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impactos mudança climática
2008-02-01

Eric Schmitt passou da euforia ao medo quando percebeu a transcendência de sua descoberta. Foi em setembro de 2005. O explorador da Universidade de Berkeley (Califórnia), de 60 anos, encontrou uma nova ilha a 640 km do Círculo Polar Ártico, na fria Groenlândia. O pedaço de terra sempre esteve lá, mas o gelo glacial o havia mantido unido ao litoral, fazendo-o passar despercebido durante séculos. Daí Schmitt percebeu como sua descoberta era preocupante: era a prova evidente dos estragos da mudança climática no planeta.

Mas de tudo se pode tirar um benefício. A história da ilha do Aquecimento (Warming Island em inglês e Uunartoq Qeqertoq em esquimó) se transformou rapidamente em um símbolo da mudança climática e também em um destino turístico. A empresa californiana Betchart Expeditions soube perceber isso e desde então organiza viagens de barco à ilhota por um preço que varia de 3.700 a 5.100 euros.

A diminuição generalizada das geleiras e das calotas polares e o aumento da temperatura da superfície oceânica contribuíram para elevações do nível do mar e novas reações biológicas nos ecossistemas e nas espécies. O turismo tenta se adaptar a esse novo contexto. Por enquanto as conseqüências do aquecimento sobre essa fonte de riqueza ocupam centenas de páginas nos últimos relatórios sobre o assunto. A última cúpula ministerial sobre turismo e mudança climática (em 13 de novembro de 2007 em Londres) reuniu algumas mensagens alarmantes, sobretudo para os países que são destinos turísticos: "É muito provável que as condições climatológicas que atraem o turismo se desloquem para latitudes e altitudes superiores. Desse modo, está previsto que algumas regiões turísticas populares percam posição competitiva (por exemplo, o Mediterrâneo no verão)".

  
Iceberg flutua na Groenlândia, região que sofreu processo de degelo nos últimos séculos

Enquanto essas previsões se cumprem, o norte começou a se adaptar ao novo fenômeno. Javier Gálvez viu um bosque de pinheiros surgir na frente de sua casa em Qassiarsuk, ao sul da Groenlândia, em pouco mais de cinco anos. Esse prodígio, atribuído pelos cientistas ao aquecimento, não só transformou a monótona paisagem de neves eternas que ele contemplava de suas janelas como também o transformou em um empresário mais próspero. Gálvez é dono da Tasermuit, uma pequena agência que organiza viagens para expedições científicas à Groenlândia e aventuras de caiaque e trekking para turistas espanhóis.

Com o degelo, passou de atender apenas 200 viajantes por ano para mais de 400 em 2007. Esse jovem empresário atribui o sucesso da Groenlândia como destino turístico à mudança climática: "As pessoas vêm para comprovar se realmente ocorre o que estão vendo constantemente nos telejornais", ele diz. E conseguem? "Sim e não", responde o empresário em um dos postos da Feira Internacional de Turismo (Fitur). "Não podem detectar as ranhuras que indicam onde estava a geleira cem anos atrás. Mas vêem como o degelo avançou, como é difícil avistar baleias -que se deslocaram para as águas geladas ao norte da ilha- ou como o lagostim da Groenlândia fugiu em busca de mares mais frios, e em vez dele se come bacalhau."

Os guias da Tasermuit se especializaram em explicar aos viajantes as conseqüências da mudança climática. "É o que o turista pede", diz Gálvez, que também anima os espanhóis a conviver com a população local porque é outra prova viva da transformação causada pelo aquecimento. "Estão semi-arruinados. Quase não têm caça e carecem de alternativas. São populações desorientadas." Quando voltam à Espanha, os espanhóis têm a sensação de que vai demorar 50 ou 300 anos, segundo o organizador das viagens, mas a Groenlândia está acabando.

Mentes semelhantes organizaram excursões à geleira Perito Moreno, na Argentina, para observar como o gelo despenca no oceano, e como os fiordes noruegueses desaparecem pouco a pouco. Na Finlândia a neve derretida abriu caminhos onde antes só havia gelo, e as principais agências de turismo finlandesas começaram a substituir os motoesquis pelos ônibus. Estão satisfeitas com a força de seus negócios: os invernos mais suaves e curtos incrementam o turismo.

O mesmo ocorre na Noruega, onde as empresas do setor mudaram sua oferta de passeios a pé pelas geleiras e os substituíram por expedições em botes. "Temos de ser rápidos. A situação não é dramática, mas sim preocupante. Em nosso país a mudança climática é um fenômeno do qual ninguém duvida. Se não nos prepararmos para o futuro ficaremos para trás antes do que pensamos", indica Helen Siverstol no estande da empresa Fjord Norway. Uma colega, Goril Ovesen, da empresa Troms, diz que nas encostas de algumas montanhas norueguesas se vêem árvores onde antes não havia. "Isso é aterrorizante, porque quer dizer que talvez em alguns anos deixe de nevar no cume", comenta. Com menos neve, mais cânions. A artificial substituirá em grande medida a subida da cota de neve, mas as previsões da Organização Mundial do Turismo para algumas áreas de esqui tradicionais como os Alpes são muito claras: menos turistas deslizando pelas pistas.

Na Espanha, o êxito turístico dos países do norte começa a ser notado por alguns. As ilhas Canárias sofrem com a bonança meteorológica das até agora congeladas capitais do centro e norte da Europa: os europeus vêm menos e por períodos mais curtos.

Raquel Ceca, da Tenerife Golf, aponta que só aumentou o número de excursionistas para as belas localidades do norte de Tenerife: La Orotava, La Laguna... Mas para as demais há poucos. No departamento de pesquisa da Corporação Turismo de Tenerife indicam que o número de visitantes estrangeiros diminuiu 2,1% em 2007 (até novembro, último mês com dados disponíveis da Aena), e que os britânicos, retidos no Reino Unido pela melhora generalizada de suas temperaturas, são o grupo turístico cuja mudança de hábito é mais notada nas Canárias.

As estações de esqui também clamam contra o efeito estufa. Em La Pinilla (Segóvia) só permanecem abertas (em 30 de janeiro) as três pistas de iniciantes, quando o habitual era a subida livre. Essa indiferença dos esquiadores prejudica as populações das proximidades. O comércio reflete na contabilidade o menor movimento de visitantes. Em um plano mais modesto, nem Hontanares nem El Espinars recebem tantas famílias para passar o domingo. A secura do terreno e a perigosa palha acumulada pela falta de chuva erradicaram dos costumes familiares o popular churrasco na montanha, proibido até em tempos de romaria.

As previsões indicam que a coisa não será melhor no litoral. Segundo o Ministério do Meio Ambiente, o aumento do nível do mar comerá 15 metros de praia em média na Espanha até 2050. La Albufera de Valência, Doñana, a Costa Brava, a Manga del Mar Menor serão as áreas mais ameaçadas. Todas as recomendações vão no mesmo sentido: afastar já as construções junto ao litoral diante da subida do mar, a um ritmo de 2,5 milímetros por ano.

Tudo isso incidirá negativamente em um turismo que já diminui, segundo as últimas estimativas, apesar de continuar sendo uma potência mundial, com 60 milhões de turistas, perdendo só para a França, destes, 46% chegam à Espanha nos meses de verão, por isso a solução seria dessazonalizar o turismo. Para tanto o governo destinará cerca de 50 milhões de euros em 2008, com os quais se pretende promover os recursos naturais, culturais e gastronômicos dos destinos que estejam desligados da oferta de verão.

Esses serão (já estão sendo) os efeitos diretos da mudança climática para o turismo. Mas suas conseqüências vão muito além. O relatório da Organização Mundial do Turismo também aponta que a luta contra o aquecimento global do planeta obrigará os governos a tomar medidas que obriguem a reduzir as emissões de gases do efeito estufa. Algumas delas poderão agir sobre os custos do transporte. O mais afetado poderia ser o avião, um dos meios mais poluidores que existem e, por extensão, os destinos longínquos. Países da Ásia meridional, a Austrália, Nova Zelândia e Caribe se mostraram muito preocupados com a possibilidade de que as políticas de redução do aquecimento incidam sobre sua economia nacional. Não por acaso, os turistas de países temperados como os da Europa setentrional são os que fazem mais deslocamentos internacionais. As mudanças poderão, sempre segundo o relatório da OMT, levá-los a "passar mais tempo de férias em seu país de residência e adaptar suas pautas de viagem para aproveitar as novas oportunidades oferecidas pelos destinos mais próximos".

A nova duração e qualidade das estações turísticas em conseqüência do clima (no caso por exemplo do turismo de sol e praia ou das férias concentradas nos esportes de inverno) "poderão incidir decisivamente na concorrência entre destinos, e portanto na rentabilidade das empresas turísticas", explica o estudo, que prevê uma menor capacidade de adaptação dos provedores de serviços turísticos e das operadoras radicadas em destinos concretos.

Até aqui vão os efeitos do aquecimento sobre o turismo. Cabe se perguntar se o setor também é causa e se está ajudando a reduzir a cota de gases que lhe cabe. Quanto ao primeiro, a OMT calcula em 5% sua contribuição para as emissões mundiais, depois de somar os efeitos negativos do deslocamento de milhares de turistas, a hospedagem e as atividades a que se dedicam no tempo livre. Sobre o segundo, isto é, como as empresas do setor podem colaborar, uma representante da companhia aérea de baixo custo Norwegian Air opina: "Emitindo menos, é claro. E isso só pode ser feito com aviões mais limpos. Nós substituímos alguns dos velhos Boeings por novos 737-800, que economizam entre 20% e 30% das emissões e que constituirão o total de nossa frota em 2014".

O aumento das temperaturas está fazendo todas as companhias pensarem rapidamente. O sucesso futuro dependerá de como o aquecimento evoluirá nos próximos anos, mas também de quem será mais rápido para se adaptar às novas situações. Enquanto isso acontece, os países ou regiões que, por sua inospitalidade, nunca haviam sido apreciados por turistas agora vivem seu minuto de glória como símbolos palpáveis de um fenômeno em que alguns não acreditavam.

(Por J. Prades e Á. de Cózar, El País, Tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves, UOL, 01/02/2008)

 


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