Lili, membro dessa comunidade que foi dirigente local da Fundação Nacional do Índio (Funai). Carvão e pecuária são os interesses que cortam a floresta, afirmou. “Estamos fazendo um mapa dos povos indígenas do Pantanal”, para recolher sua memória e a realidade dessas comunidades, além de conhecer suas perspectivas futuras, em termos de ameaças, como o desmatamento e o avanço de monoculturas, além de possível desenvolvimento produtivo e educacional, informou ao Terramérica. Os ambientalistas “são nossos aliados”, destacou. A defesa do Pantanal é parte das prioridades governamentais.

Essa área úmida, que se estende até a Bolívia e o Paraguai, concentra uma enorme biodiversidade e constitui uma grande atração ecoturística. Nos anos 80, houve campanhas internacionais para proteger sua fauna, especialmente os jacarés (Caiman yacare) que eram sacrificados em grande número para exportação de seu couro. Esta fauna também está ameaçada pela hidrovia dos rios Paraguai e Paraná e pela expansão de monoculturas como soja e cana-de-açúcar, disse Menezes. Ampliar a hidrovia, cada dia mais importante para a exportação de produtos siderúrgicos e agrícolas através do Paraguai para chegar ao Rio da Prata, exige obras que podem alterar o fluxo da bacia e desequilibrar o ecossistema do Pantanal, temem os ambientalistas.

Em outras partes do Mato Grosso do Sul, que concentra a segunda maior população indígena por Estado do país, depois do Amazonas, os problemas são diferentes. Os guaranis, que somam 60% dos quase 65 mil indígenas que ali vivem, lutam desesperadamente para ampliar suas terras, embora totalmente desmatadas. Ao contrário dos kadiweu, cujos cerca de dois mil membros contam com uma reserva de 538.536 hectares, os guaranis – especialmente do seu ramo kaiowá, a mais numerosa no Mato Grosso do Sul – vivem em “confinamento”, segundo os antropólogos. Em Dourados, município rico em agricultura, mais de 12 mil indígenas vivem em apenas 3,5 mil hectares, e, além disso, sem florestas, o que contrasta com um povo de tradições florestais e nômade. Como a terra é insuficiente para sua subsistência, muitos trabalham como assalariados, principalmente cortando cana-de-açúcar. Essas são algumas das razões às quais se atribui os numerosos assassinatos e suicídios que ocorrem entre os kaiowá.

(Por Mario Osava *, IPS, Envolverde, 06/02/2008)
* O autor é correspondente da IPS.

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