Rapaz que morreu em Goiânia no dia 2 é o 3º caso no país; uma mulher sobreviveuVítima contraiu doença na área rural de Goianésia, onde sua família tem uma fazenda; Goiás deve divulgar hoje exames de 2 casos suspeitos
Foi confirmada ontem em Goiás a segunda morte por febre amarela no Brasil neste ano. Exames sorológicos mostraram que um homem de 24 anos, que morreu no dia 2 em Goiânia, havia contraído a doença. A análise foi feita pelo Laboratório Central de Saúde Pública, ligado ao governo goiano. O Ministério da Saúde também confirmou a morte.
Segundo a Secretaria da Saúde de Goiás, o homem foi internado cinco dias antes da morte em um hospital de Goiânia. Ele era de Goianésia (201 km da capital), cidade com cerca de 53 mil habitantes. A pasta diz que ele contraiu a doença na área rural do município, onde sua família tem uma fazenda.
A pedido de parentes, o governo estadual não divulgou o nome e a profissão do rapaz.
A cidade é vizinha a Pirenópolis (GO), onde, para o ministério, o servidor público Graco Abubakir, 38, que morreu no dia 8 em Brasília, contraiu febre amarela. Goianésia não havia registrado morte de macacos por suspeita da doença.
Com o resultado do exame, o país passa a ter três casos confirmados neste ano. Além dos dois mortos, uma mulher de 42 anos, que contraiu a doença em Mato Grosso do Sul, está internada em São Paulo e deve ter alta hoje ou amanhã.
Hoje, a Secretaria da Saúde goiana deve divulgar os resultados dos exames de dois casos suspeitos: o do espanhol Salvador de La Cal, 41, que morreu no sábado em Goiânia, e de Maria Geraldina Siqueira da Silva, 63, morta na quarta passada no interior do Estado.
Também é investigada em Goiás a morte do trabalhador rural João Batista Gonçalves, 31, em Uruaçu, no dia 4. Há ainda nove casos suspeitos no Estado, de acordo com dados do governo. No ano passado, Goiás teve duas mortes por febre amarela, em Jataí.
O número de notificações ao Ministério da Saúde subiu ontem para 26 -eram 15 até sexta-feira e 24 até domingo. Desses, 17 estão sob investigação, três já foram confirmados e seis, descartados.
As duas novas notificações são das cidades goianas de Aruanã e Luiziânia. Conforme a secretaria de Saúde do Distrito Federal, o caso de Luiziânia é de um homem de 31 anos da área rural, que morreu ontem no Hospital Regional da Asa Norte, em Brasília. O exame que pode confirmar a infecção sai em uma semana.
O irmão da vítima também apresentou sintomas "discretos", mas passa bem, segundo a Secretaria de Saúde de Luziânia. Outras causas de morte foram levantadas, como leptospirose, hepatite e hantavirose.
Ontem faltou vacina nos postos de Luziânia e Águas Lindas. As mortes sob suspeita da doença levaram aos postos de saúde de Brasília, desde 28 de dezembro, mais de 1 milhão de pessoas -cerca da metade da população do DF.
"Isso quer dizer que quase 1 milhão de pessoas se vacinaram sem necessidade", disse o subsecretário de vigilância à Saúde, Joaquim de Barros Neto. A previsão era vacinar 240 mil pessoas -número estimado de pessoas sem imunização.
Muitos brasilienses e goianos já imunizados buscaram os postos pelo reforço, desnecessário, da vacina.
Nem surto nem epidemiaEspecialistas ouvidos pela Folha dizem que os três casos confirmados e os outros 17 sob investigação não configuram nem epidemia nem surto da doença. "São casos isolados", explicou o epidemiologista Pedro Tauil, da Universidade de Brasília.
Tauil disse que epidemia é um aumento inusitado de casos da doença, e surto é um tipo de epidemia localizada em que os casos têm relação entre si.
Em 2000, o Brasil apresentou surto da forma silvestre da doença, segundo Jarbas Barbosa da Silva Junior, da OPAS (Organização Pan-Americana de Saúde), braço da OMS (Organização Mundial da Saúde). Naquele ano, houve 85 casos e 40 mortes, todos silvestres.
Brasil fez alerta internacional sobre doençaEm 21 de dezembro do ano passado, o Brasil divulgou um alerta aos países da OMS (Organização Mundial da Saúde) sobre a ocorrência de morte de macacos com suspeita de febre amarela no Centro-Oeste.
A morte de macacos pode ser um aviso da circulação do vírus nas matas. Na semana passada, foi confirmado o primeiro caso de 2008 no Brasil em humanos -Graco Carvalho Abubakir, 38, morador de Brasília, que havia passado uma temporada em Pirenópolis, em Goiás.
A propósito do alerta, o Ministério da Saúde divulgou ontem, por meio de nota oficial, que "o regimento internacional estabelece que, quando da ocorrência de possível emergência de saúde pública de importância internacional, o país deve comunicar a ocorrência em 24 horas".
A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) chegou a divulgar que o alerta poderia fazer com que aumentasse o número de países que exigem vacina dos turistas brasileiros, o que foi negado pela pasta e pela OMS. Jarbas Barbosa da Silva Junior, gerente da área de vigilância em Saúde e gestão de doenças da OPAS (Organização Pan-Americana de Saúde), braço da OMS, afirma que a notificação não é algo incomum.
"Não é mais obrigatória a notificação internacional da febre amarela. O Brasil notificou porque isso poderia gerar uma preocupação em países vizinhos", disse Silva Júnior.
TurismoOs nove escritórios da Embratur (Empresa Brasileira de Turismo) no exterior estão alertando operadores e turistas estrangeiros da necessidade da vacina caso as viagens sejam para as regiões de risco. A empresa, que é ligada ao governo federal e objetiva impulsionar o turismo brasileiro no mercado internacional, tem escritórios em Frankfurt, Madri, Nova York, Los Angeles, Paris, Milão, Tóquio, Lisboa e Londres.
Cerca de 5,02 milhões de estrangeiros visitaram o Brasil em 2006, de acordo com os dados mais recentes do Ministério do Turismo, que não quis comentar se haverá impacto no turismo nacional.
A Associação Brasileira das Operadoras de Turismo afirmou que dificilmente haverá conseqüências negativas. "Em geral as pessoas se vacinam e fazem a viagem", disse o presidente da entidade, José Eduardo Barbosa.
Imunização: Serra diz que só deve se vacinar quem for para área de riscoO governador José Serra (PSDB) disse ontem que só deve se vacinar quem for viajar para alguma área de risco. "Depois que passar essa onda, pode até vacinar. Mas agora não precisa, até porque não tem vacina que dê conta", disse. "O problema é onde tem floresta e tem macaco." Ele próprio afirmou que vai renovar sua vacina neste ano. "Eu mesmo estou preocupado porque me vacinei em 1998. Vou tomar de novo neste ano. Depois que passar essa onda eu vou tomar."
Vacinas: Fiocruz dobra a produção anual de vacinas contra febre amarelaA pedido do Ministério da Saúde, a Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) vai dobrar a produção anual de vacinas contra a febre amarela. O Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos (Bio-Manguinhos) produz 15 milhões de doses por ano -neste ano, serão 30 milhões. Só em janeiro, a produção será triplicada. Normalmente, a demanda é de 1,3 milhão de doses por mês. Até o fim do mês, serão produzidas 4 milhões de doses. Não há risco de desabastecimento, diz a Fiocruz.
(Felipe Bächtold, Angela Pinho e Johanna Nublat,
Folha de São Paulo, 15/01/2008)