O Conselho Estadual do Meio Ambiente do Estado (Consema RS) vive uma crise que se tornou aguda no final do ano passado e que poderá levar a mudanças no conteúdo da Resolução 008/2000, a qual trata da estruturação e composição das Câmaras Técnicas permanentes do órgão. Representantes das ONGs Agapan, Núcleo Amigos da Terra e Ingá reclamam que, ao longo de 2007, não conseguiram a abertura necessária ao diálogo com os demais representantes da Câmara Técnica da Agropecuária e da Agroindústria. As divergências acirraram-se especialmente em relação ao zoneamento ambiental voltado às atividades de silvicultura, cujos critérios, elaborados pela Fepam, são defendidos pelas ONGs mas rechaçados por representantes do setor empresarial. Esse ponto nevrálgico foi discretamente exposto na última reunião do Consema, em 20 de dezembro, quando as três ONGs anunciaram sua saída da Câmara Técnica.
Na ocasião, o NAT e o Igá, representados, respectivamente, pelos conselheiros Lúcia Ortiz e Paulo Brack, entregaram
ofício, conjunto explicando as razões da retirada. A representante da Agapan, Edi Xavier, informou que já havia requerido o desligamento da Câmara. Com isto, a Câmara Técnica da Agropecuária e da Agroindústria conta agora com apenas uma ONG: A Amigos da Floresta, cuja diretriz de atuação alinha-se aos interesses das entidades empresariais representadas nessa Câmara, especialmente a Farsul. Têm assento, ainda: Fetag, Fepam, Fiergs, Ibama, Sociedade de Engenharia, Famurs, Comitês de Bacias Hidrográficas e secretarias de Estado da Agricultura, Obras Públicas e Saneamento, Saúde, Justiça e Segurança e Assuntos Internacionais.
Debate infrutífero "O tipo de debate não estava sendo frutífero, considerando o aspecto da biodiversidade. O zoneamento ambiental feito pela Fepam foi trucidado, tratado de forma muito emocional por parte dos que defendem a silvicultura da forma como ela está sendo implantada. Não houve espaço para discutir a precaução, nem para o acompanhamento dos itens do zoneamento, especialmente quanto à questão das espécies ameaçadas", justifica Brack. Segundo ele, de agora em diante, a estratégia das ONGs é concentrar sua atuação na Câmara Técnica de Biodiversidade e Política Florestal, que é, na opinião do ambientalista, onde deveria estar concentrado o debate sobre a silvicultura.
Para Vicente Medaglia, também integrante do Ingá, a Câmara Técnica da Biodiversidade "tem tido um posicionamento mais aberto ao diálogo", enquanto a da Agropecuária "manifesta um pensamento único". "Elas tratam do mesmo tema, mas o poder político é puxado pela Câmara da Agropecuária", observa Medaglia. Para ele, "não existe paridade no Consema, dá para dizer que ele não tem cumprido com o papel de democratizar a gestão ambiental no Estado, vemos resistências a isto". "Se compararmos o Consema com o Conselho Municipal do Meio Ambiente, por exemplo, neste último temos mais abertura", afirma.
Além dessas reclamações, as ONGs apontam também o atropelamento na análise de documentos que são entregues durante reuniões. Outro fato grave, conforme a representante do NAT, Lúcia Ortiz, é o encaminhamento de documentos diretamente ao Consema sem que eles sejam antes analisados pela Câmara Técnica de Assuntos Jurídicos.
"Sem posição"O presidente do Consema, secretário do Meio Ambiente Carlos Otaviano Brenner de Moraes, informou, por e-mail, que "o Conselho não tem posição no que se refere à saída das ONGs Agapan, Ingá e Núcleo Amigos da Terra/Brasil da Câmara Técnica de Agropecuária e da Agroindústria, porque respeita a vontade de seus integrantes, que protocolaram seu desejo de não mais participar da Câmara Técnica, o que foi publicado na edição do dia 07/01/2008 do Diário Oficial do Estado". De acordo com Moraes, "o Consema e suas Câmaras Técnicas, por respeitarem os princípios democrácitos, estão abertos ao retorno dos representantes das ONGs, se assim o desejarem, bastando que enviem ofício ao Conselho". Este pedido, contudo, deve ser votado na plenária do Consema, e a próxima reunião está marcada para 21 de fevereiro.
Alteração à vista Apesar da declarada indiferença à atitude das ONGs, a presidência do Consema já pensa em mudanças na Resolução que trata da composição das Câmaras Técnicas. A situação de desproporcional representatividade quanto à procedência das entidades que a compõem, aberta com a renúncia das ONGs na Câmara Técnica da Agropecuária e da Agroindústria, parece ter se tornado um desconforto. O fato é que a Resolução 008/2000 não determina que a composição das Câmaras deva guardar tal proporcionalidade. Nem mesmo a Resolução anterior, a 007/2000, que define as competências e estabelece a estrutura e a composição do Consema, fala na necessidade de proporcionalidade, o que implicaria um equilíbrio de forças políticas nas Câmaras.
Apenas na Seção IV, artigo 18, parágrafo 1º, afirma que "o número de membros das Câmaras Técnicas será fixado pelo Plénário". Mas a presidência do Consema não deixou claro qual a natureza da alteração que pretende fazer. "Estuda-se alteração da Resolução que cria as Câmaras Técnicas Permanentes para assegurar o limite de membros", respondeu o presidente, por meio da Assessoria de Comunicação da Sema RS. Mais tarde, acrescentou que "esta alteração de que falamos anteriormente ainda não está em discussão e sequer foi apresentada ao plenário do Consema. Trata-se de uma constatação feita pelo secretário-executivo do Consema, Tiago Castanhede, ao observar, quando assumiu o cargo, há quatro meses, as entidades que solicitam para entrar e sair do Consema. Diante desta observação, ele pretende propor ao presidente do Consema, secretário do Meio Ambiente, Carlos Otaviano Brenner de Moraes, alteração na Resolução 08/2000 que criou as câmaras permanentes do Consema, porém não fixa número limite para seus membros. Portanto, ainda não é uma discussão em nível de Consema, porém uma idéia do secretário-executivo do Consema que poderá virar uma proposta ou não", informou a Assessoria de Comunicação da Sema RS.
(Por Cláudia Viegas, AmbienteJÁ, 10/01/2008)