As histórias de vida e de resistência das mulheres quilombolas e indígenas do Estado farão parte da programação do Fórum Social Mundial nesta quinta-feira (24). Através do Fórum de Mulheres do Espírito Santo, será realizada a oficina "Mulheres e Desenvolvimento" e lançada a cartilha "Mulheres e Eucalipto: histórias de vida e resistência".
A cartilha foi publicada pelo Movimento Mundial Pelas Florestas Tropicais (WRM). O lançamento será realizado as 14h, no auditório do Sindibancários, com a presença da Comissão de Mulheres Indígenas, Comissão Quilombola, Movimento Sem Terra (MST) e Movimento das Mulheres Camponesas (MMC), que participarão do debate sobre a questão das mulheres e a monocultura do eucalipto.
A cartilha retrata os impactos da monocultura do eucalipto na vida das mulheres indígenas e quilombolas do Estado e foi escrita por Gilsa Helena Barcellos e Simone Batista Ferreira.
O documento traz denuncias de mulheres com problemas em comum, entre eles os decorrentes da degradação ambiental e da miséria produzida pelo projeto agroidustrial da Aracruz Celulose, além de contar episódios de luta dessas mulheres.
Uma marcha de mais de 700 pessoas, a maioria mulheres, teve lugar no município de São Mateus com o objetivo de impedir o tráfego de caminhões que transportavam eucalipto para a Aracruz Celulose. Essa marcha está descrita na cartilha. Foi ela uma forma de sensibilizar a opinião pública brasileira para a gravidade da ampliação de plantios homogêneos, em larga escala, sobre terras brasileiras.
Tanto as mulheres indígenas quanto as quilombolas e muitas camponesas vivem no norte do Estado, onde se concentra grande parte da monocultura do eucalipto da Aracruz Celulose. Ao todo, 70% do município de Conceição da Barra, segundo a cartilha, estão tomados por está atividade. Já nos municípios de São Mateus e Aracruz a informação é de que 50% de cada uym deles está tomado por eucalipto.
Segundo as mulheres retratadas na cartilha, esse domínio da monocultura nestas regiões causa alterações bruscas de temperatura, o desaparecimento da cobertura vegetal nativa, o ressecamento de fontes hídricas, a poluição e a diminuição do fluxo de água nos rios, o enfraquecimento do solo.
Nas regiões mais atingidas pelo monocultivo, têm surgido vários casos de alergia e doenças de pele, devido ao alto uso de agrotóxico pelas empresas. Há ainda o agravamento da pobreza e do desemprego, motivo pelo qual essas populações têm convivido com o crescimento da violência e do êxodo rural.
A destruição de ecossistemas pela ação de grandes projetos agroindustriais, em especial, tem levado populações indígenas, quilombolas e camponesas, as mais afetadas, a conviverem com mudanças drásticas no seu ambiente e a experimentarem perdas materiais e simbólicas das mais diversas. No caso específico das mulheres, elas têm vivenciado profundas mudanças na divisão do trabalho, nos papéis que desempenham na família e na comunidade, intensificando, ainda mais, a sua condição de subordinadas.
Essa situação se agrava ainda mais quando populações locais, que dependem dos ecossistemas para a sua subsistência, têm que disputá-los com o agronegócio.
"É, meus primos. Quando a Aracruz chegou aqui e botou eles pra fora... ela chegou invadindo. Quando ela chegou, eles ficaram com medo e largaram a terra deles e foram embora. Ela chegou com um monte de tratô e passou em cima das casinhas deles. As casinhas era de palha, barreada, que eles morava. Aí, tem os meus primos que têm vontade de retornar pra dentro da aldeia de novo", diz o depoimento de Maria Loureiro, da aldeia Tupinikim Irajá para a Cartilha da WRM.
Além da perda do território, essas populações tiveram que conviver, nesses últimos anos, com perdas culturais e ambientais, que geraram um alto grau de desorganização social e de identidade. Hoje, o Espírito Santo tem cerca de 200 mil hectares de eucalipto.
Atualmente, o Brasil possui 5,3 milhões de hectares de plantios homogêneos de árvores, 21,6 milhões de hectares de plantio de soja e 5,8 milhões de hectares de cana-de-açúcar.
Segundo a cartilha, no caso dos plantios homogêneos o governo brasileiro, buscando aumentar a exportação de celulose e madeira, projetou, para o ano de 2010, a meta de mais 5 milhões de hectares. O Espírito Santo entrará com uma cota de 600 mil hectares.
(Por Flávia Bernardes,
Século Diário, 24/01/2008)