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pascua-lama barrick gold passivos da mineração
2008-01-15

Quase dois anos depois de obter a aprovação ambiental do governo chileno, o questionado projeto de exploração de ouro Pascua Lama, da multinacional canadense Barrick Gold Corporation, continua sem data de construção. A mina na Cordilheira dos Andes, entre 4.200 e 5.200 metros acima do nível do mar, possui reservas provadas de 17 milhões de onças de ouro e 689 milhões de onças de prata. O investimento para sua exploração chega a US$ 2,4 bilhões. É o primeiro projeto binacional do mundo, já que 80% da mina está na setentrional região chilena de Atacama e o restante na província argentina de San Juan.

Um aspecto crucial é a definição pelos dois países da divisão dos impostos, já está em vigor um convênio que impede a dupla tributação. Em sua página na Internet, a Barrick Gold informa que “continua avançando no projeto”, mas que para anunciar a construção da mina “ainda falta obter permissões setoriais, especialmente na Argentina, e que os governos dos dois países acertem aspectos tributários”. Em um comunicado divulgado em outubro, a mineradora indicava que “os prazos se mantêm incertos e não dependem da empresa”. A companhia que cuida das relações públicas da Barrick Gold, a Extend Comunicações, não respondeu às perguntas do Terramérica sobre datas e autorizações pendentes.

No dia 15 de fevereiro de 2006, a Comissão Regional do Meio Ambiente (Corema) de Atacama aprovou, com condições, o Estudo de Impacto Ambiental apresentado pela Barrick Gold. Em dezembro, o mesmo fez o governo da província de San Juan. A Corema não aceitou a proposta da empresa de remover três geleiras próximas à mina (Toro I, Toro II e Esperanza), que alimentam o sistema hídrico do Vale do Huasco e permitem a atividade de aproximadamente 70 mil pequenos agricultores. Também exigiu um plano de manejo e controle. Assim, ignorou a oposição de comunidades e organizações ambientalistas dos dois países, que não deixaram de realizar atividades de protesto por considerarem que o projeto resultará em graves conseqüências ambientais e socioculturais.

Lucio Cuenca, diretor do não-governamental Observatório Latino-Americano de Conflitos Ambientais (Olca), disse ao Terramérica que pretende realizar, em fevereiro, um audaz encontro binacional no inóspito setor onde fica a mina. Na Argentina também se discute o anúncio feito em novembro, pelo ex-presidente Nestor Kirchner (2003-2007), de estabelecer em até 10% as retenções sobre as exportações de minérios. Segundo a imprensa, o Chile estaria exigindo que a Barrick Gold pague 80% de seus impostos no país, de acordo com a quantidade de minério que extrair de seu território, fórmula que seria rejeitada pela Argentina, onde seria processada toda a produção.

O argumento argentino seria o de que o eventual dano ambiental e a divisão dos dejetos não respondem à lógica 80/20. Ambientalistas argentinos argumentam que, além de afetar as bacias hídricas, no lado de San Juan ficaria o chamado “dique traseiro” que recebe dejetos de rocha, depois que o mineral é extraído com cianureto. Ramón Rada, secretário-executivo da comissão chilena que administra o Tratado de Mineração binacional, de 1997, negou ao Terramérica que os dois países estejam negociando “taxas” ou “porcentagens” dos impostos. Somente estão sendo analisados “aspectos administrativos e de fiscalização” mais adequados ao “modelo operacional e contratual que utilizarão as empresas que desenvolverão o projeto”, explicou.

Rada citou o artigo sete do Tratado, segundo o qual “as rendas ou ganhos originados na venda ou exportação de mineral extraído do território de uma Parte (...) só poderão ser submetidas a taxação por essa Parte”. A Secretaria de Mineração argentina afirmou que resta “a adaptação aos protocolos que incluem o Tratado, questões muito técnicas e especificamente tributárias” sobre as quais expediu uma proposta em dezembro, que é avaliada por seu par chileno. Porém, há mais entraves. A Barrick Gold mantém um litígio judicial com um engenheiro chileno que a acusa de enganá-lo, ao comprar-lhe por US$ 20 (e não pelo US$ 1 milhão acertado) concessões de exploração limítrofes à mina.

A mina será construída em terrenos que a comunidade indígena diaguita dos Huascoaltinos reivindica como próprios. Em janeiro de 2007, os indígenas denunciaram o Estado chileno na Comissão Interamericana de Direitos Humanos por não proteger seus direitos. Além disso, o Olca espera que o Conselho de Defesa do Estado se pronuncie logo sobre seu pedido de processar a Barrick Gold por crime ambiental. A companhia é acusada de destruir entre 50% e 70% das geleiras durante trabalhos de prospecção e construção de caminhos, deterioração certificada pela governamental Direção Geral de Águas.

O senador do co-governante Partido pela Democracia, Guido Girardi, está convencido de que o projeto vai destruir completamente as geleiras. “O Chile deve ser o único país onde os projetos com informes técnicos negativos são aprovados”, afirmou ao Terramérica. O Olca revelou em dezembro que as autoridades chilenas aprovaram a instalação de 363 torres de alta tensão, para levar eletricidade à jazida, em uma área da central região de Coquimbo, declarada prioritária pelo próprio governo, por ser rica em fauna endêmica.

Na Argentina, a oposição é das Mães Autoconvocadas, da localidade de Jachal, vizinha à mina, associações de produtores de vinho, empresários de turismo de aventura e organizações ambientalistas, entre outros. O defensor do povo desse país, Eduardo Mondino, recomendou a suspensão do projeto, à espera de um plano-piloto de proteção da Biosfera de San Guiillermo, onde fica a mina. Espera-se, também, que a Suprema Corte de Justiça da Argentina se pronuncie sobre um recurso apresentado para tornar efetivo o seguro ambiental estabelecido na lei 25.675 de Meio Ambiente, que não é aplicada por falta de regulamentação, e que afetaria a Barrick Gold.

“Todas estas coisas não detêm necessariamente por si só o projeto, mas geram incerteza. Cada dia que a Barrick Gold adia o início da construção da mina, coloca em jogo sua imagem pública tanto em nível internacional quanto diante de seus acionistas”, afirmou Cuenca. O Olca se preocupa com o precedente que Pascua Lama pode criar para outros projetos beneficiados pelo Tratado de Mineração na alta cordilheira, ”onde nascem as águas”.

(Por Daniela Estrada, com colaboração de Sebastían Lacunza, Envolverde/Terramérica, 14/01/2008)


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