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passivos da mineração
2008-01-23

Camponeses do departamento salvadorenho de Cabanas temem que a exploração mineira que possa instalar-se na região consuma 30 mil litros diários de água, procedentes das mesmas fontes que abastecem os moradores apenas uma vez por semana. Ambientalistas e especialistas alertam também para o perigo do cianureto que a empresa canadense Pacific Rim utilizaria para extrair ouro e prata contamine os lençóis aqüíferos e terras da região, se efetivamente começar a exploração, que somente espera pela autorização legal.

Cabanas é o segundo departamento, depois de Morazán, com maior pobreza deste país, onde mais de 55% dos habitantes são pobres. Segundo o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), tem o pior desempenho em desenvolvimento humano, um índice que combina escolaridade, expectativa de vida e renda por pessoa. Miguel Fuentes, camponês de 43 anos, trabalhou aqui toda sua vida, em um terreno equivalente a um quarto de hectare onde planta milho e feijão. Sua casa de barro, madeira, zinco e chão de terra fala da pobreza que vive junto com sua mulher e quatro filhos, um retrato comum em uma região de vocação agropecuária.

Há dois anos, viajou para o Vale de Siria, na vizinha Honduras, onde constatou a contaminação ambiental e as doenças respiratórias e de pele que afeta os moradores vizinhos à mina Entre Mares, a 120 quilômetros de Tegucigalpa. “A exploração mineira não é conveniente em um território tão pequeno e superpovoado, ninguém assume a responsabilidade pelos estragos que deixa”, disse à IPS.

O projeto El Dorado que a Pacific Rim planeja executar nos arredores da comunidade San Isidro, a 65 quilômetros de San Salvador, faz parte das 25 explorações mineiras que são feitas na faixa norte do território em uma cadeia vulcânica rica em metais valiosos. As autorizações de exploração concedidas pelos ministérios da Economia e do Meio Ambiente e Recursos Naturais estão suspensas pela oposição gerada contra a companhia e porque a pasta ambiental deve realizar o Estudo Estratégico Ambiental em matéria de minas, requisito para que o parlamento aprove uma nova lei.

Em El Salvador, de 20 mil quilômetros quadrados e população de 5,9 milhões de habitantes, os dados disponíveis demonstram que a exploração mineira foi historicamente inconsistente. Registros esporádicos indicam que no final do século XIX foram desenvolvidos alguns projetos que anos depois praticamente desapareceram. Em 1940, ressurgiram, mas quase todos terminaram na década de 50. A atividade nunca representou um ítem importante para a economia e, segundo dados do Banco de Reserva de El Salvador, em 2006 apenas contribuiu com US$ 32,7 milhões (incluindo produtos pétreos) para um produto interno bruto que superou os US$ 18,6 bilhões.

Entre 1948 e 1953, a The New York-El Salvador Mining Company explorou El Dorado mas se retirou porque, segundo ambientalistas, a tecnologia disponível naquele momento não permitia extrair o ouro e a prata agora localizados pela Pacific Rim. El Dorado tem 144 quilômetros quadrados. Ali, após a fase de exploração que terminou em 2006 e investimento de US$ 28 milhões, foram detectados, pelo menos, 1,2 milhão de onças de ouro e 7,4 milhões de onças de prata. Luis Tejero, assessor ambiental da Pacific Rim, disse à IPS que de acordo com os preços internacionais cada onça de ouro poderia ser vendida por US$ 700. Além disso, assegurou que a empresa criaria cerca de dois mil empregos diretos e indiretos e pagaria ao Estado até 3% de impostos sobre vendas brutas.

No ano passado, a companhia lançou uma forte campanha publicitária no radio e por meio de “sons moveis”, veículos com alto-falantes que percorreram as comunidades, promovendo a “mineração verde” e distribuindo material escolar, fertilizantes e vacinas para o gado. O assessor reconheceu que o “cianureto é uma substância perigos”, mas “o corpo humano o assimila, ao consumir yuka, uvas e amêndoas, que o contém de forma natural”, ressaltou.

O especialista em hidrologia e geólogo norte-americano Robert Moran, fez em outubro de 2005 uma “revisão técnica” do Estudo de Impacto Ambiental de El Dorado apresentado pela Pacific Rim, na qual criticou o informe por não oferecer todos os dados que permitiram determinar os efeitos da mineração sobre os recursos hídricos. “Nem o público nem os reguladores (Estado) foram adequadamente informados dos possíveis impactos ambientais e sócio-econômicos” na área, disse Moran. “Uma grande porcentagem de mineradoras geram impactos ambientais negativos, que se tornam visíveis muito depois de a mina encerrar” suas operações, alertou o especialista, que fz estudos semelhantes em outros países da América Central.

Francisco Pineda, coordenador da Associação de Amigos de San Isidro-Cabañas, disse que a mineração contaminaria com cianureto e o ácido drenado produzido durante a exploração das mesmas fontes de água que abastecem a maioria das comunidades. “Não nos opomos à atividade, mas aos danos que causa”, afirmou o líder ambientalista, ressaltando, porém, que a “mineração verde não existe, é simplesmente uma campanha publicitária”. A Conferencia Episcopal de El Salvador aderiu à rejeição. Um pronunciamento em maio de 2007 alertava que “a mineração causa danos irreversíveis ao meio ambiente e às comunidades vizinhas”.

Moradores da comunidade San Sebastián, no departamento de La Unión, processaram em 2007 a empresa Commerce Group pela contaminação de vários rios com ferro, cobre e alumínio, produtos da drenagem ácida supostamente provocada por operações de extração em uma mina entre 1950 e 1981. A deputada da esquerdista Frente Farabundo Martí para a Libertação Nacional, Lourdes Palácios, denunciou que a canadense Pacific Rim “negociou” com o direitista Partido de Conciliação Nacional para que apresentasse ao parlamento um projeto de lei criando uma autoridade autônoma encarregada de reger a mineração, tirando essa atribuição dos ministérios.

“A iniciativa do PCN não é mais do que uma lei elaborada pelas companhias de mineração”, afirmou a deputada. A lei não contempla o Estudo Estratégico Ambiental e daria à autoridade autônoma o poder de conceder concessões de mineração que incluem prospecção e exploração por até 46 anos, disse à IPS Ligia Guevara, da coalizão de organizações sociais Mesa Frente à Mineração. Orlando Arévalo, deputado do PCN, reconheceu que seu partido apresentou a iniciativa parlamentar denunciada por Palácios, mas negou que tenha sido redigida pela Pacific Rim. Em sua opinião, a exploração mineira requer três requisitos dos quais El Salvador sofre. “Contexto regulatório claro, um órgão que vigie e faça cumprir a lei e uma classificação das empresas que não cumprirem as normas internacionais. Isto é difícil porque somos vítimas da corrupção”, disse Arévalo, mas reconhecendo não ter solução para combater esse mal.

A Mesa Frente à Mineração apresentou em 2006 uma proposta legislativa para proibir “a mineração metálica por colocar m risco as presentes e futuras gerações, mas a iniciativa foi arquivada, lamentou Palácios. Irene Castillo e Nelson Ventura, lideres ambientais de Cabanas, coincidem que “a vida humana não pode ser vendida por uma miséria, e isso é o que está em jogo com a mineração”, enquanto m suas costas pode-se ler um cartaz onde está escrito “A vida vale mais que o ouro”. (IPS/Envolverde)

(Por Raúl Gutiérrez, IPS, 22/01/2008)


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