Organizações criticam falta de transparência no processo de escolha de doze novos delegados do órgão responsável por decidir sobre a liberação comercial dos transgênicos no Brasil. Carta aberta pede que MCT evite o conflito de interesses na Comissão.
RIO DE JANEIRO – Doze delegados que compõem a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) terminaram seus mandatos no fim do ano passado e, de acordo com a lei, devem ser substituídos antes da primeira reunião do colegiado em 2008, prevista para os dias 20 e 21 de fevereiro. Como tudo o que acontece no órgão responsável por decidir sobre a liberação comercial dos transgênicos no Brasil, entretanto, esse processo de indicação, coordenado pelo Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), já é alvo de intensa disputa política entre os setores “pró” e “contra” os transgênicos.
A escolha dos 24 novos integrantes da CTNBio (serão nomeados também 12 suplentes) será realizada pelo MCT a partir de listas tríplices elaboradas por uma Comissão ad hoc constituída pelo próprio ministério. Os nomes que compõem as listas foram decididos em uma reunião realizada no dia 16 de janeiro e, em seguida, encaminhados ao ministro Sérgio Rezende, que ainda não se manifestou.
A falta de transparência e de participação social no processo de escolha dos indicados, no entanto, faz com que diversas organizações do movimento socioambientalista exijam que não se repita o ocorrido nas indicações anteriores, quando, segundo elas, foi dada preferência a especialistas ligados à indústria da biotecnologia e claramente favoráveis à introdução facilitada dos transgênicos no Brasil.
Em carta aberta enviada esta semana ao MCT, à Comissão ad hoc formada pelo ministério, à Academia Brasileira de Ciência e à Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), as organizações dos movimentos sociais exigem que “os critérios a serem adotados na seleção dos nomes evitem casos de conflitos de interesses na CTNBio” e pedem que seja “levada em consideração a necessidade de indicações que contemplem todas as áreas de atuação previstas em lei (saúde humana, saúde animal, vegetal e ambiental)”.
Para o agrônomo Gabriel Fernandes, que é dirigente da Campanha por um Brasil Livre de Transgênicos, velhos vícios estão se repetindo: “Os assessores do MCT dizem que chegaram ao ministério cerca de 150 currículos. Mas, a questão é saber como, e a partir de que método, estes currículos chegaram ao MCT. Não houve, mais uma vez, um amplo e transparente processo de consultas, como deveria ter sido feito, para que cada setor pudesse indicar seus representantes de forma democrática”, diz.
Segundo a carta aberta divulgada pelas organizações da sociedade civil, “a CTNBio, nestes dois anos, não observou adequadamente a questão dos conflitos de interesse. Vários membros da Comissão, que atuam em pesquisas de desenvolvimento comercial de organismos transgênicos ou mesmo que atuam em projetos financiados por empresas de biotecnologia, participaram da análise de processos de liberação comercial de transgênicos”, acusa o documento.
Falsos especialistasOutro questionamento feito na carta diz que “nenhum dos especialistas em Meio Ambiente indicados anteriormente pelo Ministério da Ciência e Tecnologia tem notório saber científico e efetivo saber profissional na área ambiental, conforme exige a Lei de Biossegurança (artigo 11, inciso I)”.
“Esperamos não ter de ver em 2008, mais uma vez, bioquímicos ou farmacêuticos atuando e votando como especialistas em meio ambiente na CTNBio”, afirma Fernandes. Na carta enviada ao MCT, as organizações reclamam que a pressão do setor de biotecnologia faz com que sejam preteridos na formação dos quadros da CTNBio os especialistas ligados à biossegurança: “A falta desses cientistas, certamente, compromete a avaliação de riscos ambientais”, conclui o documento.
Assinam a carta aberta as organizações Via Campesina, MST, Comissão Pastoral da Terra (CPT), Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais para o Meio Ambiente (FBOMS), Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), Assessoria e Serviços a Projetos em Agricultura Alternativa (AS-PTA), Terra de Direitos, Associação de Agricultura Orgânica (AAO), Articulação Nacional da Agroecologia (ANA), Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC), Fórum Nacional das Entidades Civis de Defesa do Consumidor, Greenpeace, Instituto Socioambiental (ISA) e Movimento de Mulheres Camponesas (MMC).
(Por Maurício Thuswohl,
Agência Carta Maior, 22/01/2008)