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amazônia
2008-01-15
Jornalistas contam como foram os últimos momentos da vida do líder seringueiro que defendeu a Amazônia com a própria vida

Francisco Alves Mendes Filho, o Chico Mendes, se fosse vivo completaria 64 anos no dia 15 de dezembro.  Ele morreu em uma tocaia aos 44 anos na tarde de 22 de dezembro de 1988.  Sua história de luta pela organização dos seringueiros e preservação da floresta amazônica ficou conhecida por jovens e adultos do mundo inteiro.

Neste 2008 o Acre lembra os vinte anos da morte do homem que foi responsável pela mais eficaz militância ecológica já ocorrida no país, tornando-se símbolo da luta contra a devastação da floresta e conservação do modo de vida dos seus habitantes, fossem índios, seringueiros, ribeirinhos ou pescadores.

Mesmo depois de 20 anos, o brasileiro não fala em preservação do meio ambiente sem lembrar do nome de "Chico Mendes".  Os jovens da atual geração não o conheceram, mas aprenderam a admirá-lo e respeitá-lo como um herói.  Muitos livros foram escritos sobre a sua luta e os momentos que antecederam sua morte.

Na obra "Terra: Sonho, Suor e Sangue", escrita pelo jornalista, Cezar Negreiros, o também jornalista Francisco Dandão faz uma narrativa dos fatos e convida o leitor para uma viagem no tempo.  Na forma de expressão do autor, quem lê passa a observar as últimas cenas da vida do líder e a ação covarde de seus algozes como se estivesse presente ao local.

"... Faltavam três dias para o Natal de 1988.  Um sol de intenso rubor, com um brilho próprio de verão amazônico, recolhia os últimos raios de um outro entardecer.  O palco era parecido com aquele das ações de anos atrás.  Comerciantes voltavam os olhos para todas as direções, na esperança de fisgar algum cliente antes de encerrar as portas após mais um dia de nenhum movimento.  Donas de casa submetiam-se a sua dose diária de hipnose, frente a uma novela global qualquer.  Adolescentes pedalavam bicicletas indolentemente.  Tudo como todo dia.  Nada, mas nada mesmo, indicava que Xapuri estava tão próxima de sair do anonimato para virar o centro do mundo...".

E segue a narrativa: "Numa residência humilde, construída com madeira tosca, um homem de estatura mediana, meio gorducho, cabelos lisos e desalinhados, olhos levemente saltados, queixo pequeno e fatos bigodes grisalhos descia as escadas de uma porta de fundos para tomar banho de cuia no quintal.  Sorria.  Acabava de se distrair com amigos numa animada partida de dominó.  Era um jogador de respeito.  A sua mente simples de seringueiro era capaz de decifrar com bastante competência a complexidade daquele teorema que as pedras do jogo formavam.  Pretendia jogar mais um pouco após o jantar.  Era um jeito de passar o tempo...".

O jornalista então relata as últimas cenas da vida de Chico Mendes.  "Não chegou, porém, a botar o pé no último degrau.  Caroços de chumbo voadores, saídos de um breve lampejo na escuridão, cravaram-se no seu peito.  Um último arfar e um corpo de quarenta e quatro anos desabava de encontro ao solo.  O sangue fugidio arrastava a vida para as trevas.  A floresta amazônica perdia Chico Mendes, provavelmente seu mais ardoroso defensor.

O crime que abalou o Vale do Acre aconteceu por volta das 18h45 do dia 22 de dezembro de 1988, conforme relato do seringueiro Pedro Rocha a um repórter de Rio Branco que se encontrava na comunidade.  Ele conta que os matadores ficaram escondidos no canto da cerca, aguardando o sindicalista descer para tomar banho.  Em poucos segundos, escutaram o tiro que atingiu em cheio o peito de Chico.  Enquanto os policiais militares corriam na direção do quartel em busca das armas, ainda tentaram reanimá-lo, mas ele acabou morrendo a caminho do hospital Epaminondas Jácome.

Velório e enterro
Ainda de acordo com a narrativa do livro escrito por Cezar Negreiros, o corpo do sindicalista foi encaminhado para o Instituto Médico-Legal em Rio Branco e depois velado na Catedral Nossa Senhora de Nazaré.  Na seqüência, o corpo de Chico foi levado de volta Xapuri, onde ocorreu o enterro.  Já na cidade onde nasceu, o sindicalista foi velado na igreja matriz de São Sebastião e contou com a presença de grandes lideranças, a exemplo do atual presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que na época era presidente do Partido dos Trabalhadores (PT) e amigo pessoal do morto.

Na página 72 de seu livro, Cezar descreve as cenas do último adeus dos amigos ao sindicalista: "Por volta das 11 horas da manhã do dia 25 de dezembro, sob forte comoção popular, o mártir da floresta foi sepultado debaixo de uma forte chuva.  Indignadas com o descaso da polícia local, as lideranças rurais exibiam faixas pedindo reforma agrária e o fim da violência no campo.  'A chuva que caiu naquela manhã foi um lamento da natureza'", desabafou um dos sindicalistas que acompanhava o cortejo naquele fatídico dia.

O assassinato de Chico Mendes, ocorrido a mando do fazendeiro Darli Alves, não ficou impune, tendo em vista que os algozes foram julgados e condenados a prisão.

Porém, a saudade dos amigos ainda persiste, assim como dos filhos e familiares que tiveram que conviver com sua ausência.  O certo é que ainda hoje a ideologia de Chico ecoa com força renovada na voz de cada homem, mulher, jovem ou criança que entende o valor do meio ambiente para a vida.

(Por Val Sales, Página 20, 13/01/2008)


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