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2008-01-23

Em entrevista exclusiva, o secretário-geral da Opep, Abdalla Salem El-Badri, discute os perigos de um aumento mais dramático no preço do petróleo, as falhas das empresas multinacionais e as considerações dentro do cartel de nações exportadoraspara negociar em euros em vez de dólares

Spiegel - Senhor secretário-geral, o preço do barril de petróleo cru atingiu a marca de US$ 100 pela primeira vez no início de janeiro. Enquanto os consumidores sentem o peso, os produtores estão ocupados enchendo seus bolsos. Houve celebração na Opep naquele dia?
El-Badri -
Não, por que haveria? Estamos interessados em preços razoáveis. Queremos estabilidade. Além disso, o preço médio por barril foi de US$ 69 no ano passado. Apenas uma pequena quantia de petróleo foi negociada acima de US$ 100 e somente por um curto prazo. É um jogo. Foi um único comerciante que calculou mal e perdeu dinheiro como resultado.

Spiegel - Agora o senhor esta minimizando um desdobramento dramático que deixou o mundo todo profundamente preocupado. O preço de petróleo quadruplicou em quatro anos e no ano passado subiu alarmantes 57%. Os especialistas do Instituto Alemão de Pesquisa Econômica acreditam que é provável um aumento de preço para US$ 200 em 10 anos. O senhor discorda?
El-Badri -
O preço de petróleo deve se basear inicialmente em oferta e demanda. Se for esse o caso, o aumento para US$ 200 é altamente improvável. Mas quando outros fatores têm um papel, como especuladores ou fatores geopolíticos...

Spiegel -... em outras palavras, guerras em países produtores ou o tipo de inquietação que atualmente acontece na Nigéria...
El-Badri
- ... essa é sua interpretação. Nós também temos a queda do valor do dólar contra o euro, assim como os gargalos finais no refinamento de petróleo nos EUA. Dessa forma, pode-se ver qualquer preço.

Spiegel - Muitos especialistas já acreditam que o atual nível é perigoso e temem uma recessão mundial. Durante uma visita a Riad, o presidente americano George W. Bush fez uma reprimenda à Opep e pediu à organização que fizesse algo sobre os atuais preços recordes. A gasolina cara, disse ele, está atingindo as "famílias americanas onde dói".
El-Badri -
Se houver uma recessão, não será por causa do preço do petróleo. Será causada pela crise das hipotecas nos EUA e outros problemas do mercado financeiro.

Spiegel - Certamente é um fator importante, junto do petróleo. Ainda assim, a Opep foi acusada de promover os preços. O senhor não acha que US$ 100 por barril prejudica a reputação da Opep?
El-Badri -
Por que deveria? Tenho uma proposta: nós da Opep damos a vocês a renda de nossas exportações de petróleo e vocês nos dão em troca o dinheiro dos impostos que vocês tiram de produtos do petróleo. Seria um acordo justo, certo?

Spiegel - Não podemos fazer isso. Mas também não estamos inteiramente certos que os ministros de finanças das maiores nações consumidoras estariam interessados nesse tipo de acordo.
El-Badri -
Você vê? Para muitos de nossos países membros, o petróleo é a única fonte de renda, e é por isso que precisamos de um preço justo.

Spiegel - O que isso significa? Há dois anos e meio, conversamos com Adnan Shihab-Eldin, seu predecessor como presidente da Opep. Ele mencionou uma faixa de preço entre US$ 50 e US$ 60. O senhor mesmo disse em novembro que não havia evidências sugerindo que o limite psicológico importante de US$ 100 seria alcançado.
El-Badri -
Não tenho um sentido concreto de meta de preço, nem de uma faixa específica. Nós da Opep não queremos extremos, preços altos ou baixos demais. O que queremos é um preço estável. Isso beneficiaria os produtores e consumidores. Mas, como eu disse, o mercado determina isso.

Spiegel - Um mercado sobre o qual vocês não têm influência decisiva? A Opep perdeu tanto poder assim? Uma organização temida, que ditava os preços nos anos 70 e 80 e até usou o petróleo como arma política -durante a guerra do Yom Kippur, por exemplo?
El-Badri -
Apenas ditamos as coisas por um curto período de tempo em nossa história. Esses dias se foram há muito. Os países que pertencem à Opep atualmente fornecem cerca de 40% do petróleo consumido no mundo. Não se pode exatamente dizer que realmente controlamos o mercado.

Spiegel - Mas a Opep pode exercer influência importante cortando ou expandindo o volume de produção.
El-Badri -
Isso é verdade, e fazemos isso da forma que julgamos correta. No início de 2004, aumentamos a produção por quase 5 milhões de barris por dia até o final de 2006. Depois, reduzimos a produção em 1,7 milhões de barris, quando sentimos que o preço estava baixo demais. Foi uma decisão muito boa, no que concerne a Opep.

Spiegel - Alguns especialistas duvidam que a Opep ainda possa expandir o volume de produção para um grau significativo. Esses especialistas dizem que a Arábia Saudita, por exemplo -o único superpoder do mundo- já está colocando pressão demais em seus campos de petróleo hoje e que as reservas em geral são menores do que se imaginava.
El-Badri -
Não se preocupe, ainda temos capacidade. Atualmente, somos capazes de aumentar a produção em 35 milhões de barris. E também investimos em novos projetos a um custo total de US$ 150 bilhões até 2012, que nos darão capacidade adicional de 6 milhões de barris em quatro anos. Entretanto, temos que saber qual vai ser a demanda de petróleo no futuro, para que possamos planejar nossos investimentos de acordo.

Spiegel - O senhor não pode negar que as reservas são finitas. Já atingimos o "pico do petróleo" -o nível máximo de produção que pode ser alcançado antes das reservas inevitavelmente começarem a encolher?
El-Badri -
Não, acredito que não. Também não acredito que chegaremos nesse ponto em um futuro próximo.

Spiegel - Especialistas de fora da Opep têm uma opinião menos otimista de nosso futuro energético.
El-Badri -
Talvez. Mas acredito que seus netos ainda terão combustível fóssil suficiente. Haverá um fim ao petróleo, com certeza, porém estou convencido que não será nos próximos 100 anos.

Spiegel - Até mesmo um estudo publicado em nome da Opep conclui que, tão cedo quanto 2024, seu cartel talvez não possa mais cumprir as demandas dos clientes e fornecer tanto petróleo quanto precisam.
El-Badri -
Esse estudo não é nosso, não reflete a visão oficial da Opep. Estou convencido que suas conclusões são erradas. Há petróleo suficiente. E há reservas descobertas suficientes. Nosso verdadeiro problema está na avaliação correta da demanda. Gostaríamos de saber com que velocidade está crescendo.

Spiegel - Isso depende de muitos fatores, incluindo a conservação de energia nas nações industrializadas e a fome de energia de economias emergentes importantes como China e Índia. O senhor tem uma idéia clara do que está acontecendo por aí?
El-Badri -
Visitei a China e conversei com os políticos. Estamos em negociações com a UE e vou visitar o Japão. A coisa mais importante para nós é o diálogo. Os países individuais não nos dão números exatos para o futuro, mas ao menos nos dão alguma indicação de quanto petróleo será necessário.

Spiegel - O senhor pinta um retrato bem otimista. Mas a Opep também não é afetada pelos interesses divergentes de seus membros? Não houve uma disputa substancial em seu último encontro -que deixou o Irã e a Venezuela, com suas idéias sobre preços altos e sua agenda anti-Ocidente, contra os "moderados"?
El-Badri -
Deixamos a política para os países membros individuais. A Opep é uma organização econômica. Além disso, não foi uma briga de verdade. Falamos com uma voz única. Entretanto, tivemos uma discussão animada em novembro sobre se deveríamos mudar a moeda reserva do dólar para o euro. Alguns de nossos Estados membros têm enormes reservas em dólar, enquanto outros vendem em dólares e compram euros.

Spiegel - O senhor é a favor de abandonar a prática de negociar em dólar como a Venezuela e o Irã exigiram?
El-Badri -
Atualmente, o euro é a moeda mais forte do mundo. Uma mudança pode ser feita, mas vai levar um tempo. Foram necessários muitos anos para o dólar se tornar a moeda dominante no ramo. Mas no futuro, não será tão difícil mudar.

Spiegel - Angola e Equador foram aceitos como membros da Opep no ano passado. A Rússia deveria entrar?
El-Badri -
Não batemos na porta de ninguém.

Spiegel - Mas os senhores não gostariam de ver Moscou batendo na sua porta? Com os russos a bordo, com sua enorme capacidade de produção e reservas ainda maiores, a Opep poderia com certeza estabelecer os preços.
El-Badri -
Novamente, não queremos ditar nada.

Spiegel - O presidente (russo) Vladimir Putin certamente pensa de outra forma. No ano passado, ele chamou a idéia de um cartel de gás natural -o segundo mais importante recurso natural, que está ligado ao preço do petróleo- de "muito interessante". Ele já começou a promover o conceito no Irã, Qatar e Argélia. O senhor se preocupa com essa espécie de "contra-Opep" e acha que tem potencial?
El-Badri -
Esse tipo de organização pode ser uma opção no longo prazo, mas os produtores de gás estão presos a acordos de fornecimento por 30 anos -não é como o cru. Nós na Opep não vemos isso como ameaça.

Spiegel - Nos últimos anos, houve uma tendência mundial de re-nacionalização das reservas de energia. Enquanto empresas multinacionais como Exxon, Shell e BP controlavam o mercado há duas décadas, hoje 77% de todas as reservas de petróleo estão nas mãos de empresas nacionais e em muitos casos relativamente ineficientes nos países produtores. Não seria melhor se mais empresas privadas e portanto mais transparentes dominassem o mercado, em vez desses dinossauros estatais?
El-Badri -
As empresas internacionais de petróleo são os verdadeiros dinossauros, não nós da Opep. As multinacionais mudaram sua filosofia nos últimos anos, mas ainda têm um longo caminho pela frente. Elas precisam contratar e treinar mais pessoas locais. E deveriam investir mais na exploração de campos e novas tecnologias. Elas também têm que ser muito gentis como perfil de produção de cada país.

Spiegel - Recentemente o senhor falou contra os biocombustíveis. Por quê?
El-Badri -
Não tenho nada contra os biocombustíveis, ou contra qualquer outra forma de energia alternativa. Tudo o que queria dizer é que não se deve investir em algo que no final não dará resultados, ao menos não em grande escala. Os biocombustíveis não são a salvação. A produção de biocombustível vem à custa de reservas de alimentos e água. Requer terra produtiva preciosa que poderia ser plantada com outros cultivos. No final das contas, o consumidor pagará o preço.

Spiegel - Como o senhor se sente com o ressurgimento internacional de energia nuclear? A energia nuclear deve compor o pacote energético dos países industrializados?
El-Badri -
Desde que se possa garantir a segurança, por que não?

Spiegel - O senhor não está convencido que as usinas atômicas modernas são seguras?
El-Badri -
É uma tecnologia extremamente perigosa. Como vimos em Chernobyl, mesmo um único acidente pode ter conseqüências devastadoras.

Spiegel - Ainda assim, países ricos em recursos naturais, como o Irã e a sua terra natal, Líbia, estão investindo pesado em tecnologia nuclear. Trípoli acaba de encomendar uma usina nuclear aos franceses.
El-Badri -
Antes de essa tecnologia poder beneficiar a Líbia, o país terá que treinar muitos especialistas e requerer bastante transferência de tecnologia.

Spiegel - O senhor disse recentemente que a Opep está profundamente preocupada com a mudança climática e faz muito para proteger o ambiente. Verdade? Será que não percebemos?
El-Badri -
Estamos reduzindo significativamente a queima do gás resultante da extração do petróleo, tremendamente. Além disso, os líderes dos países da Opep acreditam que também devem investir em tecnologias ambientalmente saudáveis. A Arábia Saudita, Kuwait, Qatar e Emirados Árabes Unidos concordaram em destinar US$ 750 milhões para um fundo de pesquisa de problemas ambientais. Estou convencido que outros membros seguirão seu exemplo.

Spiegel - Em outras palavras, a iniciativa ambiental não é obrigatória para todos os membros.
El-Badri -
Não, não é. A Arábia Saudita convidou outros membros a contribuírem, mas cabe aos próprios países.

Spiegel - O senhor conhece a Opep há muito tempo e observou a organização de várias perspectivas, inclusive como gerente de empresas privadas e estatais e como ministro de energia. Como o cartel mudou?
El-Badri -
A Opep é a organização mais antiga em operação que consiste exclusivamente de países do Terceiro Mundo. Hoje tem quase 48 anos e membros da África, Ásia e América do Sul. É uma história de sucesso. Está cada vez mais forte, a cada ano. Somos capazes de controlar nossas reservas. A Opep promove segurança energética para todo o mundo e não se limita aos interesses individuais de seus membros.

Spiegel - Como seria o mundo sem a Opep?
El-Badri -
Acho que o mundo é um lugar melhor por causa da Opep. O mundo não seria um lugar tão seguro sem essa organização, porque garantimos um mercado de petróleo estável. Assim, também contribuímos para a estabilidade mundial do lado da energia.

Spiegel - Na última quarta-feira, o presidente Bush praticamente emitiu um ultimato para a Opep aumentar o volume de produção, o que faria os preços caírem. Vocês vão cumprir esse pedido na próxima reunião da Opep?
El-Badri -
Os problemas que estamos vendo atualmente nos EUA não têm nada a ver com a Opep. Já mencionei a crise financeira doméstica. Os americanos também foram descuidados no que concerne ao refinamento de petróleo. Eles investiram pouco em sua capacidade de refinamento nos últimos 30 anos. Eles consomem 21 milhões de barris por dia, mas só podem refinar 17 milhões. Mesmo que mais petróleo entrasse no mercado americano, eles não teriam a capacidade para refiná-lo -e não resolveria o problema do gargalo.

Spiegel - O senhor está dizendo que nenhuma decisão será tomada em Viena na próxima semana?
El-Badri -
Não disse isso. Estamos analisando cuidadosamente o mercado, todos os dias. Se concluirmos que os fundamentos requerem isso, nossos ministros não hesitarão em aumentar a produção. Mas no momento não vemos necessidade disso.

Spiegel - Senhor secretário-geral, agradecemos por esta entrevista.

(Por Erich Follath e Marion Kraske, Der Spiegel,Tradução de Deborah Weinberg, UOL, 21/01/2008)

 


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